Águas de Marte (com interação de Anita D. Cambuim)

Às vezes vejo tudo absurdamente claro e nítido, transparente como a água mais límpida da fonte mais pura num copo de fino cristal. E às vezes meu pensamento, como as ondas, oscila entre a superficialidade da espuma na orla e a profundidade do interior da vaga, o moto contínuo que leva e traz o tempo num ritmo além de qualquer possibilidade de compreensão ou controle.

Algumas vezes, sinto como se me hipnotizasse um lago escuro e calmo, com taboas e junquilhos à beira, e me pego olhando passiva e tranqüila, sem sequer desejar saber o que há por trás do limbo verde que tudo tinge. E em outras, me chama como um encantamento o oceano com suas águas inóspitas, levando-me a querer mergulhar, ensandecida, para descobrir os segredos de seu azul profundo.

Março. Águas fechando o verão. Há dias em que meus pensamentos, fora de minha natureza venusiana, são como as águas de Marte: existiram um dia, mas hoje são apenas sulcos impressos num inacessível chão de pó.

............................

As águas virão.

No final ou início

De cada estação.

Virão por certo.

E as verá aquele

Que estiver desperto.

(Anita D. Cambuim)