Batidas

Dia 29 de abril, eu não tinha para onde ir. A faculdade me esperava pacientemente e o relógio me marcava os passos com olhos indagadores: "por que aí? O que quer encontrar nesse buraco? Pra quê se inclinar à esquerda? Não se estique tanto! Venha correndo, não pra trás! Onde esteve sua razão?", mas ainda estava na estação de metrô comendo um folheado de quatro queijos ao lado de um bloco com uma mulher anotada. Quem me marcava: a hora, os queijos ou a caneta?

Pequei, peguei o metrô rodeado de dúvidas. Embaraçoso era ouvi-las cantando, impedindo minha concentração nas conversas dos outros. Ainda me prendiam no centro. Centrado no centro do cântico me perdi no lado de fora dos assobios. Chorei as músicas de Legião. Não, não! Na verdade ontem não existiam músicas, só memórias... Lembranças de músicas que só lembro agora. Nem sei se ao menos... nem sei... ao.

Cheguei na Urca. Chovia, entrei, vi o vazio, saí.

Saí da faculdade de ninguém pelo horário cedo andando, simplesmente andando, fazendo o que os passos pediam. Fui um boneco entre a chuva e minha imprecisão quente encubada nas minhas coxas. Insisti ainda no guarda-chuva, por tempo que ia se indo conforme o vento aumentava. Vi uma praça de bancos molhados. Estátuas molhadas. Folhas molhadas. Estava numa área do exercito. Uma área do exército molhada. Tudo era agradável! Tirei meus óculos e fechei o guarda-chuva - estava seguro para me agradar. O mar já ia chegar.

Finalmente a praia vermelha. Era final de tarde, por volta das cinco e dez, quando descobri que tinha uma praia na minha frente. Eram mais ou menos algumas horas, mas o tempo já havia me perdido no meio das botas passadas, do embolar da mente ao chão. A praia era curta e a segui com os olhos daqui pra lá, até o lá ser perfeito para parar.

Chuva fina

vento forte e frio

ondas bravas

dança do véu no costão

cobertor de agulhas em prece

uma praça deserta atrás

um pescador vulto-negro guardando suas coisas

e um som constante de algo batendo.

Batia no fundo do meu ouvido e parecia mais alto que o mar (infinito na névoa). No fundo parecia o coração de uma árvore - Era o Brasil! Fui-me embora vendo a bandeira batendo forte no vento, com a praia impressa no corpo.

J Jesse
Enviado por J Jesse em 01/05/2010
Reeditado em 25/09/2010
Código do texto: T2229991
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