Ser Inteligente – considerações subjetivas
O que se entende atualmente por inteligência está muito longe de ser comparado ao que realmente significa ser inteligente. O ser verdadeiramente inteligente é capaz de compreender, conceituar, conjeturar sobre o significado dos múltiplos eventos que acontecem ao seu redor, e a inteligência é o aparelho mental necessário para alcançar o conceito e as entrelinhas do que se pretende conhecer.
Atualmente, quando me deparo com alguns indivíduos que foram agraciados pela oportunidade de conhecer um pouco mais que a maioria, ao invés de descobrir sujeitos realmente dotados de inteligência e respeitá-los por isso, percebo seres imersos em um casulo de tanta arrogância que às vezes me pergunto: para que se instruíram tanto? Com qual(is) objetivo(s) resolveram buscar tanto “conhecimento”? Com qual(is) finalidade(s) mergulharam nos livros, a não ser pela oportunidade de se tornarem melhores, mais humanos, conscientes, conhecedores de si mesmos, do outro, da história, dos valores que deveriam possuir (ou resgatar), do modelo de sociedade doente que presenciamos hoje...?
Ao invés de ser um privilégio estar diante de tais pessoas, tendo em vista que a alienação se tornou a imperatriz da modernidade, mesmo com a facilidade que possuímos hoje para nos isentar da imbecilidade, este contato tem sido pernicioso em alguns momentos, pois noto, cada vez mais claramente, que a exclusiva intenção de muitos é apenas alcançar um status em um universo inacessível à maioria.
O conhecimento, poderoso instrumento para humanizar pessoas e promover mudanças significativas em múltiplos sentidos, tornou-se o principal responsável por instaurar na elite intelectual uma intrigante dificuldade de socialização, que culmina no desrespeito ao próximo - principalmente àquele que não teve as mesmas oportunidades de alcançar semelhante grau de saber. Portanto, na confusão a respeito desse ser ou não ser, pergunto-me: isto é ser inteligente? É ignorando ou abatendo o outro por não saber as mesmas coisas que eu que estarei colaborando para alargar seu interesse pela obtenção de conhecimento? Será que desse modo não estarei intimidando meu próximo a dar o primeiro passo em direção à instrução, à leitura? Este é o caminho mais eficaz para mudar o status quo? É mesmo verdade que um indivíduo que não teve a oportunidade de frequentar um ambiente letrado ou ler todos os clássicos da literatura universal não tem cacife para acrescentar NADA de bom à minha vida e, por isso, deve ser expurgado do mundo?
A intensa disputa de ego nesse meio douto (onde, contraditoriamente, não há somente pelegos) muito me intriga, pois parece que o único intuito de seus membros é se encharcar de "conhecimento" apenas para ter a erudição notada quando estiver diante de uma platéia (mesa de bar quase sempre é um bom lugar).
O conhecimento não pode mais continuar sendo um precipício capaz de distanciar os universos que somos, pois acredito ser uma arma poderosíssima capaz de promover mudanças extremamente necessárias, tanto interna como externamente. Então, por que não colocá-la a serviço do mundo, com o intuito de uni-lo, e não fragmentá-lo ainda mais?
Não estou defendendo a idéia de que todo indivíduo que possui um grau mais elevado de instrução deva estar em uma sala de aula, partilhando o que sabe, pois, para isso, é necessário muito mais: vocação, amor e coerência entre o que se diz e o que se faz. Mas que sejam aproveitadas as oportunidades de compartilhar esses saberes para que não se percam com a morte do corpo.
A meu ver, todo indivíduo que realmente aprendeu alguma coisa deveria empreender esforços para se tornar melhor, mais sábio, pois quem realmente almeja estar plenamente consciente de qualquer coisa geralmente percebe que sua jornada tende a se tornar cada vez mais árdua quando continua a caminhar neste sentido. Aquele que realmente tem olhos para ver e ouvidos para ouvir, de fato, nota que um conhecimento puxa outro e, desse modo, chega à conclusão de que nada sabe, como já dizia, há tempos antes de Cristo, o sábio Sócrates ao afirmar que sua sabedoria era limitada à sua própria ignorância.
A instrução deveria ser encarada como um processo natural, e sua continuidade como algo relativo, dependente das condições de cada indivíduo. Não cabem julgamentos ou indagações indiscretas ao outro a respeito dos motivos que deram origem a suas lacunas intelectuais: antes de julgar, o ser instruído e verdadeiramente inteligente deveria sondar o universo alheio de maneira cordata, para tentar ser útil e, então, mover-se de maneira adequada para disseminar o que sabe. Porém, é claro, respeitando as diversas formas de pensar. Do contrário, não vejo sentido algum em saber tanto sobre tantas coisas se a finalidade única é esgotar o conhecimento em si mesmo.
Desculpem-me, por favor, os seres verdadeiramente inteligentes e conhecedores.