Sou ciumento, sim...

Tem horas que a vida gosta de nos ensinar ‘a real’. Qual é a real? A vida, repentinamente, nos pergunta e, sem pedir resquícios de permissão, responde sozinha.

Há tempos, desde que deixei a religião, comecei o aprendizado ao sexo. Como em qualquer outro aprendizado, o sexo também leva tempo, mas não falo do ato em si, e sim da sexualidade no geral. Para determinadas pessoas, leva todo o tempo do mundo aprender a ‘ficar’. Me diziam isso no breve passado: Ah, Roy, você tem que aprender a ficar... Ficar não é estar? Não... Ficar é beijar, transar, tirar um sarro no meu carro com ‘qualquer bem’. Depois, a ficação vai embora, quem ficou se foi, quem se foi não fica mais.

Vejam bem, não é que sou contra esse estilo de relacioamento. Ninguém pertence mesmo a ninguém. Ninguém é dono do meu coração, e se eu te amava e não te amo mais, mais problema teu do que meu. Mas, nem todo mundo, literalmente, sabe ficar. Eu, por exemplo, possa ser que não ouça mais de ninguém que eu precise aprender a ficar. Sinceramente, acho que desistiram de tentar me ensinar como se faz, porque continuo sem saber.

No Brasil, terra das mil mulatas, da sensualidade e da bunda (além de outras coisas, mas estou de mal-humor hoje pra mencionar coisas genuinamente boas), ‘fiquei’ com algumas mocinhas. Claro que para elas não era só uma ficada, nem breve estada. Uma delas era até mesmo mal casada, mas todas, sem excessão, me quiseram ter como delas. E as que eu ‘amei’? Não... Assim que começava a ‘amar’, elas se foram. Não foram muitas, só duas mesmo, e eu não posso afirmar que era amor. Até hoje só senti aquela obsessão que nos queima por dentro, que arde, que machuca... Mas, nem sempre machucou. Antes de me deixarem, foi exclusivamente este o sentimento que me doou as melhores – ox concours – sensações da minha vida. Depois, se vai e deixa um vazio. Um buraco. Parece que nós somos tão menores do que somos. Parece que o pedaço levado constitui mais de cinqüenta por cento de quem somos.

Com o passar dos tempos, a desilusão passa. Aprendemos a conviver com o vazio e, lentamente, o preenchemos de nossas coisas. ‘Coisas’ estas que, sem titubear, sobem em nossos pedestais e substituem não só a solidão, mas também o sexo. Entra a fúria dos cinco dedos... A esposa no aperto de mão e, no meu caso, entrou a leitura, a música, o cinema, a escrita e algumas outras pessoas especiais. Meus livros jamais me desapontaram e sinto que desde Setembro passado minha escrita se desenvolveu mais do que em anos a fio. Minha música jamais me decepcionou, e hoje em dia sinto que meus ídolos vivos fazem mesmo parte de uma ‘boa onda’ musical. Falo o mesmo do cinema e artes no geral... Mas, não posso falar o mesmo das pessoas.

Desde Setembro passado, época d’um pé na bunda violento, já percebi outras decepções. Não só minhas, minha gente. Talvez, muito pelo contrário, mais pessoas tenham se decepcionado comigo do que eu com elas. Claro, com certas entidades dizendo que era o máximo, se esqueceram de que como ser humano há até ‘x’ ponto a possibilidade de se maximizar, e pra eu chegar a esse ponto, preciso sair do casco do cavalo do bandido. Pastar muito. Pior que eu não sei se sou eu quem me segrego dos demais, a mim mesmo, ou se tenho qualidades tão difíceis (não necessariamente tão ruins, mas difíceis) de se lidar que acabo os afastando. Sabem o que eu pensei? Talvez eu seja uma excelente pessoa quando estou de humor duvidável, e um cara chato quando goste de alguém. Irônico, mas super interessante.

Algo sei de fato. Meu liberalismo está em cheque. Apesar de continuar pensando que ninguém deve pertencer a ninguém, quando alguém aproveita seu direito de não pertencimento e se doa em pedaços a outrém, a outrém que não eu, a dor me cega... A dor me cega, e eu gostaria de pegar o safado e cortar seu piruzinho (zão, sei lá). E eu nunca soube que podia sentir isso! Ou, ao menos, vivia em negação e dizia a clássica frase: Eu não sinto ciúmes.

Sinto sim... Ciúmes... Inveja... Mágoa...

Faz parte... Mesmo que o cabra seja gente boa. Mesmo que ele seja melhor do que eu, e eu tendo a gostar de quem é melhor do que eu. Mesmo que ele precise de ajuda social, que eu adoro dizer que adoro ajudar (adoro adorar). Penso dele que seja um miserável, que sofra, que lhe doa, que ele sinta o que estou sentindo, cabra safado da peste, filho da (...), paquiderme de me(...), que se queime no inferno terreno, ou seja, que perca horas de seu dia no trânsito, que tenha que engolir sapos de clientes insatisfeitos por serviços inúteis, que tenha de esperar horas na fila do hospital, que receba uma merreca de seguro de previdência e espere dias na fila, de madrugada a madrugada... Que sofra...

‘Na real’, rapaz... Como eu sou ciumento!

RF

(Abril de 2006, www.osintensos.blogspot.com, Todos os direitos reservados)

O Intenso
Enviado por O Intenso em 20/08/2006
Reeditado em 20/08/2006
Código do texto: T220681