E SOBRE A MEMÓRIA... (para minha mãe)
Hoje, cuidando por uns 15 dias de minha mãe com 92 anos e 9 meses, sou confrontada direta e diariamente com uma realidade triste e dolorida (a que todos estaremos sujeitos, um dia...)
Por muitos e longos anos minha mãe venceu o tempo, e dos oitenta aos noventa pintou, costurou, cantou no coral da sua igreja, sempre com aparência 20 anos mais moça - vaidosa e um pouco mais independente.
Contudo, agora o peso de sua idade chegou e a pegou - traiçoeira e irreversivelmente. E a memória se foi. A cada dia ela vai ficando mais esquecida, dependente, desorientada, precisando sempre estar acompanhada em tempo integral!!! Lembra-se de sua infância e juventude muito bem, mas não do que comeu meia hora atrás, e o nome das pessoas. Não se lembra dos netos todos, a menos que os veja. Esse aspecto é muito doloroso para a família. Também tem uma certa agressividade aliada à impaciência e ao medo de tudo.
Eu, tentando de um tudo para fazê-la feliz, sem muito sucesso, tive um pensamento que desejo dividir aqui e, quem sabe, achar uma resposta:
Por que será que passamos a vida toda acumulando conhecimentos e informações e somos incentivados a estimular a memória, ela sendo indispensável à nossa sobrevivência em todos os segmentos da vida e, de repente, essa própria vida nos retira o cabedal cultural - toda a nossa vivência - e nos arremessa impiedosamente na escuridão da infantilidade, como para vivermos num tempo irreal e muito individual? Parece uma brincadeira má, uma ironia...
O tempo de minha mãe, mesmo que me pergunte as horas e reclame que ora passe rápida ora lenta, é agora bem diferente do de todos.
Eu associo à pergunta o desejo de saber como ter tempo (e paciência) para cuidar (bem cuidar) de quem vive num sem-tempo?
Pois todos temos compromissos e solitações reais, temos que sobreviver, sustentar uma família; sempre estamos a correr, sempre a competir com tantos, já quase sem tempo para algum lazer, pra cuidar da própria saúde muitas vezes também debilitada, pra cultivar pequenos prazeres, ter um ou dois amigos verdadeiros, e ainda amar, com tudo o que o amor nos exige em zelo e presença?
Penso mais um tanto: Mas será mesmo infelicidade esquecer de quase tudo com a chegada da idade? O alijar-se (aliviar-se) de todo peso da própria história - amores e tantas dores - e do enorme conhecimento (nem sempre agradável)adquirido ao longo da existência? Será esse "esquecer-se" a prova maior da misericórdia divina para com o indivíduo, afinal? Mas, e os outros? Pois não é nada fácil ver-se a deterioração de quem amamos tanto!
Quando soubermos o real motivo da divindade permitir que as "velas" da memória assim se apaguem carregando consigo nossa possibilidade de viver com dignidade e sem a assistência de quem "se disponha" a nos cuidar, talvez encontremos a solução para um dos maiores enigmas da Vida: esse voltarmos a ser como crianças - e o que fazer-se com isso.
Vou pensar em tudo mais um pouco - enquanto ainda tenho tempo...
Pense também.
*****
Silvia Regina Costa Lima
24 de março de 2010
Todas as fotos de Antonieta (92 anos e 9 meses) são desta semana:
Pronta pra dormir esta semana (fiz escova nela e olhe o detalhe: brincos e baton)
Com meu filho João Paulo, domingo
passeando no residencial onde moro
com meu flho Fábio (sábado)
Passeando com meu filho Fábio - janeiro de 2010
toda a família no restaurante no seu niver de 90 anos
com minha filha Ana Stella e o bisneto Dudu - no niver de 91 anos
niver de 91 anos- super bonita e feminina, não acham?
todos juntos no seu niver de 91 anos
Com o Bisneto Luís Eduardo (julho de 2009)
outubro de 2009 e os quadros que fez
Ps: E por estar com ela aqui por uns dias, tenho tido bem menos tempo para visitar alguns amigos, mas sei que irão entender.
Beijos azuis
Hoje, cuidando por uns 15 dias de minha mãe com 92 anos e 9 meses, sou confrontada direta e diariamente com uma realidade triste e dolorida (a que todos estaremos sujeitos, um dia...)
Por muitos e longos anos minha mãe venceu o tempo, e dos oitenta aos noventa pintou, costurou, cantou no coral da sua igreja, sempre com aparência 20 anos mais moça - vaidosa e um pouco mais independente.
Contudo, agora o peso de sua idade chegou e a pegou - traiçoeira e irreversivelmente. E a memória se foi. A cada dia ela vai ficando mais esquecida, dependente, desorientada, precisando sempre estar acompanhada em tempo integral!!! Lembra-se de sua infância e juventude muito bem, mas não do que comeu meia hora atrás, e o nome das pessoas. Não se lembra dos netos todos, a menos que os veja. Esse aspecto é muito doloroso para a família. Também tem uma certa agressividade aliada à impaciência e ao medo de tudo.
Eu, tentando de um tudo para fazê-la feliz, sem muito sucesso, tive um pensamento que desejo dividir aqui e, quem sabe, achar uma resposta:
Por que será que passamos a vida toda acumulando conhecimentos e informações e somos incentivados a estimular a memória, ela sendo indispensável à nossa sobrevivência em todos os segmentos da vida e, de repente, essa própria vida nos retira o cabedal cultural - toda a nossa vivência - e nos arremessa impiedosamente na escuridão da infantilidade, como para vivermos num tempo irreal e muito individual? Parece uma brincadeira má, uma ironia...
O tempo de minha mãe, mesmo que me pergunte as horas e reclame que ora passe rápida ora lenta, é agora bem diferente do de todos.
Eu associo à pergunta o desejo de saber como ter tempo (e paciência) para cuidar (bem cuidar) de quem vive num sem-tempo?
Pois todos temos compromissos e solitações reais, temos que sobreviver, sustentar uma família; sempre estamos a correr, sempre a competir com tantos, já quase sem tempo para algum lazer, pra cuidar da própria saúde muitas vezes também debilitada, pra cultivar pequenos prazeres, ter um ou dois amigos verdadeiros, e ainda amar, com tudo o que o amor nos exige em zelo e presença?
Penso mais um tanto: Mas será mesmo infelicidade esquecer de quase tudo com a chegada da idade? O alijar-se (aliviar-se) de todo peso da própria história - amores e tantas dores - e do enorme conhecimento (nem sempre agradável)adquirido ao longo da existência? Será esse "esquecer-se" a prova maior da misericórdia divina para com o indivíduo, afinal? Mas, e os outros? Pois não é nada fácil ver-se a deterioração de quem amamos tanto!
Quando soubermos o real motivo da divindade permitir que as "velas" da memória assim se apaguem carregando consigo nossa possibilidade de viver com dignidade e sem a assistência de quem "se disponha" a nos cuidar, talvez encontremos a solução para um dos maiores enigmas da Vida: esse voltarmos a ser como crianças - e o que fazer-se com isso.
Vou pensar em tudo mais um pouco - enquanto ainda tenho tempo...
Pense também.
*****
Silvia Regina Costa Lima
24 de março de 2010
Todas as fotos de Antonieta (92 anos e 9 meses) são desta semana:
Pronta pra dormir esta semana (fiz escova nela e olhe o detalhe: brincos e baton)
Com meu filho João Paulo, domingo
passeando no residencial onde moro
com meu flho Fábio (sábado)
Passeando com meu filho Fábio - janeiro de 2010
toda a família no restaurante no seu niver de 90 anos
com minha filha Ana Stella e o bisneto Dudu - no niver de 91 anos
niver de 91 anos- super bonita e feminina, não acham?
todos juntos no seu niver de 91 anos
Com o Bisneto Luís Eduardo (julho de 2009)
outubro de 2009 e os quadros que fez
Ps: E por estar com ela aqui por uns dias, tenho tido bem menos tempo para visitar alguns amigos, mas sei que irão entender.
Beijos azuis