Poeira ao vento

Não foi por acaso, aquelas coisas agridem-me como um gentil soco nas fuças. Fechar-me em um invólucro filosófico foi indiscutivelmente a pior idéia que já tive nesses tempos pra lá de miseráveis, por dentro sou um monstro. Poucas pessoas tiveram a oportunidade de me conhecer realmente por dentro, sou duas pessoas, ou melhor, sou uma pessoa enjaulando a outra.

Sempre funcionou esse singelo esquema, a mente conclui que a gentileza e a bondade era o único caminho plausível e o corpo gosta desse conclusão humanitária, sorrisos, afetos e a ajuda completamente sincera nunca deixaram de jorrar de uma fonte plena de moedinhas dos desejos. Já a alma é uma outra pessoa completamente oposta, realista, coisa que a tornava desesperançosa, rancorosa, com uma incômoda consciência extrema da realidade, confiante em apenas uma coisa: tudo acaba.

Mas uma pergunta sempre me corroeu: Quem eu sou realmente? Não faz sentido dizer que eu sou o que sou por dentro, a alma atormentada, pois é o “por fora” que está no mundo vivendo, uma coisa eu acredito “você é o que você faz e não aquilo em que acredita”, as ações de um mundinho material suplantam as filosofias da alma com extrema facilidade.

Mas se eu sou aquela pessoa por fora o que significa o que vem de dentro? A verdade? Os desejos do coração? Não posso dizer pois simplesmente não tenho sabedoria suficiente.

Acho que sou duas pessoas diferentes ao mesmo tempo, metade, cinqüenta por cento. Sempre antes de falar a mesma coisa duas palavras me vem a mente, antes de uma crítica duas visões sobre o objeto me perturbam, sempre os extremos das coisas, ou você é bom ou é mau. Mas na prática isso nunca acontece a definição perfeita do ser, prova viva sou eu lutando entre o médico e o monstro.

Isso tudo foi resultado dessa merda de filosofia em que eu me meti até o dia que resolvi sair dessa, foi o mais doloroso dia da minha vida.

Foi como sair de um calabouço de tortura para um gramado ameno e ensolarado e ser recebido com um soco na cara de uma força muito maior do que aquela que me torturava no calabouço, a vida em si, a realidade e empesteava o ar me enchia forçadamente os pulmões, foi como passar minutos privado de respirar e dar um suspiro profundo em meio a fumaça.

As coisas acontecem todas contra sua vontade, o tempo segue a uma velocidade incomparável sem ligar para reflexões sobre como devemos agir, entrei assim na realidade, perdido, como se tentasse vencer um exército com reles argumentos antigos.

Agora estou aqui, coisas boas e ruins me acontecendo a todo momento, coisas banais de uma vida banal, assim como é a vida de todos inclusive a vida do mais tolo que julga aproveitá-la, não somos nada se não uma pá de ridículos estereótipos dos quais nos tornamos devotos seguidores apaixonados, cegos e babões.

Você é o que você faz, o que você diz não vale nada.