Uma catarse qualquer
Impressionante como o tempo pode nunca ter passado; esse imaginar nosso. Estar em um lugar que há tempos atrás já esteve e sentir-se como se ainda estivesse ali. As pessoas são as mesmas, os atos são os mesmos, sentimentos, risos, os lugares são os mesmos.
A distração de repente nos leva a acreditar que não há mais mundo "lá fora" e como que se houvéssemos tomado uma anestesia, por instantes, o que se viveu fora é apagado da memória. O que importa é estar ali, presente, rever pessoas, rever sentimentos, reafirmar laços.
As pessoas mudam, "afinam e desafinam", mas a essência de cada um continua ali e só quem realmente conhece determinada pessoa, é capaz de defini-las (ou não). As pessoas são difíceis, mas digamos que vale muito ficar confuso por elas. Vale cada momento de resoluções passadas, pedras no sapato, intrigas, falta de companheirismo, descobertas, afirmações. Vale, quando tudo isso resulta em um momento de total expurgação em uma mesa qualquer de um bar qualquer, onde tudo falamos, tudo sabemos e tudo queremos saber, onde por um momento nos permitimos. Onde nos olhamos, nos abraçamos, dançamos, filosofamos, rimos.
Talvez seja essa a grande receita para um "sair da realidade", vezes necessários: voltar a lugares do passado, rever amizades verdadeiras (viver amizades verdadeiras), sentar em um bar e "nos permitir" como diz o poeta. É prometer viagens, voltas e mais contato. É deixar que sua mente te guie aos mais ingênuos/perigosos devaneios, até então julgados incertos por uma sociedade com raízes em um cristianismo repressor e ridículo.
Arrisco ainda dizer, que talvez a receita dessa minha grande paz interior, tenha as suas raízes nutridas por esses momentos de total anestesia da realidade, esses momentos de total encontro com meu eu arrogante-repressor-anarquista-contrário ao que se é imposto misturado com a ingenuidade de um bobo apaixonado.
A receita por não ter receitas. Viver momentos de paixão e expurgação, acreditar que o tempo parou aqui e que lá fora a Terra gira no seu mais malicioso curso, é saber andar entre esses tempo-espaços abruptamente distintos, vezes cruéis e bondosos. Tomar essa anestesia sabendo que o tempo para e também não para, voltar e deixar que o choque de realidade te afete o menos possível, até que se esteja tão calejado que determinados choques não te atinjam mais.