Um lugar...
Um lugar, qualquer lugar onde possa deitar essa carcaça velha e mal tratada. Não... Nada de falar os meus defeitos, dos poucos que percebo já não me agrada listar, dos que não sei, pra que contar. Que posso dizer de ser obrigada a conviver tão fora dos padrões “certos” que tantos apregoam? Talvez só reste o frio direito de calar, ante tantas vozes que me dirigem em riste o dedo, da santa verdade, da abençoadora intolerância.
No entanto, é natal, pasmem! A sagrada e cínica família ao redor da mesa em harmoniosa confraternização. Abraços, beijos, lembrancinhas e cartões. A mais pura reverência a falsidade. Aliás, não existe um momento mais propício para a falsidade. Aqueles que morderam, lançaram maledicências, cuspiram na dor, pisaram no calo, são os mais fervorosos devotos amigos nesta época natalina. Os filhos abraçam os pais, irmãos se unem em sorrisos e doces palavras, comendo rabanada e peru.
Um lugar, qualquer lugar onde possa deitar essa carcaça velha e mal tratada, até os festejos terminarem e a velha rotina da verdadeira falta de consideração, prossiga sem esses velhos engodos sentimentais.