Universos Paralelos
Universos paralelos
A constatação de que vivemos em mundos paralelos é facilmente notada no comportamento de uma criança. Para tanto, basta prestarmos atenção ao alheamento infantil em relação às coisas e pessoas que estão em sua volta, de como ela, a criança, se desprega com extrema facilidade do mundo presente, embarafustando-se por labirintos da imaginação e universos de magia os mais variados. Tenho prá mim que poetas, escritores, pintores e uma infinidade de outros sonhadores, permeiam a sua existência num trânsito constante entre esses mundos, ora buscando refúgio neles, ora trazendo de lá obras que aqui, neste nosso mundo concreto de puro tocar e sentir, seria impossível produzir.
Ampliando o alcance de nosso raciociocio, podemos ainda acrescentar que, em maior ou menor grau, todos nós estamos mergulhados, concomitantemente, nesses vários universos que medeiam o nosso existir. O que muda é a capacidade que cada um de nós tem de perceber esse mergulhar e, além de perceber, lidar com leveza com essa percepção, de tal forma que esse mergulho metafórico nos propicie mais enriquecimento pessoal, fazendo-nos interagir ainda melhor com todos os seres sencientes em nossa órbita de atuação.
Em contraposição, quando a nossa consciência da existência desses outros universos é menor, ou quase nenhuma, o nosso viver se aproxima do automatismo, onde então passamos a cumprir as nossas tarefas sem sentir quase que nenhum prazer ou dor, praticamente nada entendendo das tarefas que estamos a executar, e nem qual o objetivo das mesmas, estágio de vivência em que experimentamos uma imensa indiferença, daquele tipo de indiferença que se assemelha a um sono em que não houve sonhos, ou ainda quando comemos alimentos em que o sabor quase não aparece, de tão insosso.
Portanto, o saudável migrar para os nossos universos de fantasia funciona como válvula de escape fundamental para que suportemos os desgastes em nossas atividades diárias, independente de que natureza elas sejam, e da qualidade com que nos desincumbamos delas.
Caso queiramos manter firme nossa âncora fundeada neste mundo de concretude, podemos até reprimir as nossas excursões aos mundos mágicos existentes dentro de nós mesmos, impedindo-nos de sonhar e buscando somente trilhar um caminho constituído majoritariamente de regras a serem seguidas sem questionamentos. Todavia, não podemos, é não devemos nos esquecer que o preço a ser pago por tal forma de conduta, de viver acorrentado à pilastras de disciplina e de não se permitir abrir janelas para o sonhar, é demasiado alto – geralmente cobrado nos cartórios de nossa maturidade com pesadas faturas de loucura e de insatisfação.
Vale do Paraíba, tarde do último Sábado de Abril de 2009
João Bosco