porque se for matar eu já morri.

voar pelos desertos mais sombrios

e saber que está no seu sossego.

como armas que disparam corações

homens que procuram desespero.

saber que a vaidade é coisa fútil

e a promiscuidade é passageira.

saber que a verdade é uma mentira

contada para muitos se deitar.

conheço o soluço e sou certeiro

sabendo que também vou soluçar.

e provo do veneno, sem ter medo

porque se for matar eu já morri.

vivendo como nuvem sem a chuva

que serve só pro céu se enfeitar.

complico a promessa pelas frases

que dizem que ninguém mais quer dizer

que se o amor é feito a prova d'água

um dia ele vai se afundar.

pra ver que o horizonte é um labirinto

e temo que não possas me beijar.

sentir a sua mão, um ombro amigo

saber que vai voltar e vai chegar.

sou feito de provérbios mal escritos

escritos para loucos se acalmar.

que tenho uma mente, uma ferida

escrita por ninguém que sabe ler.

que fosse a vertigem coisa breve

pra nunca mais deixar você partir.

sou feito como aço e no deserto

a água que a sede não matou.

o frio que não agride no nordeste

o sol que se esconde aqui no sul.

fui longe pra provar que estava certo

perdi a minha vida num compasso.

mas não que seja isso o resultado

de um prato que deixei para amanhã.

sou mata, coração desabrigado

sentido do sentir orientado

que foje para nunca se olvidar

que a vida é bonita, mas é rasteira

e posso me jogar, corpo caindo

negando o seu beijo tão fatal.

vivi na sua beira com um fato

pregando que a aurora é boreal.

sabendo que as cores se apagam

e o medo me persegue sem correr.

que sabe que não tenho outra escolha

senão como sujeito aceitar

que a vida é mais bonita pra quem vê

e não se trata apenas de enxergar

que fosse um cego vivo, sem ter medo

de andar pela cidade pela manhã.

que os olhos são manchados

e escuto sem saber o que dizia.

sem título nem compromisso

com toda essa elucidação

que esquece dos problemas invisíveis

que já se tornaram uma rotina.

mas vejo que a pedra no sapato

surgiu para mostrar o machucado.

que fosse tempestade,

chovesse para nunca mais parar.

e fosse o calor o meu amigo

o sol eu não iria refutar.

sabendo que não sei mais de nada

sofrendo porque quero aprender.

e vejo que um sorriso é embaçado

as vezes por querer não mais sorrir.

partilho da alegria como a vida

pra todos que conseguem aceitar

que há fatos que sucedem sem ter jeito

mas não podemos esquecer

que o ouro foi roubado

e trancado

e a comida virou comercial.

que a saca do arroz está mais cara

estocada em galpões

esperando o preço subir

lidar com a verdade é complicado

pois muitos vão achar que estão corretos

mas fosse a sua barriga que sentisse

vazio que não calasse o coração

sofrer pelo amor que foi vendido

sofrer pela palavra esquecida.

sorrir pela vida então vivida.

mesmo que não seja encantador.

mesmo que não seja solução.