Metamorfose
O que seria isso então? Isso. E já não é mais agora. Isto é agora e é a mentira da tão verdadeira verdade. Por alguns momentos achei que isso fosse algo que tivesse essência fixa como quem se petrifica no espaço. Enganado, pois, estava eu não sabendo que as palavras se metamorfoseiam em lavra. Palavra. E é esse estado que me confunde, a transformação, pois a palavra ainda esconde em si a lavra que esconde em si a verdade, ainda que seja a mentira em si. Percebi então que a mentira é mais íntima que nunca da verdade, como unha e carne. A unha é a espécie de proteção da carne. Quando a unha é retirada além de seu máximo, deixa de ser carne-unha e aí que jorra o sangue. Então a carne-unha é um escudo, uma espécie de defesa externa. Talvez é assim que seja a verdade ou a mentira. Escudos de algo. Por fora, a mentira-palavra. Por dentro verdade-lavra. O problema é quando a palavra se se estagmatiza em si mesmo e não libera.
Confesso que as palavras sempre me agradaram muito e quando as uso e flexiono de modo certo, mostro um pouco da minha verdade. Tento ao maximo usar o mínimo do palavriado para esconder a lavra que nem sei se é lavra como não sei se a palavra é tão mentirosa assim. Tenho em mim as duas coisas e me confunde então, acho que por isso falo poucas palavras. Sim, sou um homem de poucas palavras e percebi também que a vida me ensinou assim. Tenho a experiência do mundo e aprendi a tê-la com as experiências dos outros. Aprendi também com as pessoas que usam muito as palavras, que falam e dizem demais. Só há duas saídas: Ou a pessoa é grandiosa demais e esconde em si mais que si mesma ou as palavras nada mais são que um estado momentâneo - como a escrita? Como ela.
A saída mais fácil de encontrar é a segunda. Aí eu vejo o quanto ainda sou despreparado e que as experiencias com as experiencias do mundo são falhas e só se tem se você for o personagem chefe do seu próprio conto. Sendo mero coadjuvante, você aprende o que deveria ser feito. Sendo o ator principal você aprende o modo que deve ser feito, para que o feito não vire desfeito e então a lavra se mantenha na palavra flexionando na medida do possível, mas se mantendo fiel à união.
Ser o personagem principal indicaria ter que usar palavras. E só assim obteria a malícia. Assim poderia no futuro ter a habilidade da flexão. Poderei então usar o que a literatura tem de mais útil que são as entrelinhas. No momento o que eu digo é instável e potente. Potente porque o que digo é muito na cara e fere porque sai em faíscas, é assim por isso, por aquilo. No fundo tenho medo de ganhar a estabilidade. Nasci desequilibrado e tombo a balança do mundo. Ganhar a estabilidade poderia implicar em perder o senso e igualar-me com. Mas a vida não é assim, pense só. Brigamos com alguém. Como nosso interior tende a ser superior então se usa palavras que tem a mesma idade de nascidas. E daqui a pouco morrem mais palavras, essas palavras, outras também. Valeu a pena? Foi necessário usar palavras-irmãs? Nem sempre ser da mesma geração indica algo que seja semelhante, que faça sentido. Pelo contrário, muitas vezes, sendo de épocas diferentes as pessoas compartilham e usam palavras que soam diferentes. Mas é difícil, pois a lavra está dentro da gente insistindo em se libertar da palavra e quer dizer. Já que falei da unha inicialmente, ela também é assim veja só: cresce e sai, cresce e sai, mas sempre fica. Ela tenta por todo seu destino e não consegue sair do lado da carne e fica ali numa efusão profunda. É tanta confusão de idéias que me perdi e por isso vou direto ao fim para não ter o excesso que tanto falei por aqui.
Promoverei por fim, uma reflexão moral ou não, queiram interpretar como uma simples filosofia de botequim ou não, realmente não me importa, pois as palavras são assim. O que é melhor? O que é pior? Uma verdade aparente ou uma aparente verdade? Uma mentira verdadeira ou uma verdade mentirosa? A mentira velada ou a verdade escrachada? Algumas mentiras ou muitas verdades? Uma mentira boa ou uma verdade ruim? Cuidado ao respondê-las.