Natureza Humana
Sinto-me como se minhas pernas tivessem sido amputadas, como se minha cabeça tivesse sido decepada e meus braços fossem arrancados por algo que com exagera força tentasse me retirar do caminho, para da mesma forma que fez comigo, estraçalhar outro corpo logo à frente, de modo a destruir todas as possibilidades, essa que reside em cada um de nós, a partir de cada ato que podemos executar, esses que são a nossa única arma para lutar. Não posso mais lutar, não se me sinto um inválido, sem membros, sem pernas para andar, sem braços para tocar, sem cabeça para pensar, olhos para ver, ouvidos para ouvir, nariz para cheirar, boca para falar. É assim que o “sistema” quer que nos sintamos, imóveis, sem ação, incapazes, de modo que se possa manusear os nossos restos como se se tratasse de um monte de carne morta, que ao “sistema” serve de alimento, para que o mesmo possa ter cada vez mais energia, para continuar a realizar essa carnificina, esse aniquilamento do ser humano, aniquilamento da alma, da esperança, do ser. Mas eu não quero mais me sentir assim, não vou mais deixar o “sistema” me ferir, me mutilar, vou reagir, não vou mais deixar o “sistema” me maltratar, vou abrir meus olhos, não vou mais dormir, chega de viver de sonhos, chega de fingir que parado vou chegar em algum lugar, vou deixar que o humano que há em mim venha a brotar, e que flores nasçam, e que mais humanos brotem, e que mais flores nasçam, e que a primavera se faça, porque o inverno já foi longo demais, e já nos deixou demasiadamente anestesiados de tanto frio, quando somos na verdade seres que sentem, pois o sangue quente corre em nossas veias, e nos impele a aquecer com a nossa humanidade o mundo no qual habitamos.
Itaci Silva Camelo