Brisinha 5

Ah, minha menina. Se acaso pensas que eu, por um só dia, não pensei em ti, engana-se redondamente. Se a ausência de minha poesia não lhe passou despercebida, deixa-me dizer-lhe que a poesia se ausentou de mim. Não dá sinais de vida. Meus esforços são inúteis. Eu sento-me à mesa, no sofá, no chão, deito-me, levanto-me, leio, ouço poesias, músicas, ponho-me à frente do caderno habitual, mas nada. Nem mesmo Vinícius (velho Vininha, que muito me inspirou), consegue fazer-me dar à luz à poesia. Mesmo enquanto escrevo essas palavras de tristeza faço tremendo esforço para expressar-me. E agora temo coisas que não temia. Temo não voltar a escrever; temo ter perdido meu ritmo. Temo não mais te amar.

Sim, menina. Confesso-te que não entendo mais nem um por cento de meus sentimentos. Volto a dizer que ainda penso em ti. Mas não penso com tanto fervor. Penso em ti, mas não bate com tanta violência o coração em meu peito. Conto-lhe tais coisas, menina, pois se não o contasse certamente te esqueceria; e esqueceria de como se faz a arte escrita. Esqueceria-me de como se diz palavras à toa que se completam no vago espaço do papel.

Algumas palavras me escapam. Esqueci-me de como é bonito falar de forma complicada; não sei mais nenhuma palavra complicada. O inglês, que fui forçado a aprender por motivos de currículo, me fugiu há muito. Poucas palavras me lembro, mas sequer sei seus significados. Honey, darling, love, hope... Poderia consultar dicionários, enciclopédias, mas não adiantaria, estou certo.

Desculpe-me, menina minha, desculpe-me. Estas palavras escrevo somente por temer o esquecimento. Medo de esquecer... Medo de ser esquecido... Medo.

William Guilherme Sampaio [28/08/08]

William G Gardel
Enviado por William G Gardel em 16/05/2009
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