A felicidade

21/02/2009

Não há quem defina a felicidade, mas não há também que não entenda o que é ser feliz.

Ser feliz, no entanto, é um processo que ultrapassa as muitas fórmulas de livros de auto-ajuda. O que se faz até ser feliz muitas vezes é o que acaba impedindo a própria felicidade, especialmente quando chegamos ao tal estado esperado, e percebemos que não temos o poder de esquecer.

Esquecer é parte primordial da felicidade humana. É difícil dizer se é uma capacidade, porque por mais que até tenhamos o poder de esquecer, o ato em si exige mais esforço. Talvez porque algumas lembranças nunca estejam prontas para serem desfeitas, talvez porque algumas dessas lembranças nos falam tão profundamente que constituem a nossa própria essência – ainda que sejam dolorosas. De todo modo, esquecer não é algo que aconteça magicamente, mas que exige, além de trabalho, doses imensas de desapego.

Heráclito disse que nunca entraríamos no mesmo rio duas vezes, pois da segunda vez não seríamos as mesmas pessoas, e aquelas não seriam as mesmas águas. E assim é que as nossas vivências são sempre determinadas pelas ações prévias. É um desenrolar lógico, que faz com que o nosso olhar se volte sempre para o passado, para se orientar em relação ao futuro.

O problema, no entanto, não é o olhar para o passado, mas é não saber esquecê-lo. É achar que somos determinados também; Que fazemos parte de um processo histórico que não permite a particularidade nos seus graus mais subjetivos, pois a tudo generaliza e prediz a partir do que aconteceu, esquecendo-se que nenhuma situação é igual a outra. Se ninguém é igual a ninguém, como é que posso ter certeza que serei infeliz vivendo de um modo x, porque alguém assim o foi?

Repetimos a sabedoria do senso comum, ignorando a particularidade do nosso caso. Ignorando que jamais essa mesma situação ocorreu anteriormente, e levando em conta apenas que outros casos, tão particulares quanto os nossos, foram tornados genéricos para que pudessem satisfazer a vontade de tornar regra geral a singularidade da nossa existência.

Somente alguém que saiba o significado real do benefício que a a-historicidade nos traz será capaz de superar o passado, não esquecendo-o por definitivo, mas incorporando-o ao presente sem que dessa maneira o futuro seja definido. Só assim, poderemos romper com a necessidade da repetição: quando nos dermos conta que nada deveria ser repetido, já que somos seres humanos distintos, e cada um encerra em si um universo incapaz de ser previsível.

Assim é que sentir-se a-histórico, ou sentir que o passado, apesar de orientação não definirá o futuro, é um dos fatores mais importantes na busca da felicidade, e é o que nos faz diferentes e imprevisíveis. Esquecer deve ser tão valorizado quanto lembrar, se pensarmos que o primeiro pode nos fazer mais felizes do que o segundo.

Lílian Zopelar
Enviado por Lílian Zopelar em 10/05/2009
Código do texto: T1586569
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