Anestesia para não sentir dor; Livro para não sentir a vida
“a literatura é a forma mais agradável de ignorar a vida”
(Bernardo Soares*)
Mas quando eu fecho o livro tenho a impressão de que volto à mesma vida que vivia antes de abri-lo, e o alívio que me trazia ignorar a vida esmorece até eu esquecê-lo.
Queria eu que esses livros trouxessem não só a ignorância momentânea, mas o consolo de saber que a vida real não é a única possível.
Mas nisso sou eu - e não os livros - que falho, pois me falta a habilidade de recolher em mim a essência dos livros que leio, já que parece-me que a vida que levo na verdade é quem me leva e que ela espera ansiosa o momento em que deixo o livro e vem correndo me fazer esquecer todos os outros mundos que conheço. Parece ressentir-se do fato de eu querer ignorá-la e sufoca-me com mais furor.
*heterônimo de Fernando Pessoa