O quanto amo minhas mãos

No silêncio gelado da noite um susto: Não sinto as minhas mãos! Procuro pelos cantos e recantos do meu corpo acariciado pelo cobertor da minha pele macia, mas não encontro. Uma lágrima caiu, diante do tremor mórbido da ausência desse sentido maravilhoso. Não sinto mais minhas digitais nem o estalo dos meus dedos. Por tantos anos o meu tato me acompanhou nas minhas andanças pelo meu habitat natural, sem mencionar nossas aventuras secretas que só aconteceram em concordância de nós dois. Tantos apertos com outras da mesma espécie, tantas trocas de carinhos sentimentalistas, tantos sonhos ainda esperados os quais teríamos a certeza que seriam realizados, como pode agora tudo ir pelo córrego abaixo até se perder na imensidão do mar?

Mesmo diante de todas as desgraças possíveis, sabe o que mais me atormenta? Não poder mais indicar o caminho a ninguém! Poderia eu citar aqui todas a dificuldades que eu teria, como não mais poder levar aquele copo de leite gelado até a minha boca, não mais fazer estremecer o corpo do meu amor com uma sensibilidade única, não mais articular as juntas dos meus dedos, não mais poder dar porradas no mal e nos seus discípulos, não mais escrever o meu nome no papel, não mais jogar beijos pela platéia agradecida, entre tantas outras coisas que seriam ausentadas, mas não mais poder indicar o caminho certo a mais ninguém isso é imperdoável. Como posso agora retribuir o favor a aquela mão superior que me indicou a estrada certa?

De repente, tudo se torna escuro no meu quarto ainda gelado, enquanto a luz se ausenta ouço vozes e imagino que a minha loucura está aproximando. Mas incompreensivelmente não consigo entender uma palavra, o que me deixa mais aflito ainda, em meio à imensidão das trevas. Então surge a razão pela qual eu estou escrevendo. Sinto um toque levemente aconchegante dizendo que está tudo bem e que foi só um sonhos. Bendita mão. Nesse instante ressuscito de meu pesadelo! Que alívio outrora esperado. Como é bom voltar a sentir aquele toque quase imperceptível das moléculas de ar pairando sobre as minhas mãos, sentir o sangue circulando por entre as veias, sentir o calor de quem realmente gosta de me. O quanto amo as minhas mãos. Nunca imaginei o quanto necessito delas e quanto ela represente, mas agora sei e o conselho maior: cuide bem das suas mãos, pois se as perder, você vai sentir falta delas!

Getulio Chaves
Enviado por Getulio Chaves em 09/08/2008
Código do texto: T1120385
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