Por que minhas relações escorrem pelas mãos? A liquidez está em mim ou nos outros?

Questionar – me, indagar – me sobre minha própria realidade é desconcertante. Não é mera busca por certezas, mas a tentativa de me aproximar de minhas verdades mais profundas... Ao fazer isso, me deparo com questões que me desnorteiam, que evito pensar, relembrar... Só a hipótese de sondar a respeito faz minha mãos suarem e meu coração bater mais forte. Vagas menções sobre minhas inquietações me desestabilizam, mas persisto. Na intenção de me compreender melhor, e me sentir menos angustiada...

Sendo assim, me pergunto: por que minhas relações não parecem sólidas? Por que constantemente as vejo escorrer em minhas mãos sem que eu consiga contê – las? Serei eu culpada? Os erros estão em mim? Ou serão os outros? Aqueles que são o foco de minhas relações? Não falo apenas de relações amorosas, mas de toda e qualquer relação, fraterna, de amizade, até mesmo aquelas que brotam do seio familiar... Pois todas parecem frágeis, vagas... Escorrendo frente aos meus olhos sem que eu saiba o que fazer.

Sofro com isso, choro sem saber como agir para evitar essa liquidez. Quando busco estabelecer laços profundos, relações sólidas, me deparo à fragilidade dos vínculos humanos que parecem tão imprevisíveis e confusos. Inconstantes nos dias de hoje, seja nas relações estabelecidas cm o próximo ou na tentativa de voltar – se pra dentro, olhar pra nós mesmos...

Percebo que estou envolvida por teias de relações frágeis, que se desfazem quando o que mais queria era manter – me atada a todo carinho que vagamente me é oferecido. Ao olhar pra mim, não entendo por que existem bolhas d’água a minha volta, representando cada uma das relações que estabeleço, prestes a estourar e escorrer por completo, por um simples descuido, por obras do acaso. Me pergunto por que todo e qualquer carinho me parece sempre tão puro, verdadeiro, profundo, mas rapidamente se esvai. Tomam de mim toda a beleza que li eu via, toda a importância que eu depositava. E me angustio...

Preciso me sentir amada, protegida, cercada por pessoas que estabeleçam laços comigo e me acolham, cerquem. Preciso sentir que o afeto que ofereço é tomado como algo único, de infinito valor. Preciso suportar e aprender que não é bem assim. Não... Não para os outros, não para aqueles a quem me dou.

Me questiono... Por que é desse jeito? Seria loucura minha? Será que minha visão está distorcida? Que me apego a gestos pequenos demais para serem levados tão a sério? Que traduzo qualquer tentativa de aproximação com uma dimensão maior que a real? Não consigo suportar a idéia de culpar aqueles com quem me relaciono, por não darem tamanha importância aos laços que criam comigo.

Nessas horas, com o coração apertado, mas esperançoso, me volto para minha família e, vejo que mesmo ali há fragilidade. Mirando – a percebo que ali resiste à intenção do amor puro, de um afeto profundo, ao menos em algumas instâncias. Pois em um dado momento, enxergo que, há sim relações estremecidas, até mesmo ali... Por conta dos desejos individuais, dos desejos intrínsecos a cada um que ali coabita, o todo é desmerecido.

Então indago, nem ali resiste à solidez? Sim, têm de ser possível que ao menos no ambiente familiar construam – se raízes. Talvez se aceitarem abrir mão dos desejos fortuitos, dos desmandos descabidos, vingue um amor pleno e comum a todos. Se até mesmo entre os de mesma origem surgem desafetos, rompantes, como não existira tal carência fora dali...

Sou mais uma vez devorada pela angustia ao perceber minhas expectativas frustradas, estouradas... Aqueles a quem me dirijo na intenção de uma aproximação que perdure se esquivam, somem, derretem... Reações e relações teoricamente firmes se esgotam quando finda a necessidade, no momento em que seus desejos foram supridos, sou deixada de lado. Este é o retrato de minhas (vagas) amizades. Antes as nutria com esperança e cuidado e, num sobressalto se revelam frágeis estourando com bolhas d’água em minhas mãos sem que eu consiga juntá – las.

Por que agem assim comigo? Onde sou eu? Ou ele? Será aquele a quem dedico meu amor mais singelo o culpado por toda dor? Serei eu. Que o vejo com olhos brilhantes demais e, na verdade é mero reflexo dos meus, meus olhos ressacados (ressecados) de amor, cingidos pela dor... Vou ao seu encontro querendo doar – me por completo, me entregar, dar colo, receber seus beijos e suas angústias, suportar minhas dores e fazê – lo sorrir. E ele apenas me quer por instantes, até que se seus amigos cheguem, que sua dama ligue, carícias furtivas, gozo momentâneo, agora já foi... Já lhe basta, posso ir, servi – te com o melhor de mim e agora vou marcadas por palavras secas após lânguida noite... Por que? Quando quero estar perto á todo instante, estabelecer laços que possam ser mostrados, postos a prova, gritados pra todos e me calam... Ele não se importa, não lhe interessa me choro e carinho, saciei seus desejos, massageie seu ego, que eu suma então!

Suportar é terrível, questionar – me é necessário. Por mais dor que cause, preciso entender e conceber uma resposta pra os descasos da vida. Nem tudo são flores diziam outrora, mas também não haverá só treva. Remexendo as feridas das relações construídas (estremecidas) em casa, nas ruas, nos quartos da vida vejo eu não posso desistir. Pensar que é o fim não me sustenta, não me convence. Só me leva a solidão... Mas preciso me bastar, aprender a nem sempre esperar resposta, ansiar carinho, uma mão, um colo... O mundo está a minha volta, não o manipulo e não o deixo me dominar. Este é o caminho. Aprender a sentir a dor, suportá – la, dar lhe abrigo. Não ser dependente, mas autárquica. Que eu aprofunde minhas relações internas, olhe meu eu, somente a mim... Quando me amar o suficiente e conseguir sorrir por dentro, mirar no espelho sem lágrimas clamando, serei capaz de enxergar no exterior a possibilidade de ser feliz.

(abril.2008)

Lenina
Enviado por Lenina em 15/06/2008
Reeditado em 21/08/2008
Código do texto: T1034757
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