Realmente comunicar-se é um dom, como tantos outros - como cantar, pintar (seja paredes ou um belíssimo quadro!...); criar peças de arte, revendê-las a preços estratosféricos (estes dois últimos dons, infelizmente, quase nunca se associam numa mesma e única pessoa: quase sempre, a criatura que cria obras de arte imortais não tem o dom de vendê-las nem a qualquer preço, quanto mais a preços estratosféricos...).

Comunicar-se - satisfatoriamente - é realmente um dom. É saber externar - sinceramente - seus sentimentos - e ouvir!

E saber ouvir não é tão-somente conseguir manter a matraca fechada enquanto o outro fala: é entender o que ele falou, inclusive no plano subliminar...

A comunicação, portanto, só é plena quando há uma verdadeira interação, quando se aceita o outro como ele é e somos por este aceito como somos. Para tanto, é necessário ter já desenvolvidos (desde o nascimento, ou antes até...) uma sensibilidade, um interesse pelo outro - qualquer que seja ele. Interesse pelo outro, bem-entendido, que não seja ditado por hormônios sexuais, ou tão-somente por estes... Porque é muito fácil estar disposto a incluir os ricos e influentes, os formosos e atraentes em seu círculo de amizades. Tempos atrás, um narrador esportivo defendeu em seu programa na tv fechada "que não se pode querer excluir os ricos das atividades esportivas"... Quem o defenderia? Quem o conseguiria? Nesta mesma linha, na década passada, um líder de uma seita religiosa, dizia a plenos pulmões que na sua organização "ninguém tinha nada contra os ricos: ao contrário, eles eram muito bem- vindos!". Ora, ora, que novidade!!! Em que organização desse tipo algum rico seria mal acolhido? O problema é, precisamente, resistir à tentação de excluir os que já estão exclusos - pela pobreza ou miséria, pela inexpressividade social, pela feiúra e repulsividade...

É claro que podemos nos fazer entender plenamente mesmo quando não temos qualquer intenção amistosa: como quando comunicamos a alguém que ele está despedido...Ou quando lhe comunicamos o falecimento de seu parente querido... ou quando, taxativamente, o fazemos saber: "sua doença está em estágio terminal..." Ou quando lhe anunciamos a sua sentença de morte... São comunicações "bem-sucedidas", bem compreedidas, mas que não atingem aquela compreensão do - incluir, abrigar o outro em si mesmo. A compreensão envolvida naquelas comunicações não permitem nem o vislumbre, quanto mais a profunda percepção do outro...

Inegável que no dia-a-dia de um grande número de pessoas, fazer-se entender satisfatoriamente, seja através da palavra oral, seja da palavra escrita, é sempre um desafio - e dos maiores. O problema é que muitos só se dão conta disso quando o qüiproquó está formado - como um enorme cogumelo atômico, e a "chuva negra" da desinteligência, da discórdia, da inimizade, da malquerença já desaba sobre as cabeças de todos - até de quem não se manifestou, não concordou, não protestou ou nem estava presente no momento da malfadada manifestação... Não raro, uma brincadeirazinha sem maldade, ou uma ou duas palavras balbuciadas - ou até o silêncio - são motivo para rancores... contra você, pobre coitado(a), que estava à espera apenas de licores, de manifestações amenas, amistosas de temperamento...

Sempre é muito mais fácil não fazer amigos ou fazer inimigos - do que construir uma alegre e saudável amizade. Talvez porque estejamos sempre com os espíritos armados, prontos para "descobrir" um "a" que nos fira ou afronte... Certamente, porque fazer amigos exija que nos dispamos de nosso egoísmo, desse nosso amor próprio excessivo que termina por impedir que nos amemos verdadeiramente.

A verdade é que "a alegria do pecado" não se limita às questões que envolvem sexo, comida, bebida, fumo (ou tabaco, se assim preferirem), drogas & rock and roll: a "alegria do pecado" muito mais comumente está na inveja e no egoísmo, no ciúme, no antagonismo gratuito, infundado, na inimizade figadal, na satisfação mais do que prazerosa em causar qualquer tipo de prejuízo ao seu semelhante, seja ele conhecido ou desconhecido - semelhante que jamais é considerado como tal... É por haver tão pouca disposição para o entendimento mútuo, para a amizade fraterna e desinteressada, para a compreensão que a comunicação inteligível - em que todos se compreendem bem - se torna rara.

É por isso que em muitos ambientes em que deveriam estar aflorados o respeito e o amor ao ser humano - próximo ou distante - vêm muito mais rapidamente à tona o egoísmo, a insensibilidade, a indiferença, o desejo de transformar a desgraça alheia na fonte inesgotável de sua riqueza. Por isso, é muito mais fácil conseguir a união de muitos, a compreensão de todos - o perfeito entendimento nas comunicações - para guerras - do que para paz.