O Último Tiro

“Quinta feira

4 da manhã

25 de dezembro

Ontem a noite fiz a pior coisa de minha vida

Mas não me arrependo

E se fosse possível faria novamente

Pois se não fosse aquele ultimo tiro não estaria vivo

Sei que uma parte de mim fez por prazer

Pois possuo um grande desejo

Ver o sangue escorrer no rosto de desgraçados que não merecem ter vida

Poucos me conhecem

E os que conhecem sabem pouco

Muitos criaram um medo

Mas todos desejam meus olhos longe de suas almas

4 e 15

Alguns minutos se passaram

Mas aquelas lágrimas não saem da minha cabeça

Me vejo podre

Acendo um cigarro pra relaxar

Não ajuda em nada

Pois ainda me sinto como um verme

No fundo sei que sou apenas um verme que rasteja pelo escuro

Comendo restos de vidas só pra sobreviver

Exatamente as 5 e 26 uns caras estranhos me tiram da sanidade

Acordo amarrado em um tipo de frigorífico

Estou todo detonado

Não sei o que houve

Mais fui espancado

E pelas marcas foram muitos caras

Ou talvez um cara apenas

Não sei a quanto tempo estou aqui

Não me lembro o que aconteceu

Meu nome ou o motivo de tanto ódio que tinham de mim

Mas de uma coisa sei

Perdi a memória

Perdi minhas roupas

Mais não perdi minha sede de sobreviver

Um cara estranho abre a porta da esquerda

Ele segura um saco na mão direita

E com a mão esquerda segura um bastão de cobre

Tenho quase certeza que aquele tinha sido o desgraçado que havia me espancado

Quando ele se aproxima finjo estar dopado

Ele anota algumas coisas e prepara o saco para alguma coisa que obviamente não seria de boa intenção

Ao colocar o saco em meu pescoço segurei teu corpo com minhas pernas

Deu tanta cabeçada no desgraçado que ele desmaia em poucos segundos

Mais ainda não estava a salvo

Levantei o corpo do cara e peguei sua arma

Usei teu corpo para silenciar o tiro

Não ajudou muito

Mas consegui quebrar as correntes

Estava livre delas

Mais ainda estava num lugar desconhecido

Peguei a arma do cara e coloquei suas roupas

Passei pela porta e para meu espanto não encontrei ninguém

Só um nome

Diego Sales

Antes de sair dali encontrei uns pedaços do meu diário

A única parte legível parecia um de meus textos diários

“Algumas horas se passaram

Mas aquelas lágrimas não saem da minha cabeça...

... No fundo sei que sou apenas um verme que rasteja pelo escuro

Comendo restos de vidas só pra sobreviver...”

E uma data

25 de dezembro

Depois de fugir corri pra bem longe

Não fazia idéia de onde estava e de quem eu era

Mas algo eu sabia

Fiz alguém chorar no dia 25 de dezembro

E aquilo iria me ajudar a pegar Diego Sales

Que provavelmente seria o cara que mandou alguém me apagar

Eu estava muito cansado

Mal conseguia andar

Até que desmaiei

Depois de algumas horas acordei num quarto de hotel

Alguém havia cuidado dos meus ferimentos

Mas quem?

Foi quando ela surgiu

Daniele

Era a mulher mais perfeita que meus olhos já haviam se deparado

Mas qual teria sido o motivo de tanta gentileza?

Pois eu era apenas um desconhecido todo ferrado que acabara de cair na rua por estar todo quebrado

Ela me achou na rua e resolveu me ajudar sem motivo algum

Não sabia se podia confiar naquela mulher

Mas meus olhos não paravam de segui-la

Ela me trouxe algo pra comer e disse pra eu dormir

Sabe se lá o que houve, mas foi o que fiz

Após dormir durante 2 dias finalmente acordei

E lá estava ela

Dormindo bem do meu lado

Com aquele cheiro mágico que me consumia a cada segundo

Por mais doce que ela aparentava ser, não podia confiar numa estranha

Levanto-me

Coloco minhas roupas e saio daquele hotel

Mas antes de sair pego um dinheiro que encontro ao lado da cama

Vou até um bar

Pois eu precisava de cigarros e uma boa dose de tequila

Depois de alguns tragos, olho pro lado

E lá esta ela de novo

Daniele me achou novamente

Conversamos muito e ela me parecia ser bem confiável

Contei tudo o que havia acontecido comigo

Pelo menos o que eu lembrava

E como se não se importasse nenhum pouco ela resolveu me ajudar

Eu sabia que não podia confiar nessa mulher

Mas algo não me deixa fugir dela outra vez

No outro dia fomos até o local onde me prenderam para procurar pistas

Mas de nada serviu

Tudo estava destruído

Voltamos pra casa

A cada minuto que se passava ela se torna mais atraente

Todas as noites antes de dormir nos entregavamos aos nossos desejos

Mas aquilo me torturava por dentro

Como podia me entregar tão facilmente para uma estranha?

Passado 2 semanas de pesquisa

Tentando descobrir quem era Diego Sales

Encontrei o endereço de sua casa

Sem que Daniele percebesse fui até a casa do desgraçado

Fiquei espantado

Pois não era uma casa e sim um barco

E não havia se quer um segurança

Entrei para procurar Diego

Mas tudo o que encontrei foi uma foto

Será que é Diego e seu filho?

De nada importava mais

Só precisava encontrar Diego

Ao lado da foto havia uma fita e uma chave azul

Procurei mais pistas

Até que achei uma porta de baixo do tapete

A porta estava trancada

Mas como se eu já soubesse a chave azul abriria aquela porta

De baixo do tapete havia um porão

Fiquei mais confuso

Pois minhas roupas e armas estavam lá

Tinha certeza absoluta que Diego havia armado aquilo comigo e que ele tinha de morrer

Eu subi as escadas quando ouvi passos

Como se fosse algo automático saquei minha arma e esperei

Mas nada aconteceu

Foi quando senti um cheiro estranho e um calor insuportável

Pensei que o barco estava em chamas

Mas quando a fumaça cobriu tudo em volta tive certeza

Não pensei direito

Peguei minha arma e atirei na janela

Pulei na água e fui nadando até chegar no barco ao lado

Deitei-me pra descansar

Foi então que eu vi um ser correndo pra perto de uma igreja

Corri em direção a ele e entrei na igreja

Ao passar pela porta meu coração parou

E depois de uns 15 segundos ele voltou, dolorido

Lá estava ela de novo

Só que amarrada numa cruz e com um furo no peito

Saquei minhas armas novamente e procurei como um cão faminto um outro alguém

Minha respiração chegava a me assustar

Meu corpo se enchia de frio

E comecei a atirar feito um louco

Foi quando ouvi gemidos atrás de um banco

Corri como se aquilo fosse a única coisa que eu podia fazer

Me joguei no chão

Engatilhei as armas e mirei bem na cabeça do desgraçado

Mas antes de atirar senti em minha bota uma gota salgada de chuva

Só que não era chuva

Era a lágrima de uma criança com medo

Olhei para ela e perguntei sei nome

E no mesmo instante senti uma dor enorme no peito

Alguém havia me acertado e desmaiei de novo

O sol havia acordado e me despertou também

Ainda estava na igreja

Um padre e outros fiéis estavam a minha volta, rezando

Olhei para a cruz

Daniele não estava mais lá

Coloquei meu chapéu e fui em direção ao barco de Diego

Mas não havia nada

Apenas uns pássaros caçando comida

Olhei pro céu cinza e cai de joelhos

Pois meu mundo estava desmoronando

Voltei pro apartamento de Daniele

Eu já sabia o que iria encontrar

E assim foi

Não havia porra alguma

Apenas um toca fitas

Recordo-me da noite passada e coloco a fita no toca fitas

Era uma gravação bem porca

Chiava muito e de fundo uma voz dizia...

- Preciso de ajuda

- Tire essa dor de meu peito

- Quero fugir daqui

- Mas preciso apagar aquele tiro da minha mente

Aquelas palavras entraram na minha cabeça e aquilo me corroia a todo instante

Não sabia mais o que fazer

Foi quando senti uma vontade enorme de fumar

Coloquei a mão no bolso do meu sobretudo

Puxei meus cigarros

Só havia um

E quando o acendo senti um gosto horrível

Não havia tabaco dentro do cigarro e sim um bilhete que dizia:

- Só eu posso tirar essa dor de você

- Venha me encontrar hoje às 7 da manhã em frente à igreja

Fui até uma loja de armas e me preparei como se eu fosse pra uma guerra onde tudo dependeria das minhas balas

Esperei em uma praça que ficava em frente a igreja até dar 7 horas

Não sabia de qual igreja o bilhete se referia

Mas fui até a igreja onde encontrei Daniele e o menino

15 para as 7

E eu continuei a esperar

Fiquei olhando as pessoas que passando

Quando uma criança passou por mim

O menino parecia tão feliz

Pois teu pai estava ali, brincando com ele

Os dois pareciam tão bem juntos

Até que alguém apareceu e disse algo ao homem

Seu filho o olhou e começou a chorar

No mesmo instante imagens passaram na minha cabeça como fleshs

Eu me vi dentro de uma igreja

Apontando uma arma pra cara de um homem

Ao lado dele estava uma mulher

O rosto dela me era tão familiar

O homem me olhava com tanto ódio nos olhos

Eu atirei

E um menino apareceu correndo

Ele abraçou o pai que já estava morto

E começou a chorar

Mas o menino que chorava abraçando o pai era o mesmo menino que eu havia encontrado na igreja na noite passada

E me recordei do nome do garoto

Diego Sales

E de sua segurança pessoal

Daniele Calabar

Meus olhos se abriram e vi a igreja

Recordei-me de tudo

Miguel Sales era um mafioso muito poderoso

Que comandava toda a venda de armas da cidade

Até o dia em que ele cruzou meu caminho

E matou minha mulher só pra chamar minha atenção

Eu matei aquele canalha

Só que seu filho estava lá e viu tudo

E naquela noite o menino olhou em meus olhos e disse que ia acabar com minha vida pra vingar seu pai

E foi o que ele fez

O menino mandou me prenderem

Apagou minha memória

Escreveu o bilhete que estava no meu cigarro

E fez com que eu confiasse em Daniele

Só pra vingar o pai

E a voz na fita era do menino

Desde o dia em que eu matei o pai dele

O garoto bolou um grande plano pra me deixar louco

E naquele dia ele iria acabar comigo do mesmo modo que eu acabei com o pai dele...

7 horas

A igreja estava vazia

Alguém conseguiu a proeza

Certamente foi Diego

Entrei e me sentei

Meu coração se encontrava calmo

Isso me assustava e me aliviava

Ouvi passos atrás de mim

Aquele perfume outra vez

E em menos de um segundo, me joguei no chão

E com muita precisão acertei os joelhos em cheio

Daniele caiu agonizando e sangrando

Arrastei-me até o rosto dela

Nariz com nariz

Olhos vermelhos e sem brilho, junto aos meus...

Frios e cobertos de obscuridade

Uma bela facada em seu peito

Retirei a arma branca com calma só para sentir tua dor se ampliando

Ela estava livre deste mundo e presa no magma eterno que iria se acobertar de sua alma

Algo correu em direção ao grande sino da igreja

Uma satisfação tomava conta de meu corpo e uma força surgiu...

Subi com tanta calma

Parecia estar caminhando no céu

Homens armados entraram na igreja e começaram a atirar

Lancei-me em meio aos tiros

Fui atingido diversas vezes

Mas as balas em meu corpo não me impediram de arrancar a vida de cada um

Todos estavam caídos num manto vermelho que se ampliava

E era um deles

Parecia-me ser o fim

Tudo se encerava do mesmo modo que se iniciou

Com sangue por todos os lados

E aquele gosto me saciava tanto

Gosto de morte nos lábios era sempre tão bom

Já sentia meu corpo fervendo

O cara lá de baixo me queria tanto assim?

Não me importava mais

Fiz o que tinha de fazer

E o que eu não devia...

Tudo o que eu queria era paz

Mas a tal pomba branca havia sido morta naquele dia

Por minhas próprias balas...

E lá vinha ele...

Apontando minha própria arma em minha cabeça...

Ele fez o que eu fiz com o pai dele

O que será dessa criança depois disso?

Seguir os caminhos do falecido pai

Ou coisa pior...

Ele colocava os dedinhos no gatilho

Olhava em meus olhos

Ele realmente iria tirar a dor de mim como havia dito

Era minha ultima bala

E meu fim mais que merecido estava próximo

Espero que esse garoto não sofra mais...

Meio dia

Um massacre na igreja de uma pobre cidade

Uma mulher perdida

Homens que fizeram à escolha errada

Uma criança que nunca mais iria esquecer daqueles dias

E um vingador que teve sua chama apagada e sua alma libertada

Com um simples e...

Último Tiro”.