Vida e Trilha Sonora.

Com os fones nos ouvidos, no volume máximo, ela só escutava o que queria ouvir. Passava pela rua em sua bicicleta sentindo o vento pôr seus cabelos para trás. Não é impressionante a forma como tudo fica mais bonito quando se tem uma trilha sonora? Não ouvia as fofocas das senhoras, não ouvia os xingamentos das pessoas no trânsito diário. Apenas ouvia sua música, e via tudo como se fosse um filme.

E vai dizer que não é assim mesmo? Vai dizer que você nunca sentiu que não fazia parte dos acontecimentos ao seu redor? Que tudo o que via era um filme do qual você não era protagonista, e sim telespectadora sentada na poltrona do cinema comendo pipoca e rindo da desgraça alheia, ou da desgraçada personagem que insistiam teimosamente em dizer ser você?

Os acontecimentos em sua cabeça lhe bastavam. Ela fechava os olhos, abria os braços e se deixava levar na descida, se sentia na cena do filme ‘Cidade dos Anjos’ e logo abria os olhos para não ter o mesmo fim da personagem (embora às vezes, secreta e culposamente, desejasse isso).

E gostaria de ficar com os olhos fechados por mais tempo, sensação melhor não havia. As nuvens iam se fechando no céu, ia escurecendo, e ela queria virar parte da noite, se sentir como Estrela perdida no Espaço. Se deixava levar, se deixava noite virar, para em seguida amanhecer no canto do bem-te-vi,

e à vida real grosseiramente voltar.

Jéssica Valim Amâncio
Enviado por Jéssica Valim Amâncio em 12/06/2008
Reeditado em 18/11/2008
Código do texto: T1030979
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