Enquanto faço uma oração
Vou deixar que a poeira entre
E que tome conta da sala
Vou deixar que ela se assente
Pelos móveis, pelos talheres no escorredor
Roupas no varal e no chão
Enquanto me calo
Que as ondas se espalhem pela varanda
E molhe o jardim e o quintal
Vou obedecer ao que sua força manda
Leve a flores, os cachorros
Minha horta, minha aorta
Enquanto me ajoelho
As tardes têm trazidos as nuvens pratas
Para o altar da minha saudade
Daí tudo me espalha e nada me cata
Chova o que tiver de chover
Não vou abrir o guarda-chuva
Enquanto isso fecho os meus olhos
Vou permitir, mesmo que por enquanto
Que o punhal da maldade ou da prova
Me penetre causando meu pranto
Meu sangue irá escorrer
Depurar em plena sangria
Enquanto isso junto minhas mãos
O silêncio irá me invadir a boca desdentada
Recolherei a mim mesmo em grito
Enquanto o livro da vida se abre em páginas erradas
Vou buscar lá dentro
O que não descobri ainda do lado de fora
Enquanto faço uma oração