Um pedido a Santa Cecília


Ó Santa Cecília, deusa Santa querida!
Ajudai-me na hora que mais necessitar,
Não deixes tu, a beleza da vida voejar,
Não me abandones e aceite eu tocar,
Pelo menos a Ave-Maria,
Em sons que eu posso congratular.

Ó Santa Cecília, lembrai de mim!
Do miúdo poeta da minha rua,
Derramas a tua melodia em meus olhos,
E faças uma nuvem grande e escura,
Aos olhos do meu pai para que ele não me veja tocar.
Se tu és a padroeira dos músicos,
Venha em meu socorro!
Imploro na luz do teu coração!

O meu pai disse que vai quebrar,
Não terei condições de comprar,
Um novo trombone quando o meu pai talhar,
Será com o machado, me disse ele,
Disse ele que vai cortar ao meio,
Não quer músico na casa dele e muito menos poeta,
Por isso, eu vos peço com as lágrimas do meu coração,
Nestes pequenos versos,
Que eu não sei falar bem direito,
Guardai o meu trombone no poço,
Abras a tua bela túnica azul dourada,
Assim como fizeste na câmara de banho turco,
Ao ser julgada por venerar o único e nosso Deus,
Foste condenada a morrer asfixiada,
Num banho de água fervente,
Saindo ilesa na graça de Deus.

Ó minha Santa! Conservai o meu trombone no poço,
É o único local onde posso esconder,
E livrar dos olhos do meu pai,
Mesmo que ele utilize o poço,
Transforme o instrumento num balde d’água,
Ou deixe o meu trombone invisível.

Ele já afirmou que partirá ao meio com o machado,
Concedei-me a tua grande graça!
Não deixe que o meu pai corte o trombone em dois pedaços,
Peço-te como um bom menino que sou,
Da Rua Bom Jesus dos Passos, 351
Onde moro e guardo no poço o trombone,
Intercedei a meu favor por todas as horas,
Em que eu for um bom músico,
Não me abandone pelos meus erros,
Tenhas compaixão de mim,
Amanhã sete de outubro, vou tocar à meia-noite,
Lá pelo bairro da Refinaria,
Ouvirás a tua canção se espalhar por toda a nossa Caxias,
Guardarei o trombone amarrado numa corda,
Sou o único músico da banda que leva o trombone pra casa,
Com ordem expressa do meu professor Orguimar,
Somente assim, eu posso dormir quando eu chegar.

Minha Santa, Santa Cecília, rogai por mim!
Prometo sempre tocar na missa da Igreja da Catedral,
Lá, eu sou coroinha de Dom Luís Marelim,
Eu auxilio o bispo no grande altar de Deus,
E ainda toco no coral da Dona Lurdinha.

Ó minha Santa! Conservai o meu trombone no poço,
Lugar seguro e muito secreto,
Abriga-me no teu canto suave e divino,
Concedei-me a tua grande graça,
Não deixe que o meu pai corte o trombone em dois pedaços,
Ó minha Santa Cecília das belas pupilas,
Da face macia e alma generosa,
De um coração que cobre todo o mundo,
Não tenho condições de comprar um instrumento,
Ele é da bandinha da Prefeitura Municipal.

Ó Santa Cecília, deusa Santa querida!
Não deixe que o meu pai corte o meu trombone em dois pedaços,
Assim como não deixastes o soldado cortar a tua abençoada cabeça,
Não deixai ninguém por lá se aproximar.

Fazei-me que ninguém veja o trombone,
Ai de mim, Vossa misericordiosa do som!
Virgem Santa bela que me encanta,
Ajuda-me, que te presto um canto,
Com uma oração nestes versinhos.



Escrito em 1.10.1978, e atendido pela Santa o pedido.






 
ERASMO SHALLKYTTON
Enviado por ERASMO SHALLKYTTON em 10/02/2012
Reeditado em 07/11/2012
Código do texto: T3490366
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