PERDOA-ME, MEU PAI

Perdoa-me, meu Pai,

Por reclamar do bife mal passado,

Enquanto o meu irmão morre em pele e osso,

Ao meu lado;

Perdoa-me, meu Pai,

Por reclamar da minha casa,

Enquanto o meu irmão continua dormindo na calçada;

Perdoa-me, meu Pai,

Por reclamar uma banheira de hidromassagem,

Enquanto o meu irmão sequer tem uma latrina,

Para as suas necessidades;

Perdoa-me, meu Pai,

Por reclamar dos impostos que eu pago,

Enquanto ao meu irmão é imposta a miséria, a fome,

A discriminação e o descaso – econômico-político-social;

Perdoa-me, meu Pai,

Por proclamar os bens materiais como sinal de fé,

Enquanto o meu irmão, em esperança e fé, morre na miséria;

Perdoa-me, meu Pai,

Por fazer do teu Reino,

Não um Reino de justiça, paz e alegria no Espírito Santo,

Mas, sim, de comida, bebida e luta por poder e status eclesiástico;

Perdoa-me, meu Pai,

Por chamar-me de teu filho,

E enviar ao diabo, como filhos do diabo,

Todos os que não vivem como eu vivo;

Perdoa-me, meu Pai,

Por fechar-me dentro dessas quatro paredes,

E isolar-me num monte santo,

Enquanto o teu Filho viveu entre os homens,

E nos vales desse mundo;

Perdoa-me, meu Pai,

Por desejar o teu céu,

Enquanto o teu Filho fez-se homem,

E partilhou do sofrimento humano,

E foi humilhado, e morreu inocente,

E desceu ao Inferno – este inferno,

Para resgatar os que sofrem oprimidos pelo homem – o diabo.

Perdoa-me, meu Pai,

Por clamar o teu perdão,

E sequer sentir-me responsável pelo destino do meu irmão.

Ó, meu Pai!

Transforma! Transforma! Transforma

Em carne esse petrificado coração.

Perdoa-me, meu Pai!

Moses Adam

F.Vasconcelos, 19.6.2009