Notas de um homem supérfluo - Parte VI

Procurar ver o lado bom das coisas, essa é uma perspectiva um tanto otimista que passei a minha vida inteira ouvindo ou lendo nos livros nos quais perdi meu tempo, um tempo que se esvai lentamente, como em uma ampulheta velha nos quais os grãos de areia caem um por um, sem nenhuma pressa.

Quando tentei ver o outro lado da moeda cunhada com os símbolos que representam minha existência até aqui, quais sejam, os emblemas da desilusão, vi o seu contrário — a insígnia em alto relevo da ilusão.

Ambas, irmãs de sangue, tão próximas que se confundem. Diferentemente de outras dicotomias que dançam em campos opostos — o bem que se lança contra o mal, o novo que sucede o velho —, aqui não há antagonismo absoluto. A desilusão, ao contrário do que se pensa, não é a antítese da ilusão; é sua sombra, seu eco, o reverso da medalha pendurada em meu peito; é um suspiro de promessa, uma cortina de névoa que envolve o olhar, tornando o mundo mais macio, mais suportável. É o quadro pintado à mão tremida, mas com cores intensas, onde o que importa não é a precisão, mas o brilho que cega por um instante. Já a ilusão é o mesmo quadro, visto sob a luz crua de uma manhã sem sol. Não há destruição ali, apenas a revelação do que sempre esteve. A desilusão não apaga a ilusão; ela a traduz, às vezes em um idioma mais complicado e confuso, mas igualmente verdadeiro. Elas caminham juntas, como o espelho e o reflexo.

Quem se ilude já carrega em si a semente da desilusão. Não há traição nesse ciclo, apenas continuidade. Pois, ao contrário do amor e do ódio, que se repelem em guerras eternas, a ilusão e a desilusão coexistem, respiram o mesmo ar rarefeito e poluído. Quem sabe o oposto da ilusão não seja a desilusão, mas o vazio de sentir nada, o espaço estéril onde nenhum sonho ousa criar raízes. No fundo, o que tememos não é o momento em que a ilusão se desfaz, mas a possibilidade de nunca mais sermos tocados por ela.

Talvez, no fim, não haja escolhas, apenas passos. Porque iludir-se e desiludir-se são formas iguais de viver, e, no fundo, viver não é sempre uma espécie de ilusão desiludida?

Igor Grillo
Enviado por Igor Grillo em 01/01/2025
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