CONEXÕES

Capítulo I

Rio de Janeiro, 28 de junho de 2019.

É quase final de tarde e uma chuva torrencial, cai de repente e me deixa encharcado. Infelizmente, essa é uma das desvantagens de ser motoboy.

O centro do Rio de Janeiro apresenta um visual peculiar: imitações de construções antigas, algumas até em ruínas, com prédios colossais e arranha-céus. Ele mescla o clássico e o contemporâneo, além de abrigar tradições cariocas, como o samba nos arcos da Lapa. Contudo, é também um caos: com muitos ambulantes, um formigueiro de pessoas que não respeitam os sinais, obras da prefeitura intermináveis​​e um trânsito intenso, que se torna ainda pior com essa chuva! Mal consigo enxergar um palmo à minha frente, mas preciso fazer essa última entrega. Mantenho-me atento à estrada.

Ao chegar próximo à Avenida Passos, observo frustrado o congestionamento.

— Mas que diabo! Será que todo o mundo resolveu vir para o trabalho de carro hoje? – reclamo, até me dar conta de que é sexta-feira, o pior dia da semana para um motoboy. Quase todo mundo sai mais cedo dos escritórios, o que lota as vias de carros.

Solto o ar com força ao perceber que estou preso atrás de um ônibus maldito que me cortou e acabou me impedindo de chegar mais rápido ao semáforo. Olho para o relógio: são quase cinco e vinte da tarde. Preciso correr ou vou me atrasar para buscar Holly na escola. Ao pensar nisso, lembro da mulher linda que vi no shopping há uns quatro dias: que olhos lindos! Pareciam um par de esmeraldas emoldurados naquele rosto lindo. Ficou brava, o que a deixava sexy para cacete, porque quase derrubei o bolo que ela carregava. Devo ter parecido um idiota, porque só fiquei parado, fascinado com aquele corpo delineado e aqueles lábios vermelhos... meu Deus!

--- Me desculpa --- e é a única coisa que consigo dizer, depois de passar alguns minutos hipnotizado por ela.

Me apaixonei pela baixinha marrenta à minha frente: foi estranho porque além da atração, senti uma conexão surreal. Como se aqueles olhos verdes misteriosos pudessem desvendar os desejos mais obscuros dentro de mim.

Balanço a cabeça para afastar essa lembrança.

Finalmente, o sinal abriu e o ônibus à frente avançou, fazendo uma curva. Quando me preparo para fazer o mesmo, ouço uma buzina estridente. Viro e vejo um carro vindo em minha direção, em alta velocidade. Com reflexos rápidos, consigo desviar dele, mas não pude evitar que atropelasse uma pedestre. Todos descem de seus veículos para ajudar, inclusive eu.

À medida que me aproximo, reconheço a bolsa que da mulher atropelada : era parecida com uma que havia dado de presente para minha mãe, no seu aniversário.

Num instante, meu corpo tenso se paralisa, percebendo que minha mãe trabalha nas proximidades e provavelmente já estaria a caminho de casa. Inspiro profundamente, segurando o ar, e abro caminho entre as pessoas que formavam uma roda.

— Não pode ser você, mamãe! Por favor, Deus, não permita... – começo a rezar, mas paro ao ver o corpo dela estirado no chão. Sua cabeça estava envolta em uma poça de sangue, e seus olhos, já sem vida, olhavam para o céu.

Me sentindo tonto, eu ajoelho ao seu lado e seguro a sua mão. Grito com as pessoas para que chamem ajuda, ou ainda qualquer coisa que possa trazê-la de volta. Sirenes ao longe começam a se aproximar, enquanto a chuva espalha ainda mais o sangue pelo asfalto, misturando-se com as lágrimas desesperadoras que caem dos meus olhos.

Uma dor lancinante rasga meu peito, sufocando-me. Acho que estou tendo um ataque de pânico; De repente, tudo ao redor começa a me esmagar, e eu simplesmente esqueço como respirar...

Um zumbido começa a soar em minha cabeça, tudo começa a girar e meus olhos e ficam pesados... de repente, tudo fica preto.

Amanda Brasiliano
Enviado por Amanda Brasiliano em 19/06/2024
Reeditado em 06/07/2024
Código do texto: T8088879
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