A FACE OCULTA DA GALÁXIA capítulo 11: Valentina em ação
CAPÍTULO 11
VALENTINA EM AÇÃO
(Na parte anterior terminamos de conhecer a bizarra equipe do Professor Gaspar, com a mística Ornela Santangelo e seus "Espíritos da Galáxia". Lícia descobre no bambuzal um medalhão deixado pelo Bengala em sua fuga e abre o objeto com facilidade revelando o seu interior, façanha que deixa Vésper estarrecida. Agora acompanhamos a equipe de Beng pelos caminhos de Sombrio, seguindo a pista do Artefato. E Valentina mais uma vez mostrará seus talentos especiais.)
A maquiagem me transformara numa velha de cabelos brancos — não caquética como o disfarce de Valongo, o que limitaria desnecessariamente os meus movimentos, mas de qualquer forma eu ficara irreconhecível. Valentina virara uma doidivanas psicodélica, com pinturas no rosto. Seria a minha neta, imaginem. Eu teria que mostrar descontentamento por ter uma neta daquelas. Beng era meu irmão, Tenessee meu primo, Rotterdam meu filho e pai da Valentina. E todo mundo com nome falso. Eu detestava aquelas palhaçadas, mas fazer o que?
A incursão em terreno alienígena era perigosíssima. Oficialmente estávamos em paz e muitos seres humanos circulavam livremente pelo planeta dos sombrianos. Retirar o artefato, porém, envolvia enorme risco de vida. Deveríamos nos aproveitar da ignorância em que estavam aqueles sapos a respeito do assunto; seu governo certamente escondia o caso do povo. Era essa a evidencia que possuíamos.
Seguíamos portanto pela Grande Estrada-Tronco Norte-Sul de Tuppôtapotapik, e em M’puiftarpt atravessaríamos o Canal das Sombras Ardentes, para chegar a Gepxertohort. Eu me sentia triste e saudosa. Teria de bom grado trocado a Valentina pela Licia naquela jornada! Mas tivera que me despedir de Licia e agüentar a presença da viking.
Sentada ao meu lado, no banco de trás, ela já me dera uma cotovelada, como a lembrar-me que não desistiria de seu intento.
Nós saíramos na calada da noite, iluminada por satélites mais próximos da litosfera que a lua terrestre, e que desenhavam sombras medonhas com seus recortes de negras escarpas, de dentes pontiagudos e altíssimos em proporção com o raio de pequenos orbes. Era tudo muito terrível e Beng, sempre querendo absorver para si as funções principais, insistia em pilotar, e nós seguíamos agora voando — entre apavorantes paredões negros de ancestrais e fantasmagóricos canhões. Lendas primitivas diziam que aquele era o planeta do centro do universo, isto é, que ele constituía o centro do átomo primevo, antes de se dar o Big Bang, há tantos éons. Daí, conforme a explicação de Ataliba Yezzi, nosso gênio ambulante, uma seita dos habitantes de Sombrio defendia a posse do artefato divino que faria a glória do planeta ancestral ser reconhecida no universo. Eu, que nem sequer acreditava no Big Bang, não ligava a mínima para lendas e pretensões tão absurdas. Uma ideia, porém, despertou no fundo de minha mente, trazendo-me um pouco de inquietação: que sucedera com a equipe rival do circo, que não dera mais sinal de vida? Desfalcada do homem-porco e do mágico (que aparentemente fora morto pelo Bengala), teria desistido?
A aparelhagem microeletrônica que utilizávamos devia ser o suficiente para despistar eventuais perseguidores ou rastreadores. Beng e Rotterdam afirmavam que nós possuíamos a última das últimas das gerações. Nos últimos tempos, porém, era uma confusão de aparelhos de escuta, contra-escuta, anulação de escuta, anulador de anulador, contra-anulador de anulador de anulações, contra-contra, anti-rastreador, perturbador de anti-rastreador, contra-perturbador, anti-contra perturbador e por aí afora, "ad infinitum", que nós nunca podíamos ter a certeza absoluta de estar a salvo de quem nos vigiasse.
Estavam nesse pé os meus devaneios quando Valentina observou:
— Estão vendo aquele bando de balões voadores? Pois uma das sombras que eles lançam nos rochedos não é deles.
Procurei observar, acionando a transparência do teto, já que o fato se dava à nossa direita e eu estava à esquerda da viking. Comandei a visão telescópico-cibernética do magiplast e de fato, uma das sombras vertiginosas parecia possuir umas arestas que nenhum balão possuiria.
Tenessee disse uma praga e Valentina ligou seu filmador.
— Não pode haver mais de duas pessoas nesse veículo, a não ser que sejam anões — sentenciou.
— Não podemos fazer nada — observou Beng. — Pode ser uma patrulha das forças locais, e evidentemente eles têm o direito de patrulhar seu próprio planeta e de nos investigar. E mesmo que sejam visitantes como nós, também têm direito ao espaço aéreo.
— Então o que vamos fazer, chefe? — quis saber Rotterdam.
— Eu digo o que vamos fazer, e para o inferno com as regras! — rosnou Valentina. — Eu sei do que é capaz uma revoada de balões voadores e ninguém poderá nos acusar de nada!
— Espere! — disse Beng. — O que você pretende? Eu proíbo que coloque a nossa missão em risco!
Valentina já abrira a janela e direcionava um apito para o bando de gigantescos pássaros, dezenas de metros acima.
— Ultra-sons, chefe. Não se preocupe, isso oficialmente não é uma arma. Eles não nos seguirão!
Isso era verdade! Os ultra-sons podiam lançar o pânico naqueles e em outros pássaros daquele mundo. Era um mundo mais leve, mais oxigenado, onde as aves voavam mais alto; mas não eram imunes aos truques maldosos dos seres humanos.
Eu vi o que aconteceu. Vi a nave em forma de ave estufada ser lançada contra as rochas e explodir, caindo pesadamente e espatifando-se lá embaixo.
Esperava que Beng se mostrasse indignado diante daquele assassínio. Mas o que escutei foi:
— Bom trabalho, garota. Livrou-nos de alguns dos nossos inimigos!
Maldita profissão! Para ser boa, você tem que ser má!
(A jornada ainda não terminou. Porém antes que ela chegue ao fim uma grande surpresa está reservada para os participantes: Vésper, Valentina, Beng, Tenessee e Rotterdam. Mas como é surpresa, nada posso revelar por enquanto.
Em breve:
CAPÍTULO 12
SURPRESA!)
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