A FACE OCULTA DA GALÁXIA capítulo 2: Assédio sexual

 

(Vimos na introdução como Joana Pimentel, a Vésper, agente mercenária, aceitou cinco anos após a morte de seu marido, participar de outra missão da Cosmopol, desta vez para recuperar um misterioso objeto cósmico. No capítulo 1 ela se reuniu com os demais agentes da missão: o próprio chefe Beng, os agentes Tenessee e Rotterdam e a mercenária Valentina, conhecida assassina profissional.)

 

 

CAPÍTULO 2

 

 

ASSÉDIO SEXUAL

 

 

Nossa primeira parada era a Roda Espacial Zênite, situada a mais de 150.000 quilômetros da superfície da Terra; constituía um excelente trampolim para as estrelas. De lá, pegaríamos uma nave fotônica subespacial que viajaria pelo hiperespaço, único meio de percorrer em nosso tempo de vida uma distancia tão grande. Para aproveitar as influências do campo hipergravitacional, navegaríamos seguindo as coordenadas das espirais da Via Láctea e não, como pareceria mais lógico, em diagonal.

É claro que, no aperto da nave orbital, com aqueles bancos em anfiteatro e vários passageiros no mesmo andar, era impossível conversar sobre o trabalho. Assim, a maioria, eu inclusive, preferia ler alguma coisa nos poucos minutos de vôo a gravidade zero. Todo mundo virou leitor em nosso grupo. Eu, pelo menos, era uma leitora sincera, inclusive de antiqualhas como “Os miseráveis” do Victor Hugo, que naquele momento lia.

Vez por outra, apertada entre Beng e Rotterdam, relanceava o olhar pelos outros presentes, e esbarrava com o rabo do olho da Valentina me fitando com insistência. Eu, hein?

Não partiríamos de imediato na roda espacial, de modo que tivemos o dia livre para espairecer. Até mesmo fazer compras.

Fazia tempo que eu não visitava a estação espacial, por isso procurei aproveitar ao máximo as horas livres. Caminhei por ruas estreitas, perdi-me por caminhos intrincados, revisitei galerias de arte e até o célebre mirante do giroscópio, de onde se descortinavam os bastidores do direcionamento da estação.

Sim, porque a órbita não era geoestacionária e ultrapassava a velocidade de rotação da Terra. Na verdade, a estação passava por cada ponto a cada 13 horas, 54 minutos e 18 segundos, ou pelo menos é o que nos afirmavam. Assim, se passássemos sobre Londres e Greenwich às 10 horas, estaríamos por lá de novo às 23h. 54’ 18’’.

— Oi, Vésper. Passeando?

Da amurada onde me encontrava, fitei a recém-chegada à minha direita. Valentina, evidentemente.

— Sim, que mais a fazer? Lembre-se, meu nome de viagem é Ester de Oliveira.

— Um nomezinho bem chatinho. Eu sei, mas não tem ninguém por perto.

— Bem, mas vamos tomar cuidado — voltei a espiar lá embaixo.

— Você é bem bonita, sabia? — assim dizendo ela tocou o meu braço direito, estendido no parapeito.

Voltei-me para ela.

— Como assim?

— Seus olhos... são como duas pérolas. Já lhe falaram isso, Vésper?

— Meu marido falava assim.

— Bom, mas ele morreu.

— É. Ele morreu. E você tem bastante tato...

— Desculpe, mas não quis magoar. Sinto por você não estar consolada ainda pela morte dele. Mas a vida continua, talvez eu possa consolá-la... se você deixar.

Tive um sobressalto.

— O que você quer dizer com isso?

— Ora, ora. Eu posso ser tão carinhosa quanto um homem. Por que você não experimenta algo diferente para variar?

Não podia acreditar no que estava ouvindo. Uma mulher estava me cantando!

— Deixa eu explicar uma coisa. Eu nunca gostei de mulher. Não sou chegada.

— Por que não experimenta... para variar?

— Fora de cogitação, Valentina.

E assim dizendo, fui me afastando.

— Se mudar de ideia, me avise!

O pior foi à noite. Bem entendido, na estação segue-se a hora da Terra; até porque o giro completo da roda se dá em cada 72 minutos, o que torna o “dia” mais curto ( não confundir essa rotação com o movimento de translação em torno da Terra). Mas quando, na praça de alimentação, O Beng veio me dar a notícia... eu pulei.

— Que está dizendo?

— Ué, que você fica num dos quartos com a Valentina e eu no outro, com os rapazes...

— Isso é que não! Prefiro dormir na harpa daquele anjinho do repuxo!

— Mas, Vésper...

— Por que não me consultou? Quem falou a você que eu quero dormir com essa potranca?

Ele acendeu um cigarro, num gesto deliberado para se acalmar..

— Qual é o problema? Por que você não fica com ela?

— Prefiro não entrar em detalhes.

— Vamos resolver isso antes que ela chegue. Afinal, já fiz as reservas... ah, me traga uma boa vodca escocesa.

— Um chá gelado de morango. — pedi.

A garçonete se foi, e eu voltei à carga.

— Não me interessam as conveniências. Eu durmo com você e pronto.

— Comigo?

— Ora, vamos! Estamos em serviço e somos profissionais. Ou não somos?

— E Valentina?

— Dormirá com os outros dois. Espero que eles aguentem a parada.

Creio que eu fui a única a se satisfazer com a mudança. Valentina pareceu ficar injuriada, os outros dois, constrangidos, e Beng, esse ficou irritado. Mas o que mais eu podia fazer, ora bolas?

 

(Logo Vésper terá outras coisas para se preocupar enquanto seguem rumo a Sombrio. Beng revela finalmente mais detalhes sobre o objeto cósmico, a chapa etérea que foi roubada de seu lugar no espaço. Os monolitos cósmicos são novidade para Vésper e seu mistério é assustador. O que significam e por que devem permanecer onde se encontram, flutuando no Cosmos?

 

A seguir em breve, nesta escrivaninha:

CAPÍTULO 3

O ARTEFATO)

 

 

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Miguel Carqueija
Enviado por Miguel Carqueija em 04/12/2023
Reeditado em 18/12/2023
Código do texto: T7947155
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