A Borda da Xícara ☕️
Distraída, Any contornava a borda da xícara com a ponta do dedo indicador.
Pensativa, viajando em seus pensamentos alternava entre um gole, uma leitura em seu livro e uma olhada no movimento. Ali em seu mundo particular, aquela borda parecia uma viagem ao redor dela mesma.
Todos os dias, frequentava o mesmo local, sentava e ali ficava algumas horas - sempre fazendo a mesma viagem.
Os garçons e garçonetes já a conheciam, assim como os frequentadores. Ela, morava no bairro vizinho, trabalhava aos arredores, e sentia-se bem em um lugar super aconchegante. Sentava-se à mesma mesa, tudo muito charmoso, vidros enormes cercavam as paredes, tudo no estilo retrô que ela tanto gostava. A música ambiente era uma viagem aos anos 90, seus cabelos sempre jogados para o lado direito, seus óculos inseparáveis de armação preta lhe faziam companhia.
Aparentemente, isso pode parecer bem triste, porém, ela sempre foi a sua melhor companhia. É claro que tinha amigos, que era muito amada por sua família assim como os amava. Mas nesses momentos ela não abria mão. Era preciso ter um momento consigo mesma, viajar e mergulhar naquele cotidiano prazeroso e preenchedor. Hora ou outra pausava seu livro para ver o movimento da rua, cumprimentar algum conhecido.
Muito diferente da maioria das pessoas, estava ali sem mexer no celular, sem fotografar o café, sem estar desconectada do que acontecia ao redor. Muitas vezes ela sorria, poderia achar isso uma ofensa, mas se sentia uma alienígena. O ambiente era muito gostoso tanto que ela esquecia esse detalhe e voltava ao seu momento. Até que Tony um garçom novato se apresentou perguntando-lhe se precisava de algo, e foi então que ela pediu um pão de queijo e um novo cappuccino.
Quando trouxe seu pedido, ele tremia, era seu primeiro dia. Pediu desculpas por ter derrubado um pouco daquele café no pires e disse que ia trocar. Todo atrapalhado ele olhava para os lados preocupado.
Any abaixou o óculos, sorriu e disse:
- Fique tranquilo, todos nós precisamos começar um dia. Eu sou muito desastrada, esbarrei a mão e o café voou.
Timidamente, ele respirou aliviado, agradeceu e gentilmente pediu licença.
Até que precisava ir embora. Pediu a conta e pagou. Antes de sair, dirigiu-se à gerência e disse:
- Quero fazer um elogio ao novo garçom. No seu primeiro dia, foi muito gentil comigo. Esbarrei a mão na xícara e ele gentilmente queria trocar o pires para mim. Gosto desse local devido a educação das pessoas.
O gerente agradeceu, e ela acenou com um até logo ao rapaz. Ele devolveu um olhar de agradecimento, pois aquele dia não estava fácil. Nem todos eram compreensivos e gentis como ela, que ao invés de reclamar, foi extremamente compreensiva. Mas isso era típico dela, sempre gentil, educada e querida por todos devido a sua doçura misturada com seu jeito forte de ser.
Tony ficou impressionado. Existiam frequentadores gentis ali. Mas ela era diferente de tudo que ele já viu. Extremamente humana e empática, lhe deu confiança para seguir seu caminho, e força para continuar sua jornada, já que depois da pandemia esse era o seu retorno ao mercado de trabalho.