A Preferida II

 

 

 

- Zé Ferreira! Zé Ferreira! Zé Ferreira! - gritava tio Manuel Pessoa (prenome retificado da narrativa do primeiro capítulo).

 

De imigrante para imigrante.

 

Tio Manuel chamava seu antigo amigo português.

 

Que ele próprio colocara na missão de estar (mais) próximo ao vovô Abraão - fosse tua outra bengala.

 

Precipuamente acompanhá-lo nas necessidades ao banheiro.

 

Não sei se por despreparo ou descuido (pra um pouco de quase tudo).

 

Que lhe fora outorgado em vida.

 

Aparece um trovão vindo do banheiro.

 

Aparecida venha aqui!

 

Logo! - conclama tio Manuel.

 

(O velho patriarca caído fêmur fraturado)

 

Hoje tia Aparecida levou o troco por haver escolhido cuidar dos próprios pais.

 

Descendência por descendência - parou num Residencial para Pessoas Idosas.

 

Há alguns dias estive lá prestigiando tia Aparecida - excepcionalmente lúcida e viril (na sua festa de aniversário de 86 anos).

 

Ela e tio Manuel (em vida) tinham adquirido o meu primeiro título.

 

Lhe presenteei com o segundo título.

 

Não soube a causa da morte de tio Manuel.

 

Estive na Missa de Sétimo Dia, celebrada na Catedral de Nossa Senhora Aparecida - onde tio Manuel e tia Aparecida eram Ministros da Eucaristia.

 

Porém.

 

Vovô (no seu andador) morreu tempo depois daquele fatídico dia da queda no banheiro - por decorrência.

 

A genuína casa da Rua Carlos Pereira 52.

 

Foi colocada para negócio imobiliário.

 

Debruçado sobre o tabuleiro da memória - lembro-me quando os primos brincavam na casa de nossos avós.

 

(de Banco Imobiliário)

 

Vida e sua sina nos ensina.

 

A minha mãe morreu de câncer - lua nova.

 

Antes que completasse 68.

 

Tinha um ano a mais de idade do que tia Aparecida.

 

Uma e outra trocavam diuturnamente telefonemas; aos ganchos dos telefones de disco; levando e trazendo as novidades - comezinhos.

 

O número do telefone de mamãe sempre foi 221-6987.

 

(acho que o da tia Aparecida era 221-2451)

 

Minha mãe faria 87 em 24 de abril/23.

 

Partilhou nessa terra sabores e dissabores... o discurso autista do esposo... o desenvolvimento da descendência - o qual o Escritor se inclui (remeto vossas senhorias ao 6° texto mais lido em nossa escrivaninha: 'Quanta Saudade')

 

Tia Aparecida é minha tia em dose dupla.

 

Porquanto além de ser a irmã mais próxima da minha saudosa mãe.

 

Foi minha professora durante a 2ª série primária - na Escola Estadual Simeão Ribeiro:

 

- Edras, agora que você já terminou sua atividade, vá ajudar aos coleguinhas - dizia na época tia Aparecida.

 

Tia Aparecida me confidenciou na visita que lhe fiz no Residencial que ficou muito arrependida.

 

Mais na Casa de Repouso existe uma programação movimentada; ao contrário -depois que o tio Manuel faleceu, às vezes deixada na mão por domésticas, na casa da Rua Carlos Pereira.

 

Lembrou que genuinamente a loja "A Preferida" se chamava "Casa Mato Verde"; enquanto instalada na terra natal dos teus pais - em Mato Verde.

 

De antiga propriedade do Sr. Elpídio Carneiro.

 

Os três irmãos dela: Antônio, Osvaldo, e Dilvanir; se mudaram jovens tentando a vida em Montes Claros, trabalhando na loja do Sr. Elpídio.

 

Passado algum tempo, os dois primeiros retornaram à Mato Verde; cansados de enriquecer quem já era rico.

 

Retornaram pra ajudarem o pai na roça.

 

Dilvanir desejou aprender o idioma Latin.

 

Mudou-se para a Capital.

 

Tio Manuel inaugurou o restaurante "Luzitânia".

 

- Gerou muita inveja no comércio local da época - diz tia Aparecida.

 

Pioneiro em frango assado, pastéis, pão com pernil, e garapa de cana de açúcar.

 

Ele adquiriu clientela (mais de 300 frangos vendidos aos finais de semana).

 

E nome na praça montes-clarense.

 

Paralelamente alí nas proximidades da Copasa, o Bar de propriedade do meu pai - "Freio de Mão".

 

Vovô Abraão comprou a loja do Sr. Elpídio e mudou de nome: "A Preferida".

 

Soube através de tia Aparecida que o seu sempre amado esposo Tio Manuel morreu em decorrência de complicações da COVID-19.

 

No último dia 12.10.2023 foi aniversário de Fabiano Parrella, primogênito de tia Lia (Maria da Graça).

 

Irmã caçula da minha mãe.

 

Ela e o seu esposo tio Gerardo foram os meus padrinhos de batismo.

 

Moram em Janaúba; e toda vez que eu ia lá passar as férias, caçava briga, apanhava mais que batia; brincando de Jogar Bola, Mamãe da Rua, Porta Bandeira, Queimada, Estilingue, Pedalando, Nadando na Piscina do Automóvel Clube, e Banhando na Beira do Rio.

 

Entre primos, primos dos primos, amigos, e até inimigos (gorutubanos).

 

Tio Gerardo também fez aniversário no dia da Padroeira.

 

- Zé Ferreira! - voltava a chamar tio Manuel.

 

- Zé Ferreira!!

 

Imperava mais do que exclamava.

 

Em prontidão, o português José Ferreira (de olhos verdes e acesos) puxava as calças bem acima da cintura - cinto preto de fivelas grossas.

 

Tio Manuel era esguio e de boca carnuda, calvo com o tempo.

 

Até onde existiu tio Manuel sacava do bolso uma fotografia que guardava com muito amor - do jovem casal. Expondo tia Aparecida na qualidade de sua eterna enamorada.

 

Ele chamou Zé Ferreira (naquela ocasião) a fim de que ajudasse a preparar os molinetes (e as iscas) para pescaria do dia seguinte.

 

Final de semana no clube "Lagoa da Barra".

 

Fomos de Kombi.

 

(o barco de polpa em cima)

 

Pescamos dourado.

 

(na década de 80)

 

Tio Manuel chegou a construir na Rua Carlos Pereira três apartamentos no quintal da antiga casa de nossos avós (depois de reformar a casa).

 

De forma inusitada, antecipou em vida a herança que deveria deixar após a morte.

 

Colocando o Ap à venda pra filho que desejasse adquirí-lo.

 

Tio Antônio deixou de trabalhar em Montes Claros e retornou pra ajudar o pai na roça - conforme bio da tia Aparecida.

 

Vó Honorinda especializou em assar biscoitos e guloseimas no forno de lenha - genuinamente no quintal da Rua Carlos Pereira.

 

Além de gerar mais de dez descendentes.

 

Adorava pomares e jardins.

 

Ti Tone acabou se revelando um fazendeiro nato.

 

Tio Osvaldo, por sua vez, herdou a habilidade de Vovô na loja de variedades.

 

Dilvanir enveredou na Universidade - e nos Tribunais de BH.

 

Tia Aparecida foi lecionar, juntamente com mamãe e tia Lia.

 

As professoras de antigamente conheciam desde àquela época sobre autismo.

 

Tia Aparecida e mamãe me colocavam em outras atividades na escola além das habituais.

 

Tia Lia fora exímia professora de História, em Janaúba.

 

Rapidamente eu terminava as minhas atividades e ia ajudar e ia atrapalhar os (as) coleguinhas.

 

Depois de moço é reconhecido o meu diagnóstico de dupla excepcionalidade (de tão edras chego a ser josé).

 

Durante a minha infância eu e mamãe íamos na fazenda de ti Tone.

 

Lembro-me acompanhar tio Antônio aos estábulos e plantações.

 

Seu cunhado.

 

Tio Cristóvão.

 

Era (também) grande fazendeiro.

 

Estive com a viúva dele (tia Teresinha) recentemente nesse aniversário de que vos falei outrora - da tia Aparecida.

 

Tia Teresinha super conservada aos 94 (noventa e quatro) parece menina.

 

Tiveram um filho que eu só soube da morte.

 

Misteriosa morte.

 

Assim como a morte de tio Osvaldo - misteriosa morte.

 

Meu primo foi assassinado na década de 70.

 

Meu tio Osvaldo - de Mal de Alzheimer (tempo depois da morte de mamãe).

 

Eu ajudava tio Osvaldo lá na loja "A Preferida".

 

Nas férias escolares, repisa.

 

Anotava as vendas que fazia e ganhava comissão.

 

Certa vez (menino ainda) atendi ao cliente perguntando.

 

- Suas ordens, por favor?

 

Ele entendeu que estaria eu querendo saber que horas eram naquele instante.

 

Olhando ao relógio de pulso me respondeu as horas.

 

Eu guardava o dinheiro que recebia, nos bolsos das camisas, dentro do guarda-roupa.

 

Por acaso.

 

O (apóstolo) Paulo.

 

Achava.

 

Ajudei tio Manuel nos finais de semana.

 

De sexta pra sábado dormia de colchonete no chão do quarto dos meus primos - Neca e Fernando.

 

Colocava o plástico - mijava na cama.

 

Partimos cidade de Bocaiuva!

 

Sábado de madrugada.

 

Zé Ferreira!!!

 

(tamo junto)

 

Vendíamos galinhas e ovos de granja.

 

O momento que eu mais gostava era o intervalo em que saboreava escaldante caldo de mocotó e tomava Coca-Cola (próximo ao Mercado Municipal de Bocaiuva).

 

Com grossos cordões de rolos.

 

Aprendi habilidade em piar galinhas e amarrar pentes de ovos.

 

Tio Manuel evoluía de Kombi para Caminhão.

 

O meu guarda-roupa na contramão.

 

Tia Aparecida disse que o Tio Manuel primeiramente aportou ao cais no Rio de Janeiro (originário de Portugal).

 

Deixando parentela tanto num, quanto no exterior.

 

Carinhosamente chamávamos a mãe de tio Manuel de "Bisa".

 

Porquanto foi bisavó aqui no Norte de Minas, trazida pelo filho da cidade natal estrangeira pras bandas do sertão.

 

Tio Manuel adorava - com certeza - quando sua única filha trocava ao piano - as nostálgicas melodias portuguesas.

 

Nunca me esquecerei de meus avós maternos, na Rua Carlos Pereira.

 

Assistindo na Televisão cenas registradas em fitas de videocassete.

 

Participando de cerimônias e festas de casamentos.

 

Apareciam ambos - Vó Honorinda e Vô Abraão.

 

Ladeados por filhas e filhos, noras e genros, netos e netas.

 

Foram momentos felizes de confraternizações da família "Mendes Costa".

 

A expertise do meu pai 'Zé do Freio de Mão' no Bar era fornecer o suco natural de laranja que somente ele sabia espremer.

 

Curando a ressaca matinal dos boêmios e seresteiros - na Rua Doutor Santos.

 

A origem dos meus avós paternos - Vô Teófilo Isidoro e Vovó Clemência, é o antigo distrito de Pires e Albuquerque, atual Alto Belo.

 

Não recordo de os haver conhecido.

 

Me dei por gente eles eram falecidos.

 

Tio Manuel quase sempre me levava pra passear com eles aos domingos - carro de passeio Passat.

 

Que bom!

 

Íamos ao restaurante "Ribatejo" no bairro Jardim São Luiz.

 

Saborear bolinhos de bacalhau regados ao azeite português e gotas de limão.

 

Picolés Kibon.

 

Foi na casa da Rua Carlos Pereira que aprendi a gostar da legítima bacalhoada portuguesa.

 

Preparada de forma artesanal (muitas batatas e azeitonas pretas) - por tio Manuel e tia Aparecida.

 

Lembro-me agora que meu pai nos levava (eu e a minha mãe) - de Corcel - ao restaurante do Aeroporto.

 

Petiscos e guaraná Antártica.

 

Tio Manuel e tia Aparecida fizeram diversas viagens de passeio à Europa - especialmente à Portugal.

 

Nas redes sociais, a amiga de infância de mamãe, Rosa Clarice, fez comentários na fotografia que postei ladeado por meus pais, durante a minha 1ª Eucaristia - na Catedral em 1983.

 

Escrevera que ela havia se casado no mesmo dia (e quase na mesma hora) que os meus pais se casaram.

 

Disse que após as cerimônias elas se abraçaram ainda vestidas de noivas.

 

Em plena Rua Carlos Pereira.

 

Aos aplausos da vizinhança.

 

Disse ainda que visitou minha mãe quando eu nasci.

 

"Nós morávamos na Rua Carlos Pereira, e casamos no mesmo dia, quase na mesma hora. Depois dos casamentos Shirley e eu saímos de nossas casas, vestidas de noivas, e abraçamos no meio da rua. Todos os vizinhos saíram nas portas e bateram palmas para nós! Nunca esquecerei deste momento!👏👏👏👏👏"

(Rosa Clarice Narciso, 30.09.2023)

 

 

Clarice Narciso é irmã da saudosa Milena (outra amiga de infância de mamãe Shirley).

 

 

 

 

 

 

 

 

 

. . . hoje tia Aparecida é "Bisa" . . .

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

📷: Minha mãe Shirley Costa (ao lado da criancinha)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Edras José
Enviado por Edras José em 18/10/2023
Código do texto: T7911416
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