Neblina e a Ninja capítulo 4: Entrevista com "Z"
CAPÍTULO 4
ENTREVISTA COM “Z”
Súmula dos capítulos precedentes:
Num futuro onde a civilização fugiu para as entranhas da Terra, a cidade de Nova Brasília foi invadida pela quadrilha dos Bandidos Negros, que havia sido expulsa da Romênia. A contragosto o Inspetor-Chefe da polícia local, Madeira, é auxiliado pela vigilante mascarada Neblina, que tem passe livre do Ministério da Justiça com base no Estatuto dos Superdotados.
Entretanto, a operação para pegar a quadrilha chefiada por Sybilla, uma mulher violenta e que usa o codnome de Ninja, resultou em fracasso pela forma desastrada como foi montada. Dois policiais morreram e a quadrilha escapou de seus esconderijos nas muralhas adjacentes à cidade subterrânea. Entretanto Neblina abateu dois dos meliantes em combate. A situação tende a se agravar, pois o bando não deixará por menos...
O gabinete era quadrado e escuro. Por trás da larga escrivaninha um homem volumoso, com um chapelão de abas largas tipo Morcego Negro (1), óculos escuros e golas altas, além da barba por fazer e roupa de Sherlock Holmes.
Sentada em frente a ele, Neblina, com seu traje negro, estava também quase invisível.
— Desta vez você se arriscou muito, Ana — ia dizendo “Z”.
— Foi isso mesmo que Madeira me disse, quando viu o cadáver. Perguntou-me pelas minhas armas. Quando eu lhe mostrei a medalha milagrosa da Rua du Bac em meu pescoço, chamou-me louca e temerária. Creio que já simpatiza comigo.
“Z” acendeu o seu charuto verde (2) e prosseguiu:
— Não obstante, considero a operação um fracasso. Madeira é um idiota. Por que ele não quis efetuar um cerco?
— A operação de cerco demandaria mais tempo e ele achou que poderia liquidar o caso num abrir e fechar de olhos.
— Quem sabe, para receber uma condecoração ou mesmo uma promoção. Sacripantas!
— E agora, Z?
— Agora? Esperar, é claro, que a Ninja tenha se assustado e resolvido fugir de Nova Brasília.
— Depois de ter assassinado quatro pessoas e ter lançado o terror na população? Será preciso mais do que isso para assustá-la. Além disso provavelmente o submundo em peso está lhe dando apoio.
— Nem todos os nossos bandidos fariam isso, Ana. Questão de patriotismo.
— Bandidos patriotas, os nossos? Que ingenuidade, Z.
— Não, Ana. Há o despeito também. Sybilla é uma rival que vem de fora...
— Está bem. Mas ela tem poder. Você está querendo dizer que acredita numa guerra de quadrilhas. Eu não acredito. O crime organizado entre nós é fraquíssimo e quem desafiar a Ninja provavelmente morrerá. Não. Os nossos meliantes a meu ver procurarão servi-la, farão um acordo. Nós é que temos que enfrentar essa figura.
— Se ainda tivéssemos um exército como os rumenos...
Realmente, as condições da vida subterrânea tornavam as instituições militares algo de supérfluo e oneroso, e poucos estados as mantinham. Cada país era um bolsão, ou conjunto de bolsões subterrâneos, sem passagem direta para os outros países. A guerra se tornara praticamente impossível. Então para que exércitos?
O bip de Z soou.
— Pode falar — disse Z.
— Chefe, ligue a tv depressa!
— O que foi que houve, Gustavo?
— Os Bandidos Negros explodiram uma escola!
Neblina se ergueu e correu para a tv-laser.
As cenas eram terríveis. Emocionada, a repórter Iracema Guaracy — das mais conhecidas na tv local — ia dizendo:
— Pois é. Segundo a mensagem que recebemos, a Ninja afirma que o atentado é uma represália pela morte de dois de seus homens de maior confiança. Com isso, vinte crianças pelo menos estão gravemente feridas. Estamos diante de algo monstruoso, inominável. E cresce a revolta da opinião pública contra as nossas autoridades. Os policiais Quintino e Aderbal, pais de família, morreram estupidamente numa operação mal planejada. Agora essa quadrilha estrangeira vai espalhando o horror e a destruição, não poupando sequer crianças, e ninguém sabe onde localizá-la. Já há quem peça plenos poderes para a vigilante Neblina, única pessoa até agora a infligir baixas à quadrilha da Ninja.
Diante dos escombros, macas se moviam removendo corpinhos. Havia sangue misturado com caliça.
Z pusera-se de pé ao lado de Ana, a Neblina. E ela, esfregando os punhos, olhar fixo, como em transe, na tela tridimensional, murmurava:
—Você me paga, Ninja... essa você me paga...
Assim, a guerra vai se configurando em torno de duas mulheres colocadas em campos opostos e irredutíveis.
(1) Personagem misterioso de G. Wayman Jones, novelista policial norte-americano.
(2) Charuto não poluente, feito com ervas medicinais.
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