A MOÇADA DA PERCEPÇÃO BLUE (REVELA AÇÕES) — XXX — XXXI —
A MOÇADA DA PERCEPÇÃO BLUE
(REVELA AÇÕES) — XXX —
A NATURALIDADE da vida sabe como se defender. Mas, por vezes, não possui os recursos para tanto. Que poderia eu fazer para me defender dessas inumeráveis condições desfavoráveis dispostas contra mim??? Paizão, Mãezona, irmãos e irmãs, uma sociedade que não sabia o que estava a acontecer no interior do circuito familiar. Não de todo. Em frente ao portão de entrada da casa onde morávamos na rua senador Teodoro Pacheco, habitavam parentes de políticos importantes que controlam o Piauí há quatro décadas.
OS PORTELAS, lá estavam elas e eles reunidos, sentados em cadeiras na calçada. Entre bate-papos, e conversas jogada fora, observavam a família de Paizão e Mãezona que, por vezes, também ficavam sentados na calçada em frente. A situação de penúria familiar da família em frente não os comovia. Mas, segundo posso lembrar, Petrônio Portela teria conseguido um emprego no Senado para um irmão meu, terceiro na lista de nascimentos contínuos de Mãezona. Posteriormente ele passou num concurso para assessor legislativo e ficado a trabalhar no Senado.
PAIZÃO E MÃEZONA iam articulando, com seus conhecimentos, a colocação de seus filhos e filhas em arranjos, de modo a se livrarem deles, mas os mantendo na coleira da proximidade familial, como se tudo estivesse na mais perfeita normalidade. Eu, buscava cobrar a saída da vizinhança deles. Nem eles me queriam por perto e eu, menos ainda queria estar perto deles. A quantidade de rejeição que vinha deles era simplesmente uma enormidade. Nenhum familiar nunca me via no contexto em que eu era diariamente desprestigiado. Eu sempre estive sobrando.
CONSIDEREI A possibilidade de ela escrever uma carta para a irmã de Paizão que morava em Niterói, sugerindo que eu ficasse hóspede deles enquanto fazia o 3° ano do curso de contabilidade. O filho mais velho dela era um playboyzinho viciado em drogas, com um complexo de inferioridade que o fazia compensar-se em estar sempre se gabando de feitos, maioria dos quais criação de sua mente incrementada pela coca, barbitúricos e marijuana. Em frente à casa deles morava um médico cujos filhos eram amigo desse filho mais velho deles.
O MARIDO da irmã de Paizão era um funcionário do Banco do Brasil que já havia sido um próspero comerciante de leite em Campos dos Goytacazes, município do estado do Rio. Proporcionava às três filhas e dois irmãos uma boa qualidade de vida. Eu tentava me adaptar ao novo ambiente sem criar conflitos. Concentrei-me nos estudos, passei com facilidade e, como não criei mais afinidades com os demais membros da família, fui solicitado a sair fora do convívio familiar deles.
O TIO ME chamou para uma conversa. Eu estava estranhando a demora da definição de minha situação de estranhamento em sua casa.
— Meu sobrinho, sua tia acha que não temos mais nenhum compromisso contigo. Chegou o momento de você buscar seu rumo noutro lugar. Ela aceitou sua vinda para nossa casa porque o Fulano (primogênito deles) tinha problemas com drogas. Você poderia influenciá-lo a gosta dos estudos. Mas isso não aconteceu. Você viveu sua vida, ele não viu em você uma influência para mudar de vida. Eu queria poder ajudá-lo e pagar um curso pré-vestibular para você. Mas ela me disse que você não é nosso filho, e por isso ela não achava certo investir num cursinho para você. Eu não concordei com ela, mas ela é quem é sua parenta. Não eu. Você pode ficar aqui o tempo preciso para achar um outro lugar para ficar. Uma semana, duas, uns vinte dias se preciso.
— Claro, tio. Você está certo. Eu estou mesmo deslocado, não soube como me inserir melhor na intimidade de vocês.
— Por mim, você ficaria morando aqui o tempo que quisesse, mas seu parentesco é com ela, sua tia. E ela acha que já te ajudamos o suficiente.
— Tudo certo, tio, sem crise. Estou de acordo e agradeço a estadia aqui. Ela contribuiu para minha formação no curso de contabilidade. A tia está certa.
NA REAL, eu havia sido aceito não apenas para que tentassem solucionar o problema com o primo primogênito, o Fulano doidão e não era só de batida de limão. A própria tia já havia me dito que a razão de eu estar na casa dela, era porque eles achavam que eu poderia ser uma boa influência para o primo mais velho, filho deles. Mas o problema de meus primos não era apenas as drogas. Meu outro primo, certa vez me disse:
— Você não curte parceria com gente do mesmo sexo. Mas isso é só porque a sociedade acha que é errado. Quem não gostaria de sentir um pau duro dentro do cu, não fosse a censura alheia???
— Eu não gostaria, pode ter certeza, respondi. Essa nunca vai ser a minha praia. — O problema da safismo estava muito bem delineado pela fala dele comigo. A tia, quem sabe acreditando em boatos, pudesse estar querendo uma companhia para seu segundo filho.
NESSA ÉPOCA eu frequentava um curso de extensão aberto para pessoas que desejavam preparo para fazer teatro. O curso, num anexo da Universidade Federal Fluminense em Niterói, incluía autoconhecimento, desenvolvimento da comunicação pessoal, interatividade, aprendizado de Yoga, técnica de respiração, expressão corporal, leitura de peças, comentário sobre personagens...
ERA MINISTRADO por um homem chamado Sileia Nascimento. O curso incluía incursões de final de semana em praias nos arredores da cidade, nas quais os exercícios eram físicos. Essa interação me aproximou de Anne Marie, uma jovem mulher que habitava próxima à residência do tio e que também frequentava o curso. Descendente de alemães ela tinha cabelos louros, design nórdico, apesar de também não ter graduação, frequentava o ambiente da UFF. Aprendi muitas coisas luxuriosas com essa amizade. Apesar de até então, meu relacionamento sexual se limitara às garotas do baixo meretrício da cidade natal, onde proliferavam os lupanares dos mais diversos modelos. E acompanhantes oferecidas, cheias das mais variadas doenças venéreas.
A MOÇADA DA PERCEPÇÃO BLUE
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DOIS VELHOS (31)
DA ESCÓCIA do século XI para o Brasil do século XXI, a tragédia de Macbeth e de Lady Macbeth, cruel, mordaz, traiçoeira, charlatã e ardilosa, se repete em todos os lares de famílias das mais diversas classes sociais. Dos barracos nos buracos negros elevados das favelas, aos edifícios cinco estrelas da especulação imobiliária.
A FAMÍLIA, movida pela vontade de ver os seus se tornarem pessoas com recursos, os mais próximos possíveis da realeza financeira e econômica da sociedade consumista, é movida pela ambição de ver seus filhos alcançarem os altos salários de jogadores de times de futebol. Para as Lady Macbeth da realeza favelada, seus meninos se tornarão futuros Neymar nos mares revoltos da lavagem internacional de dinheiro do tráfico cosmopolita de drogas, Por detrás das transferências de jogadores para outros times. Suas filhas logo aprenderão com quantos paus se faz uma canoa, para que naveguem nos mares revoltos da libido sadomasoquista da selvageria nacional.
QUE IMPORTA para essas Lady Macbeth das classes sociais das mais baixas às mais altas, um padrão nacional aceitável de cultura que não seja para a prostituição e o tráfico??? Todos estão a beber e a comer o caldo macabro cozinhado na caçarola das cozinhas televisivas, com seus pratos requintados, bonitos, deliciosos, criativos, cheios de convites dos mestres cucas de restaurantes famosos, para o banquete de refeições saborosas no ambiente agradável das Lady Macbeth das classes mais altas.
TODOS ESTÃO ocupados em se repetir e copiar as deliciosas receitas que, no final das compras e preparo dos ingredientes no caldeirão das bruxas das cozinhas que se copiam em delícias dos “chefes” famosos, que reinam em ofertas atrativas de como usar os melhores temperos nas carnes do apetite carnal de consumidores de calorias, as mais atrativas para a degustação e a fermentação alimentar no dia a dia, no carrinho do supermercado das compras.
OS REIS E AS rainhas Macbeth da sociedade consumista, estão dedicados aos valores e princípios da transformação fisioquímica dos alimentos no organismo do Inconsciente Coletivo das tripas sociais. Todas as associações, grêmios, confrarias, sociedades explícitas e as secretas, os clubes, os círculos de influência política, religiosa e econômica, as congregações, as irmandades, as assembleias, o Congresso, os encontros internacionais. Todos se dão conta de sentar a bunda nos restaurantes favoritos no ritual diário do grande e monstruoso estômago Come Comes, devorador incansável de alimentos no reinado imperioso da digestão que começa na língua solta dentro da boca.
O MAIS TENEBROSO dos dramas shakespearianos, segundo o crítico literário Harold Bloom, Macbeth é a mais viçosa oportunidade para se refletir os aspectos mais sombrios e punctiformes do comportamento humano: da traição, da ganância e da culpa. No final dos dizeres e prazeres degustativos, para onde vão os alimentos em sua viagem até o “trono de sangue” dos sanitários???
QUEM SE IMPORTA com qualidade de percepção própria e social de vida??? Quem se importa com uma educação escolar e superior arbitrária, que só os conduz para o cotidiano exercitar de profissões, como se não fossem mais do que androides mecânicos a exercer funções para ganho de salário??? Quem se importa com a fermentação subsequente do bolo alimentar que vai ela faringe e o esôfago até o estômago onde a digestão continuará seu curso em direção ao empoderamento dos sanitários, após a diluição pelos sucos gástricos, onde não mais sugerem sabores deliciosos.
O INTESTINO delgado e o intestino grosso são as próximas paradas das delícias ingeridas e recomendadas pelos chefes nacionais e internacionais das cozinhas de reis e rainhas Macbeth, onde os capilares pegam os nutrientes e os distribuem para todo o corpo desses nobres desfrutadores da gula. A essas alturas do basquete, os restos sólidos dos alimentos já são esperados pelo ânus.
É DE SE perguntar por que, durante todo esse trajeto nobre, não houve nenhuma consideração Ética em toda essa travessia, que pudesse se ater a resposta à pergunta: Esse abastecimento do corpo serve ao intelecto, à espiritualidade??? Que transcendência há nesses organismos devoradores de alimentos??? Eles não servem nadica de nada para qualificar pensamentos, palavras e obras???
PODEMOS AGORA lembrar qual é o significado da palavra “engalicado”??? Sabemos que Paizão e Mãezona, esta, sempre inocente de tudo o mais que não fossem seus interesses, os mais suspeitos e ocultos, haviam identificado que seus filhos, quase todos estavam com sífilis. Mãezona se perguntava, toda posando de inocentinha”: Como se não soubesse que o marido molhava os dedos na porra da calça do pijama, ou na cueca, de e, ato contínuo, os esfregava nas gengivas de seus filhos e filhas quando em seu colo.
— Onde essas crianças foram contrair essa doença???
ELA CONHECIA a fonte da infecção sexualmente transmissível, causada pela bactéria Treponema pallidum. Mãezona certamente continuava a, indiretamente, reforçar todas as patologias criminosas de Paizão com relação aos filhos e filhas. Sempre fazendo de conta que nada sabia de coisa nenhuma. Coisas que aconteciam bem debaixo de seu nariz. No palácio dessas nobrezas de Lady Mãezona Macbeth, e de seu cônjuge Paizão, as adversidades se multiplicavam como se fossem naturais.
A SUBMISSÃO familiar era ampla, total e irrestrita. Seus demais filhos estavam cada dia mais encolhidos pelo medo de que Paizão os começasse a tratar do mesmo modo que me dispensava os espancamentos quase diários. Mãezona, após essas sessões de nítida covardia e superlativa vontade de me exterminar, enquanto forma de me alijar dos meus direitos à educação, alimentação e vestimentas.
NOS DIAS posteriores aos espancamentos, ela dizia em voz baixa, aproximando a boca de um de meus ouvidos:
— Você não vai ao colégio, até se recuperar desses ferimentos. Alterando a voz que se tornava mais nítida e autoritária, complementava:
— Quando perguntarem como isso aconteceu, diga que estava a colher mangas quando despencou lá de cima. Ensinava-me a faltar com a verdade e a falsear a realidade em proveito de encobrir e disfarçar as atrocidades familiares, quase que diárias, de Paizão.