A MOÇADA DA PERCEPÇÃO BLUE (REVELA AÇÕES) — X —
A MOÇADA DA PERCEPÇÃO BLUE
(REVELA AÇÕES) — X —
WE SHALL NOT GO TO MARKET TODAY
CRESCIMENTO MESMO, sem ser o físico, inexistia. Nem intelectual nem espiritual. A parte interna da personalidade estava estagnada. Havia a volta ao mesmo lugar no qual a possibilidade de evolução mental esbarrava numa espécie de arrecife onde todos ficavam, náufragos, sem possibilidade de perscrutar espaços adiante da palma do nariz. Espaços de ganho em conhecimento, sabedoria, ciência, cultura.
DESEJAVAM TALVEZ que outros educassem seus filhos porque, eles mesmos, não se haviam educado, nem tiveram alguém que soubesse orientá-los. Nada era responsabilidade daquela mulher perdida no tempo e no espaço. Seu espírito era completamente desnorteado. Não apenas não cresceram em cognição e absorção das essências que se lhes apresentava a realidade. Mas também se impediam de crescer como se isso fosse uma defesa para que sua própria ignorância não corresse o risco de ser contestada. Se eu crescesse física, mental e intelectualmente, eles seriam desvendados e ficariam nus diante da própria rudez, incultura, incompetência.
IMPEDIR-ME DE crescer era para eles uma defesa de questão de sobrevivência. Paizão Coisinha e a seu cônjuge, o Mito Mãe, não tinham força emocional voltada para criar condições de educar em direção ao crescimento moral familiar. Para eles era completamente incompreensível que eu, tendo sido gerado da pasmaceira, da bagaceira mental e emocional deles, pudesse querer ser algo diverso de suas limitações. Para eles não era apenas algo incompreensível, era algo inexequível. Não havia tangibilidade em meu querer ser diferente deles, de suas limitações palpáveis.
SE EU PUDESSE alcançar um estágio intelectual mais adequado às possibilidades naturais de meu intelecto, eles se sentiriam rebaixados na atuação de pais. Na avaliação deles, poderiam ser humilhados por seu próprio filho diante da plateia para a qual atuavam: seus vizinhos, as empregadas domésticas, a prole que nos observava. Eu, ainda que muito jovem estava sendo pressionado cavilosamente, ardilosamente por ela que queria manter-me num estado de penúria física, uma pedra bruta na qual ela pudesse sempre praticar sua nefasta e paupérrima empatia de mulher que curso, quando muito, o segundo ano ginasial. E tinha a esperança de se casar com algum sujeito desavisado que pudesse ser tão bronco quanto ela. Ou mais.
ELA NÃO RECONHECIA minha inteligência mental nem a emocional. Como diria o tio Bebê, irmão creio que mais novo dela, numa das vezes que nos visitava a casa: “o que teus pais querem é se preservarem de tua inteligência”. Ele conversava comigo quando nenhum dos dois estava por perto. Eles vigiavam as pessoas que de mim se aproximavam para cuidar de que a influência delas não pudesse ter atuação sobre mim. Tio Bebê sabia disso e me dava uns toques de como eu poderia resistir a essas influências nefastas.
EUZINHO QUERIA garantir menos sofrimentos e injúrias em meu futuro, mas estava difícil de convencê-los que não se protege um filho dos perigos do mundo agindo como eles agiam para comigo. Certo dia eu me acerquei no colo dela com um farto maço de dinheiro. Abracei-lhe as coxas tentando não ser rejeitado, porque por vezes ela simplesmente me afastava com gestos de mãos e braços de quem queria distância de mim, ou repelia minha aproximação. Dessa vez não aconteceu a refutação de minha presença, porque talvez tivesse lhe causado certa curiosidade aquele maço farto de papel moeda que causou surpresa nela e ao mesmo tempo interesse. Curiosidade.
ELA LOGO SE dispôs a me azucrinar numa tonalidade simulada de repreensão perguntando com presumida reprovação:
— Como você conseguiu esse dinheiro??? O interesse dela pela grana era evidenciado pela maneira com que ela parecia valorizar no olhar e no apertar o maço de dinheiro em mão, que apertava contra o tronco.
EU TERIA DE LHE contar toda a história que até aquele momento eu mantive em silêncio. Antes de respondê-la é preciso explicar ao leitor que o Zucca, um amigo meu de cor, que morava próximo à beira do rio, vinha juntar-se à turma de meninos da vizinhança que nada tinham a fazer, senão explorar as redondezas. Nos finais de semana lá estávamos, a turma de garotos a brincar de esconde-esconde, quando nos infiltrávamos nas dependências do Colégio que nos finais de semana ficava com as salas de aula e o grande pátio de recreio, vazios.
ÉRAMOS INTRUSOS a penetrar um território inexplorado, como se fôssemos exploradores de cavernas, entrávamos nas salas de aula abandonadas, corredores, banheiros, e buscávamos penetrar também no aposento principal da secretaria que estava com portas trancadas a sete chaves. Para ter acesso ao lugar em que, na nossa imaginação seria o local mais misterioso do colégio, buscávamos uma entrada sem que se conseguisse acesso aos segredos da hermética câmara ou recinto proibido.
HAVIA UM ACESSO na forma de uma pequena abóbada, na qual mal passaria um corpo infantil que fosse bem magro. Um nicho através do qual o professor e diretor Juracir mantinha contato nos dias úteis, com seus subordinados, professores e alunos. O acesso permitia comunicação entre a secretaria e a sala dos professores. O local era cercado de proibições de entrada. Era lá que a burocracia da escola guardava o papelório e a burocracia: as provas, os arquivos de alunos, pagamentos, recebimentos se faziam por lá.
TENTÁVAMOS PENETRAR, um e outro garotos, pela pequena arcada há um metro e meio acima do rodapé na parede. Enquanto tentávamos a proeza de passar para o salão proibido, eis que chega o vigia e, após interrogar sobre o que fazíamos ali, que era proibido, como havíamos entrado, que iria dizer aos nossos pais que certamente seríamos castigados. Usei o argumento que estávamos apenas a brincar, que nada demais havia acontecido, E que, já agora, estávamos de saída.