Q.B. - NOS CALCANHARES DO VENTO - PARTE 2

VII - NOS CALCANHARES DO VENTO

”I’m a page on the end of a story

(“Sou uma página no final de uma estória)

No closer to my hope and glory

(Nada perto da minha esperança e glória)

Just a kick away from the heels of the wind”

(Só a um pontapé distância dos calcanhares do vento”)

“Heels of the wind” – Álbum THE FOX - 1981

Elton olhou para o amigo e ficou em silêncio. Bernie sentou-se do sofá ao lado dele e apoiou os braços nos joelhos. Elton começou a chorar ao lembrar-se de Lennon de novo e escondeu o rosto nas mãos. Preocupado, Bernie ficou sem ação e continuou olhando para ele até que a emoção passasse, sem saber o que dizer ou fazer. Sabia que o amigo nunca lidava bem com morte e era bem propenso a ficar depressivo. Na verdade nunca tinha conseguido lidar com aquilo.

- Tudo bem? - perguntou, minutos depois. – Acho que falei demais...

- Desculpa... disse Elton, começando a enxugar os olhos e a lente que usava acabou caindo em sua mão.

- Droga!

- Que foi?

- Minha lente caiu! Eu sempre esqueço de que estou com essa porcaria!

- A usar uma porcaria que não me permite chorar, preferia usar os óculos mesmo.

- Ela caiu no tapete, disse Elton, ainda enxugando o rosto e tirando a outra lente.

Bernie ajoelhou-se e começou a procurar a lente no meio das fibras do grosso tapete.

- Você inventa cada uma!

- A culpa foi sua. Esquece! Você não vai achar nunca uma lente no meio desses cinco centímetros de pelos.

- Se eu posso achar os brincos da Toni aqui, tudo é possível.

- Por falar nisso, onde ela está?

- Num coquetel em Beverly Hills.

- Sozinha?

- Não, com o agente dela. Achei! - exclamou, aproximando o rosto do chão.

- Achou?

- Minha abotoadura, disse ele, erguendo a joia. - Perdi faz três semanas. A Toni ficou doida porque ela me deu de presente e no dia em que eu ia usar pela primeira vez, perdi aqui na sala. Achei, graças a você.

Elton começou a rir. Bernie fez o mesmo sentado no tapete e encostando-se no sofá.

- Você não tem óculos reserva no carro?

- Não, só em casa.

- Bem, então é simples: você dorme aqui e amanhã eu te levo pra casa. Quer beber alguma coisa? Bem leve, claro.

- Quero sim.

- Então, sirva-se. Você sabe o caminho do bar e do estúdio. Me espera lá, eu já venho.

Ele correu para a escada e subiu, também correndo. Elton ficou olhando para ele, até que sumisse no alto da escada. Depois, olhou para a pasta onde Bernie tinha guardado as folhas e apanhou algumas, começando a ler enquanto ia para o estúdio de Bernie, que ficava no final de um corredor, finamente decorado com todo tipo de obras de arte espanhola, esculturas e pinturas modernas, alguma delas pintadas pelo próprio Bernie.

Entrou no amplo aposento e foi até o piano que Bernie possuía desde os tempos em que ambos eram parceiros em tempo integral. Sentou-se na banqueta e continuou a ler uma ou outra página, com certa dificuldade, pois estava sem os óculos. Depois de algum tempo, parou, porque os olhos começaram a arder. Colocou as folhas sobre o piano, esfregando os olhos em seguida.

A garganta estava seca e ele foi até o bar. Ficou olhando para as garrafas e lembrou-se das coisas que Graham Taylor, dirigente do Watford, vivia lhe dizendo a respeito de bebidas desde que o havia proibido amigavelmente de tocar num gole de álcool, pelo menos antes de entrar no clube para treinar, no ano anterior.

Elton hesitou por um momento, mas foi vencido pela vontade de descontrair um pouco. Pegou uma garrafa de uísque e encheu um copo. Bebeu e a bebida desceu gostosa por sua garganta. Ele sentiu o sangue esquentar. Bebeu outro gole e sorriu, olhando para o copo.

- Um pecadinho de vez em quando não faz mal a ninguém... falou baixinho.

Encheu outro copo e ia tomá-lo, quando o copo lhe foi tirado da mão por Bernie, que disse:

- Eu te quero sóbrio.

Ele ficou olhando para o letrista e depois para o copo em sua mão.

- Eu só queria... relaxar.

- Se a minha casa te deixa tenso, não é a minha bebida que vai te deixar relaxado. Se for eu que te deixo tenso... ela só vai esconder metade do que você quer esconder. A gente conversa, primeiro, e depois eu prometo deixar você beber até minha adega de vinhos, lá embaixo, se isso resolver. E olha que eu morro de ciúmes dela.

Elton sorriu e concordou. Bernie tomou o que havia no copo e fez uma careta.

- Você não gosta mais?

- Adoro... ele disse, fechando os olhos. - Mas se eu me convencer disso, sempre que tomo um gole, não é você quem vai me impedir de continuar, é?

Elton riu.

- Você não existe! Como você consegue isso?

- Disciplina... e uma mulher bonita sempre no meu pé.

- Só?

- Só!? Eu não comecei isso ontem, meu caro. Pra ficar com ela, eu tive que prometer não tocar mais em nenhuma bebida ou não tocaria mais... nela!

- E como você consegue fazer isso tendo a bebida aqui tão perto?

- Aí é que entra a disciplina: ou é uma ou é outra. Não é fácil, mas eu consigo. Sou bem teimoso, você sabe, mas sou viciado nas duas, devo confessar, e fico bêbado com as duas; mas uma não me dá com prazer aquilo que a outra faz com prazer, disse ele, piscando para Elton, colocando o copo sobre o bar e indo para perto do piano com uma pasta que havia ido buscar em seu quarto.

NOS CALCANHARES DO VENTO - PARTE 2

CONTINUA...

SEJAMOS SEMPRE REFLEXO DA GRAÇA DIVINA. OBRIGADA!

BOM DIA E QUE DEUS ABENÇOE A TODOS

Velucy
Enviado por Velucy em 04/10/2019
Código do texto: T6760791
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2019. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.