CRASTRO - O QUE NÃO FOI POSSÍVEL ESQUECER

Capítulo I

Minha primeira vez fora de casa

Lembro como se fosse hoje. Nascido na roça, cresci e nunca havia saído de Alagoas, mas aos dezesseis ano, algo inusitado estava por acontecer.

Era dezembro dos anos dois mil, a tarde estava agradável, o céu limpo, e os gansos cantavam no lago perto de casa. Estávamos felizes, pois uma tia que morava na cidade de Estância, Sergipe nos visitava naquele dia, repentinamente recebi o convite para ir passar o restante das férias na casa dela, fiquei meio receoso em aceitar, mas fui encorajado por minha mãe. Então, aceitei e comecei a sonhar com esse dia, foram três dias sem conseguir dormir de tão ansioso que estava.

Quando o grande dia chegou, as quatro horas da gelada madrugada daquela quinta-feira, eu já estava de malas prontas, com o coração batendo a mil e indeciso. Sentindo diversos pensamentos passarem por minha cabeça: viajar ou não viajar? Mas eu tinha que ir, afinal eu merecia aqueles dias de folga do trabalho na roça que com certeza estaria me esperando assim que eu voltasse. Nessa época, existia uma rede de ônibus chamada Real Alagoas, e as cinco da manhã, estava eu subindo naquele ônibus com destino a uma terra desconhecida: Bairro Cidade Nova, Estância, Sergipe.

Chegamos em Penedo as seis e meia da manhã. Agora era a hora de atravessar o rio São Francisco. Fiquei em pânico, pois tinha que entrar naquela lancha e essa ideia não me agradava muito. Então, um taxista gritou: “Aracaju Sergipe, saindo em dez minutos”. Como era bom ouvir aquilo. Minha tia então completou a as quatro últimas vagas que faltavam para segui viagem, eu, ela e os dois filhos dela, Luan e Neidinha.

O sol ardia forte naquela manhã, e o insuportável calor ardia juntamente com minha emoção em ver as lindas paisagens ao longo da viagem. As dez horas e quarenta minutos, chegamos na rodoviária de Aracajú. Meu Deus! Nunca tinha visto algo tão gigantesco, com tanta gente puxando malas ou levando bolsas apressadamente. E isso porque eu não cheguei a entrar nela, olhando apenas de fora, estava boquiaberto. Quase me esqueço de dizer, que quando desci do carro, não senti minhas pernas, nunca tinha ficado tanto tempo sentado sem me mover. Me sentia feliz por pisar em terra firme.

Seguimos viagem para Estância em outro taxi. Sim, essa minha tia tem dinheiro, mas isso não vem ao caso! O percurso até a casa dela foi mais rápido, e era fascinante ver aquelas ruinas e algumas cachoeiras a beira do caminho. Na época eu não conhecia o filme do Sherek, senão teria feito a pergunta “a gente já chegou” dezenas de vezes! Meus olhos brilharam ao ler: Bem-Vindo a Estância. Mas, ainda faltavam alguns quilômetros ate o destino da viagem. Chegamos à Rua Minas Gerais, número sessenta e sete ao meio dia e meia. Desci do carro. Não sabia dizer o que sentia naquele momento. Era um misto de felicidade e ao mesmo tempo, vontade de voltar para casa. Sim, eu já queria voltar!

Era quinta-feira, dia dois de janeiro e vê as caras dos vizinhos me olhando quando cheguei, não tinha preço. A rua era simples, tinha cerca de umas cinquenta casas de cada lado e acabava a vista em um terreno baldio. As casas eram todas cheias de grade, e me vinha em mente a mensagem: Bem-vindo a prisão! Após um rápido almoço, me deitei um pouco e tentei dormir, mas sabe quando parece que você está em outro mundo? Era assim que eu me sentia. A noite foi a pior parte, porque, eita lugarzinho gelado do cão!

Capítulo II

Vamos ao Crasto

Passei aquela manhã de sexta-feira trancado dentro de casa, pois não tinha para onde ir. Pense nas férias! Senti saudade da roça! Então, minha tia disse que como eu estava lá, iríamos para o Crasto, assim eu iria aproveitar um pouco. Saímos por volta das três e meia da tarde.

A viagem foi um pouco longa, mas valeu. Imaginem uma cena de filme de terror, tipo Floresta do Mal ou Pânico na Floresta. Passamos pelo meio de uma bem parecida, uns quinze quilômetros em meio a enormes e sombrias árvores. Enfim chegamos! O povoado era pequeno e simples, uma colônia de pescadores, mas a vista da maré que ficava a menos de cinquenta metros da casa onde ficamos, me encheu o coração de alegria.

Chegamos no Crasto por volta das cinco da tarde. E como o sol de lá se põe do lado oposto a maré, já estava escurecendo, mas dava para ver o quanto o lugar era bonito. A brisa que vinha da maré era de gelar a espinha, e sobre as águas pairavam uma suave neblina que deixava o lugar com um ar de mistério bem curioso. Era minha segunda noite tão longe de casa, e mesmo gostando do lugar, estava me sentindo uma criança perdida. Exatamente isso, uma criança prestes a completar seus dezoito anos. Estava animado e ansiava para que o dia seguinte chegasse. Eu precisava explorar aquele lugar. Precisava aproveitar ao máximo!

Acordei bem cedo com o barulho da tia Neide batendo nas panelas da cozinha. A porta do quarto onde dormi, dava de frente para as águas da maré. Fui até ela e fiquei pasmo com a beleza que aquela manhã me proporcionava. Um lugar paradisíaco que me chamava para sair a caminhar sem destino, mas eu não tive coragem.

Junto à casa, havia um muro gigantesco que separava o lado sul da vila, do lado norte, um muro onde ninguém ousava ultrapassar sem permissão. Justamente do outro lado do muro ficava a casa grande. Uma casa onde guardava muitas histórias tenebrosas, assustadoras e dolorosas do passado. E, para minha sorte, meus tios eram amigos do caseiro, vi então minha grande oportunidade de entrar ali e ver de perto se toda aquela era real.

Tia Neide disse que precisava de ajuda com o almoço. Estávamos em seis pessoas, ela, os três filhos Luana, Lucineide e Luan, e Tarcísio, um filho de uma vizinha dela. Me prontifiquei em ajudar a fazer o almoço com a condição dela conseguir com que eu entrasse na parte do casarão. Ela disse que isso seria fácil. Corri para ajudar e contava os segundos para poder entrar naquelas águas que eram bem límpidas, ao contrário da que se via do lado de fora do muro.

Como eu já disse anteriormente, o Crasto é uma pequena vila de pescadores que pertence a cidade de Santa Luzia de Itanhy, lugar que encantava por sua resplandecente beleza. Ouvia-se a cada minuto barulhos de carros e ônibus cheios de pessoas chegando. Eram turistas que vinham de várias partes do Brasil e do mundo para visitar o local. Naquela época turista tomavam barcos catamarãs e atravessavam a maré em direção à praia de Santa Cruz dos Abaís, lugar famoso por ter sido cenário de cenas da novela Tieta do Agreste que fez muito sucesso na Rede Globo no final dos anos oitenta e início dos noventa. Eu não fui ao Abaís, até porque o Crasto já era suficiente, para quem só tinha ido à praia uma única vez aos nove anos, mas essa é uma outra história.

Capítulo III

A casarão do lado norte

Depois que almoçamos, pulamos a janela e corremos em direção a prainha que ficava em frente a casa grande, que era simples, mas muito bonita. Era uma construção do período colonial, um verdadeiro casarão da época da escravatura. Era branca, com uma varanda de colunas azuis que combinavam com as portas da mesma cor, onde era possível ver várias cadeiras preguiçosas que davam de frente para a praia. Ao lado esquerdo da casa via-se um galpão fechado, que não dava para ver muito bem o que era.

Tinha um gramado de uns trinta metros entre a maré e a entrada principal do casarão. Minha tia disse-me depois que dentro do casarão tinha muitos artefatos antigos que pertenceram aos bisavós do atual dono do lugar, que em dois mil e um já tinha mais de setenta e seis anos. Eram sinos dourados que serviam para chamar aos escravos da casa, além de moveis coloniais, chicotes, correntes, tapeçaria, prataria, pratos e panelas de ferro e barro, além de fogões da época.

Tomamos banho na maré e depois nos deitamos na areia gelada da praia. Virei minha cabeça de lado e percebi que havia outro galpão bem maior que o outro lado, ligado ao muro da casa e que tinha o seu final, há uns cinco metros dentro da maré. O portão da entrada era de madeira e estava fechado, mas uma coisa era certa, eu precisava entrar naquele lugar e ver como era lá dentro. Já estava quase escurecendo, quando ouvimos minha tia chamando para entrarmos. Atendemos ao seu chamado. Mas a aventura estava apenas começando.

Capítulo IV

As histórias sem fim

No dia seguinte, acordei com minha tia chamando para irmos pegar siris na maré baixa daquele domingo. Pulamos a janela por onde tínhamos acesso ao lado norte da vila e corremos naquela grama fria em direção a praia. Meu tio estava na cidade, ele nos trouxe na sexta e voltou para casa, onde retornaria apenas na outra sexta para nos pegar, então ainda tinha muito o que aproveitar naquele lugar.

Estávamos correndo na areia, mais atrapalhando que ajudando tia Neide a pegar os siris. A diversão foi interrompida depois de um grito agudo que minha tia deu. Ela pisou em um siri que a mordeu sem piedade. Sangrou bastante. Em meio a tanta distração, eu não havia percebido que o portão do galpão que já mencionei estava aberto. Na porta tinha um jovem senhor, batendo com uma marreta, num trator. Pedi permissão a tia para ir ver o lugar de perto, e corri até lá. Dei bom dia ao homem e perguntei se podia entrar. Ele disse que sim, mas que não mexesse em nada, pois podia ser perigoso. Existe um ditado que diz que “tudo que é perigoso é mais gostoso” e eu queria saber qual era o sabor daquele lugar que chamava tanto minha atenção.

Perguntei ao caseiro por que seria perigoso, ele olhou fixamente para mim e para meus primos que me seguiram como se estivesse procurando as palavras que deveria falar. Antes dele me responder alguma coisa, olhei para o lado direito da entrada e vi pregada a parede uma cruz que tinha cerca de uns dois metros de altura, e não nego que naquele momento, me correu um frio estarrecedor que me gelou a espinha. Senti minhas pernas tremerem e um enorme calafrio eriçou meus cabelos. Dentro do galpão era escuro e não dava para ver muito bem o que tinha na parte que avançava na maré.

Na parte visível tinha alguns carros antigos - os quais não consegui saber a qual marca pertencia -, uns tratores estranhos e pequenas locomotivas velhas e enferrujadas corroídas pela força do sal da maré. Dava medo, mas aquele lugar era incrível. O galpão era muito gelado e sombrio, e lá no fundo do galpão era possível ver uma névoa branca se movendo. O chão era de cimento grosso de um marrom escuro já corroído pela maresia.

O caseiro disse-me que aquelas coisas eram do período colonial, utilizadas na colheita de café e cana-de-açúcar, além de outras coisas as quais ele não sabia explicar para que serviam, nem de qual período eram. Ele me disse também que dentro daquele lugar, já haviam acontecido muitas mortes misteriosas que ficaram sem explicações, por isso a presença da cruz no lugar e que apenas ele tinha permissão para entrar ali, pois era o caseiro da fazenda, outros para entrar, só com autorização do seu Jorge, dono da vila.

Os minutos ali ouvindo aquele homem foram os melhores até aquele momento, então perguntei a ele quem havia dentro do galpão. Ele falou que haviam morrido dois dos últimos caseiros da fazenda, estes morreram esmagados pelos carros velhos que haviam caídos de forma misteriosa sobre eles, mas a morte mais misteriosa foi a do último pároco da vila, que morreu dentro do galpão decapitado enquanto rezava pelas almas penadas que ali segundo moradores eram ouvidas pedindo socorro.

O próprio caseiro falou pra mim que sempre escuta gritos e batidas nos ferros velhos, e muitas das vezes ele foi olhar, mas não havia a presença de alma vivente dentro do mesmo. Perguntei se ele não sentia medo, mas este me falou que no início sim, mas que já tinha se acostumado e que para ele se tornou normal tudo aquilo, que para ele passou a ser apenas histórias. Eu ouvia essas coisas, e sentia arrepios estranhos, e quando eu olhava pros meninos, percebia eles esfregando os braços, podia ser devido o gelo do galpão estava nos fazendo tremer, mas juro que não era de frio, era mais diferente que eu não consigo explicar com palavras.

Foi ali que fiquei sabendo que foi depois da morte do pároco, que a Igreja de Santa Luzia de Itanhy, ou Igreja do Crasto como era chamada, construída por escravos na época colonial foi abandonada, pois haviam murmúrios que o espírito do padre assombrava as pessoas que rezavam ali, deixando-as aterrorizadas e assustadas com o que viam e ouviam.

Dava para ver de longe que a as ruínas da igreja mostravam uma arquitetura bem desenhada e bonita, com certeza ela tinha sido um belo templo expressivo e cheios de beleza enquanto estava em funcionamento, e agora estava se desmanchando com a ação do passar do tempo, pois ninguém se atrevia a recuperá-la por medo de morrer no local. Minha imaginação foi interrompida com os gritos de minha tia, chamando para entrar. Voltei para casa e não vi mais aquele homem durante o restante do período que estive lá.

Capítulo V

Igreja do Crasto

Depois do almoço daquele domingo, chamei meu primo Luan e o Tarcísio para irmos até as ruínas da igreja. De prontidão aceitaram e começamos a subir a ladeira em direção a ela. À medida que subíamos, íamos lembrando do que o caseiro havia dito sobre a morte do padre, e vi que meus amigos estavam querendo voltar, mas eu conseguia animá-los a continuar. Não íamos entrar, apenas olhar de perto, eu sempre gostei de coisas misteriosas e continuamos subindo até chegarmos à escadaria central, onde tinha um pequeno altar e uma área calçado de uns quinze metros antes da porta de entrada do templo.

A vista lá de cima era suprema, dava para ver todo o povoado, as casas, a maré e detalhes do lado norte que não tínhamos visto ainda. O vento era forte e dava vontade de ficar ali observando aquela imensa paisagem. Ficamos parados olhando para a vila e o vento parecia cada vez passar mais forte. A frente do monumento era bem alta, e o sino ainda estava preso a abertura existente no centro da construção. No pequeno altar de pedra, erguido no meio do calçadão, havia alguma coisa escrita, que não consegui ler nem identificar.

Eu estava despercebido, imaginando mil e uma coisas, mas algo me acordou daquele transe. Virei rapidamente para as ruínas e me assustei com um barulho estarrecedor de portas batendo com barulho de dobradiças rangendo vindo de dentro do lugar. Naquele momento eu me senti em uma cena de um filme de terror, eu tinha a imaginação muito fértil e me sentia perseguidos por almas penadas voando em minha direção, mas era pura imaginação de minha cabeça.

Quando procurei meus companheiros percebi que estes já estavam chegando na pracinha. Ao ouvirem o barulho, correram e me deixaram sozinho no local e fiquei sem ação. Desci o mais rápido que pude, mas o medo me deixou sem forças, caso eu tivesse corrido, teria caído e decido a ladeira rolando, na época eu era magro, mas com certeza isso teria acontecido. Enquanto eu descia, percebi que um senhor que estava sentado embaixo da única árvore da praça, havia assistido tudo e estava rindo de mim.

Depois de brigar com Luan e Tarcísio por me deixarem sozinho e ouvir sobre o medo que sentiram, recobrei minhas forças e fui até o velho que ainda estava sentado ao pé da arvore e perguntei porque deixaram aquela igreja cair em ruínas. A resposta foi que, quanto menos eu soubesse dos mistérios do local, seria melhor para mim. Disse também que eu parasse de fazer perguntas e apenas curtisse minhas férias, pois era coisa que pertencia apenas aos moradores do local. Insisti fazendo ainda mais outras perguntas. O velho senhor me olhou firmemente, levantou-se e foi embora.

Capítulo VI

Era melhor não ter visto o que vi

A noite chegou rapidamente, e a lua subia das águas da maré enorme, brilhante e cheia de encantos. Então resolvi passear por uma das ruas as quais eu ainda não tinha passado. Andei alguns metros por aqueles becos frios e estranhos que cheiravam a peixe seco, eu pensava nas histórias que havia ouvido logo cedo, e Luan e Tarcísio como sempre me seguiam silenciosos assim como eu também estava. Voltei pelo mesmo percurso, pois não havia saída nem entrada para outros becos.

Quando estávamos chegando perto da casa onde estávamos hospedados – eram dez casas iguais, brancas, de portas longas azuis, dois quartos, sala e cozinha -, os meninos entraram e eu sentei em uma jangada próximo a praia e fiquei olhando pro nada ouvindo o som das águas.

Minha reflexão foi interrompida, quando repentinamente ouvi um certo barulho vindo de perto do galpão onde havia a cruz. Fiquei assustado e pensei em não ir olhar, mas a curiosidade foi maior, levantei-me e fui a passos curtos em direção ao local do barulho. Quanto mais eu me aproximava de uma jangada perto do galpão, meu coração batia forte e minha respiração ficava ofegante. Quando cheguei não pude acreditar no que vi, fiquei de boca aberta e sem ação. Meu medo passou de sobressalto e sai correndo para contar o que havia visto pra minha tia.

Antes eu não tivesse dito palavra alguma. Certamente teria sido melhor para todos nós, principalmente para mim, pois ainda era domingo à noite, só íamos voltar pra Cidade Nova na sexta-feira, e com certeza as coisas mudariam a partir do memento em que eu abrisse minha boca.

Como temos o péssimo hábito de fazer sempre o errado, eu disse o que tinha visto. Quando terminei de contar, minha tia saiu fora de casa aos gritos por Luana. Luana é a filha mais velha, esta entrou toda nervosa, com os olhos arregalados e olhou pra mim com um olhar que nunca irei esquecer.

Tia Neide pegou o celular, ligou pra meu tio e contou tudo o que eu disse pra ela. Quando ela desligou o telefone disse que ele estava vindo nos pegar no dia seguinte logo cedo. Luana olhou mais uma vez para mim com olhar de ódio e desprezo tão intenso que meu coração doeu. Naquele momento eu tive a certeza que não devia ter dito nada a ninguém. Eu simplesmente disse que a vi aos beijos com um desconhecido, e que por isso estávamos voltando pra casa antes do programado. Senti-me culpado, pois havia cabuetado minha prima, mas não havia sido a primeira vez que eu tinha visto ela com ele desde que chegamos.

Não dormi bem naquele dia. Minha cabeça estava doendo, eufórica e cheia de sentimento de culpa e raiva ao mesmo tempo estava todo queimado, por ter passado tanto tempo ao sol. A noite demorou a passar. Não posso me esquecer que Tarcísio me falou que o restante de minhas férias seria um inferno, pois certamente Luana iria aprontar alguma coisa comigo. Ela não iria deixar aquilo barato.

No outro dia, não tive tempo de me despedir do local. Meu tio já tinha chegado e estava apressado para voltarmos logo; ele iria trabalhar na tarde daquele dia. Ao meio dia já estávamos de volta a Cidade Nova, e Tarcísio tinha razão quanto a Luana. Ela me olhava com ódio e isso começou a me incomodar.

Capítulo VII

Já era hora de voltar para casa

Os dias começaram a demorar a passar, e a cada novo momento eu sentia mais vontade de voltar para casa. Tia Neide percebeu o clima e começou a brigar com Luana, o que piorou mais a situação. Elas brigavam demais por minha causa e aquela situação tinha que acabar. Então, do dia dezenove de janeiro eu disse aos tios que queria voltar para casa. Disse que estava morrendo de saudade de meus pais, e no outro dia as oito horas da manhã, eu já estava na rodoviária da cidade de Aracajú comprando as passagens para Neópolis. Era a primeira vez que viajava sozinho em minha vida.

Ao meio dia eu já estava atravessando o Rio São Francisco. Cheguei na casa dos pais da Eva, hoje minha esposa por volta de uma e meia da tarde. E lá fiquei até as três horas, onde peguei novamente o ônibus Real Alagoas, só que dessa vez de volta para minha casa. A cada quilometro que se aproximava de casa, meu coração batia forte. Não tinha whatsapp para avisar que estava voltando e isso me deixava muito mais ansioso em estar de volta. Como eu encontraria as coisas ao chegar em casa...

Como naquela época as estradas do Bolívar à Pindorama eram de barro, e devido as chuvas das trovoadas, eram muitas as poças de lama, o percurso não era feito em apenas quinze minutos como é hoje em dia. Durante os balanços da viagem, - que por sinal a mais longa de minha vida -, eu não parava de pensar em tudo que vivi naqueles dezoito dias. Então, às dezessete horas cheguei à entrada do lote de meus pais. A tarde daquela sexta-feira estava mais linda do que de costume, parecia que ela estava linda para mim.

Andei devagar, e sentia o cheiro esfumaçado do local, me sentia livre, parecia alguém que havia chegado de uma grande tormenta. Olhei para frente percebi ao longe que minha mãe estava à beira da estrada olhando, parecia que estava me esperando, e estava mesmo, ao me ver ela gritou: Eu sabia que você vinha hoje, meu coração me dizia. Me abraçou, e eu mal podia acreditar que estava finalmente em minha casa, a viagem durou apenas dezoito dias, mas me pareceu que foram meses, ou talvez anos.

Já se passaram dezoito anos que tudo isso aconteceu e nunca mais voltei à casa de meus tios, nem ao povoado do Crasto, mas nunca consegui esquecer tudo o que vivi naquele lugar e as imagens continuam vivas dentro de minha memória, como as estivesse vendo nesse instante. Sei que as coisas mudam com o passar do tempo, mas não morrerei antes de voltar a rever novamente aquele fascinante lugar que me fez sonhar acordado dia pós dia, criando inúmeras histórias de aventura em minha mente, histórias estas que eu não ouvi nem vivi.

Enfim, os anos se passaram, os dias de aventuras foram poucos, mas foram impossíveis de esquecer e fico pensando como teria sido se fosse hoje.

Adriano Sebastião
Enviado por Adriano Sebastião em 24/08/2019
Código do texto: T6727797
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