QUEBRANDO BARREIRAS - RESSURREIÇÃO - PARTE 5

I - RESSURREIÇÃO

Alguém está com problemas em algum lugar esta noite...

... O vento levou para longe todas as notícias de ontem...

Elton havia entrado em contado com Gary Osborne, um cantor inglês que também compunha muito bem e sempre fora muito ligado à música, fazendo traduções de várias canções sob encomenda para vários cantores de várias línguas para o inglês. Ambos, ele e Elton, estavam preparando um lote de canções a serem gravadas no início do ano seguinte (78) e, em casa ou nos estúdios da Rocket Records, sua gravadora, criada no começo da década, Elton trabalhava com as letras de Osborne, que não tinham menos força que as de Bernie, sendo apenas um pouco mais românticas, falavam de decepções de amor, solidão e saudade. Seu modo de colaboração era diferente do que Elton tinha com Bernie. Elton desta vez fazia o contrário do que fazia com Bernie: passava canções já feitas por ele para que Gary colocasse a letra. Gary havia captado mais ou menos as emoções de Elton e isso ajudava bastante.

Houve tentativas frustradas de Elton no que se referia a escrita de letras. Ele compôs alguma coisa, mas não gostou do que escreveu. Seu enorme talento para as notas musicais não dava margens às palavras e ele ficava impaciente e frustrado com isso.

Certa tarde, após mais uma tentativa de escrever um conjunto de versos, num dos estúdios da Rocket, ele amassou a folha e a jogou longe, com raiva. Esfregou os olhos, levantou-se e foi ligar o tape com a canção “Shine on Trough” que ele havia gravado no mês de outubro na sessão com Thom Bell. Voltou ao banco e sentou-se, encostando a cabeça sobre os braços cruzados apoiados no piano.

A canção triste não animava nada, mas ele parecia estar curtindo uma tristeza tão grande que mesmo ela não ultrapassava a depressão. Ele andava bebendo muito ainda quando ficava sozinho, mas isso aliado ao consumo de drogas o mantinha alerta e sempre acordado, mas não menos deprimido.

Gary entrou no estúdio. Ao vê-lo de cabeça baixa, tão desolado, ia sair, mas algo lhe pediu para ficar e conversar com Elton. Sentia que era essa a sua missão ao se aproximar do velho amigo. Aproximou-se do piano e arriscou:

- Posso ajudar?

Elton levantou a cabeça rapidamente e olhou para ele.

- Algum problema? - Gary perguntou.

- Não... Elton respondeu com um leve sorriso. - Estava só ouvindo a música...

- Ficou bárbara.

- É, ficou.

- Você está aqui há um tempão. Não cansa?

- Cansa... quando eu não consigo criar nada. Às vezes, dá um branco no cérebro e parece que nunca mais eu vou conseguir fazer mais nada em se tratando de música... disse ele, olhando para o teclado do sintetizador. - É uma sensação tão ruim.

- Bloqueio... disse Gary, apoiando no piano. – Se você parasse um pouco de beber, não ajudaria?

Elton olhou para ele e intimamente concordou, mas não deu o braço a torcer.

- Preciso ficar ligado...

- Eu nunca imaginei isso acontecendo com você.

- Ninguém é perfeito... Elton disse, sorrindo sem jeito, dedilhando algumas notas a esmo.

- Bloqueios acontecem quando a gente não quer aceitar alguma coisa que interfere na criação... e geralmente isso vem de fora, é externo.

- Será?

- Eu... ouvi a música que você colocou em “Ego”, do Bernie...É... uma crítica pra você, não é?

- Não... respondeu Elton, ainda olhando para o teclado, meio incomodado com o rumo que a conversa tinha tomado. – Ela foi uma crítica sim, mas... a vários caras que chegam ao mundo da fama e se acham maiores do que todo mundo. Bowie... Sedaca... Gente que não consegue viver sem ser paparicado pela mídia. É uma letra que ele escreveu em cima da música já feita. Uma das letras mais especiais que ele já fez pra mim.

- Errei então... A letra parece muito com você.

- É assim que você me vê?

- O Bernie vem passando mensagens subliminares pra você há tanto tempo que eu pensei...

- Pra quem não tem disco nenhum meu em casa, você está bem informado.

- Eu tenho o “Good bye yellow brick road’. Não é o seu melhor álbum? Nele a própria música título diz muito.

Gary começou a cantar, com sua voz doce:

- “When are you gonna come down? When are you going to land? I should have stayed on the farm. I should have listened to my old man. You know you can't hold me forever. I didn't sign up with you. I'm not a present for your friends to open. This boy's too young to be singing the blues”. (“Quando você vai descer? Quando você vai aterrissar? Eu devia ter ficado na fazenda. Devia ter ouvido meu velho. Você sabe que não pode me segurar pra sempre. Eu não assinei nenhum contrato com você. Não sou um presente pros seus amigos abrirem. Esse garoto é muito jovem pra estar cantando o blues.”)

Elton sentiu-se incomodado ao ouvir a canção que já havia cantado mais de mil vezes no palco.

- Eu odeio essa música... sussurrou.

- E musicou por quê? Por autopunição ou... porque musicar letras do Bernie é instintivo... fácil? - perguntou Gary, quase correndo dali, pois sabia que tinha ido muito longe com aquele tema que ainda deixava Elton constrangido.

Elton fechou as mãos sobre o teclado, soltou um longo suspiro e olhou para ele, respondendo em um tom de voz baixo, pois não queria ser grosseiro com Gary. Foi uma promessa que tinha feito a ele antes de iniciarem aquela colaboração. Gary queria ajudá-lo, mas não seria rebaixado pelos maus humores de Elton.

- Por respeito a ele e... eu estava muito doido naquele dia. Nem pensei muito no que ela significava. Eu nunca penso no que as letras do Bernie dizem. Só faço as músicas pra elas como se isso fosse a coisa mais natural do mundo pra mim... É automático... instintivo...

- Fácil?

RESSURREIÇÃO – PARTE 5

CONTINUA...

BOM DIA!

Velucy
Enviado por Velucy em 05/07/2019
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