BARRAGEM QUASE ESTOURADA
(Continuação de RAIO DE RETARDO)
Seu Olegário tirou o relógio da algibeira, verificou as horas, e mais pelo costume que por necessidade, girou o pivô para dar corda naquele seu velho companheiro de aventuras nos muitos anos de andanças pelo mundo e disse para si, pela claridade do dia pensei que fosse mais tarde.
- Mas não vá se atrasar se o senhor tem compromissos, seu Olegário, essa conversa com Marculino pode esperar por nova oportunidade. (Disse Tota Medrado na esperança de que o velho fosse embora com seu estoque inesgotável de mentiras)
- Vai dar tempo de o senhor contar a história da barragem, não vai seu Olegário?
- Vai sim meu filho, porque é história curta, coisinha besta que aconteceu logo depois que o compadre Zito Feijó mandou construir aquele paredão para represar o Riacho Dourado que nasce no capão de mata da propriedade dele, aproveitando aquele socavão todo forrado de pedra que tem logo depois da nascente.
Ele me pediu para dar um adjutório porque esse pessoal é ruim de serviço e o compadre precisava fazer uma viagem para o sertão de Alagoas...
- E o que era que ele ia fazer por lá, seu Olegário?
- Isso é lá da sua conta, Marculino? (Tota Medrado, falou visível irritação)
- Ele ia comprar um caminhão do fumo de rolo que ele negociava com os bodegueiros e com os feirantes daqui até o Rio Grande do Norte.
Deixe o menino, Tota. A curiosidade faz parte da idade dele, é perguntando a quem sabe das coisas que se aprende.
- E o senhor é um arrombado de sabido, né não seu Olegário?
- Você respeite seu Olegário, seu cabra. Isso é coisa que se diga? Eu vou sair daqui antes que perca de vez o tiquinho de paciência que ainda tenho contigo.
- Deixe ele comigo, Tota.
A gente se entende e quando eu achar que ele deve tomar um corretivo, ainda sei usar o relho de couro cru que tenho na caminhonete.
Quando você precisar eu posso lhe emprestar...
- Ôxe seu Olegário. Nem faça uma coisa dessas se não seu Tota vai acabar comigo.
- Mas voltando a história da barragem.
O serviço já estava quase no fim quando se danou a chover.
Choveu quarenta dias e quarenta noites que nem no dilúvio da bíblia sagrada.
A gente tinha feito um trabalho muito bom e a parede da barragem estava aguentando, porque o sangradouro passava por cima e era da largura da parede, mas o volume d’água era demais.
Nesse dia em que apareceu a rachadura, tinha chovido granizo.
As bolas de gelo eram maiores do que bolas de bilhar.
Todo mundo sabe que gelo é mais leve do que a água, aí para aliviar o peso daquele tanto de água, eu peguei a patrol e carreguei as pedras de gelo para dentro da barragem que era para elas ocuparem o lugar da água que ia saindo ao mesmo tempo em que as bolas iam entrando.
Quando diminuiu a pressão da água na parede, eu chamei os meninos que estavam abestados apreciando meu trabalho com a patrol e colocamos umas estroncas para segurar as pedras que era para a parede não estourar e entupimos a rachadura com barro de olaria que tem liga boa.
Eu sabia que ia dar certo, porque já tinha feito escora semelhante na igreja lá da Itália, quando deu um terremoto devastador durante a guerra de 39 a 46 quando eu estava engajado na FEB.
Aí, quando a chuva diminuiu a gente reforçou a parede com aquele montão de pedra que ainda está lá para quem quiser ver.
- E o senhor estava lá na Itália quando deu o terremoto foi seu Olegário?
(Continua em TERREMOTO DURANTE A GUERRA)