PSICOGRAFIAS DE CHICO XAVIER SOBRE A GUERRA DO PARAGUAI (OBRA FICCIONAL)

MADAME LYNCH, FRANCISCO SOLANO LÓPEZ, DUQUE DE CAXIAS, DOM PEDRO II E BARTOLOMEU MITRE PSICOGRAFADOS POR CHICO XAVIER

CAPÍTULO 1: O CENTRO ESPÍRITA DE UBERABA.

A cidade é Uberaba, no interior do Estado brasileiro de Minas Gerais, perto da fronteira com São Paulo – um dos pontos de aglutinação das tropas que fizeram a campanha do Mato Grosso durante a Guerra do Paraguai (1864-1870). O ano é 1970: o Brasil vive um período de chumbo de uma ditadura militar: coincidentemente ano do centenário do fim da Guerra do Paraguai, cento dezenove anos do fim da monarquia de Dom Pedro II e cento e dezoito anos do fim da escravidão.

Os livros didáticos do Ministério da Educação do Brasil, de todas as séries do ensino básico, seguindo a orientação Presidente e General Emílio Médice, colocaram o Hino Nacional Brasileiro na capa e anunciaram os heróis da Guerra do Paraguai na propaganda oficial, a exemplo do Almirante Barroso e a Batalha de Riachuelo e Duque de Caxias e a Batalha das Dezembradas. O Paraguai, que também vivia uma ditadura neste momento, comandada por militares via Partido Colorado (fundado pelo já falecido General Bernardino Caballero – personificado agora por Alfredo Strossener), mandou erguer um túmulo para receber os restos mortais de Francisco Solano López e Madame Lynch em Assunção, como forma de ideologia ufanista, a exemplo do Brasil – tratando-os como heróis, após anos de escárnio.

Porém, fato novo cabe lembrar: os dois países beligerantes na segunda metade do século XIX, governados por ditadores militares na segunda metade do século XX, estão a celebrarem acordos. Um deles seria a construção da maior usina de geração de energia elétrica do Mundo: a Itaipu, no rio Paraná, entre as cidades de Foz do Iguaçu, no lado brasileiro, no Estado do Paraná, e Cidade Del Leste, no lado paraguaio; não mais querem uma guerra, pois depois que os aviões e os automóveis surgiram, as hidrovias perderam protagonismo; acordos de comércio por meio de rodovias e ferrovias valiam agora mais, havendo o Paraguai se tornado um dos maiores paraísos fiscais da América do Sul, abrindo-se para milhares de plantadores de soja do Brasil que lá buscavam menos impostos. Argentina agora quem não estava muito feliz em saber que a usina continha uma quantidade tamanha de água que caso abrissem as comportas era capaz de fazer Noé escolher Buenos Aires como palco do Dilúvio - com bem já arquitetara o General Golbery do Couto e Silva em Geopolítica do Brasil.

O mês em que o médium Xavier psicografa é agosto e a temperatura está amena, chovendo muito, mas sem frio contundente no Triângulo Mineiro. O médium Xavier está na sua mesa, com a cabeça baixa, freneticamente anotando uma carta, com seu caderno e caneta BIC; um espírito atormentado de uma linda mulher loira lhe dita; há um homem fardado, barbudo, ao lado dela, cercado por sombras que se movem por sua face que lembram demônios, puxando-a pelas pernas. Os dois estão no Umbral, uma espécie de mundo de expiações de pecados de espíritos imundos.

A mediunidade é um fenômeno que todo ser humano tem em maior ou menor grau. Xavier é uma espécie de gênio, pois nasceu com alto poder desta faculdade. Consegue ver a energia dos espíritos, ou seja, a fração de luz que nós não vemos, pois nós não conseguimos nem ver as frações de luz violeta que estão ao nosso redor, nem mesmo as ondas de rádio que emanam dos nossos aparelhos de TV. Xavier vê e ouve frações de luz e sons, pois o espiritismo é um “método científico” desenvolvido por Alan Kardec em 5 grandes livros na segunda metade do século XIX, dos quais o Livros dos Espíritos foi um dos mais importantes. O chamado kardecismo fora muito influenciado pelo darwinismo, pelo platonismo, pelo cristianismo e pelo positivismo.

Sabe-se que o médium Xavier já psicografou Platão e grandes personalidades da Humanidade, num fenômeno que a Psicanálise de Carl Gustav Jung buscou raízes no que chamou de inconsciente coletivo: nós somos portadores de uma memória involuntária e genética desde o tempo que fomos organismos unicelulares, segundo o eminente psicanalista suíço. Muitos já o chamaram, o nosso médium Xavier, de charlatão, porém, muitos possuem admiração pelos seus conhecimentos, que já foram demostrados em centenas de livros e entrevistas aos meios de comunicação do Brasil e do Mundo, até aquele momento.

As guerras são eventos, segundo a visão espírita, que servem para acelerar a evolução. Há uma lei do progresso espiritual da Humanidade. Todas as guerras terminam numa cooperação entre os povos. Criam lições. Criam tratados e ensinam sobre a ética e que não há nenhuma forma de diferença entre todos os seres humanos. Infelizmente, as guerras são o termo final da falta de capacidade de diálogo e de uso das faculdades racionais.

Todavia, no ano de 1970, não havia como mais ocorrer uma terceira guerra mundial entre potências como os Estados Unidos e a União Soviética, juntamente com seus aliados, pois todas detinham armamentos nucleares. Quis a lei espiritual que houvesse um impasse tamanho que nenhum dos gigantes fosse capaz de dar o primeiro passo em direção ao conflito, pois o vencedor ia tombar em cima do corpo do vencido, inevitavelmente; ou pior: seria obrigado, como o Isaias afirma do Antigo Testamento, a viver como ratos em buracos dentro da terra, a fazer a metáfora de uma geração que estaria por vir na face da terra, talvez a que viveria o holocausto nuclear.

Então o que falar das Guerras do século XIX?

CAPÍTULO 2: ELISA FALA PARA XAVIER.

Xavier faz a prece do Pai Nosso, coloca a caneta no caderno e se põe a serviço de Lynch:

“Olá, caro médium, antes de tudo, peço perdão por ter sido uma mulher tão amante do poder e da riqueza como fui durante a vida, a exemplo de Salomé e de Dalila, exemplos de frivolidade e luxúria, que Javé condenou no Antigo Testamento. As mulheres são criaturas de Deus e têm por missão especial serem as reprodutoras dos filhos amados do Pai, exemplos de doçura e de servidão à família. Perdi meu filho Panchito amado por um tiro de um soldado brasileiro, mas o reencontrei brevemente no mundo espiritual. Porém, ele está reencarnado ai no Brasil, como um grande ídolo de vocês, da seleção de futebol..

López sempre me puxa pelos pés, pois estamos aqui no Umbral, um local onde expiamos nossas falhas espirituais terrenas. As dívidas de López são enormes, pois assim com Heródes mandou matar crianças para que Jesus menino não vingasse como Messias e cumprisse a Profecia, López usou covardemente rebentos de mulheres paraguaias pobres para serem buchas de canhão em Campo Grande. Irem de parede para que ele não morresse. Caxias e Conde D’Eu estão aqui com ele gemendo também, pois os militares sempre passam pelo Umbral, por mais nobres que sejam os fins de uma guerra...

Ele não consegue falar, pois os espíritos imundos ficam ao redor de sua face, o obscurecendo...

Fui, desde jovem, uma mulher rebelde. Meu pai sempre teve medo de que eu não conseguisse marido, pois um esposo era tudo para uma mulher da classe alta do século XIX. Era muito atrevida aos 14 anos. Lia e já tocava piano. Meu pai não sabe, mas perdi minha virgindade aos 13 anos com um primo. Meu primeiro casamento foi arranjado às pressas com um médico militar amigo dele. Casei aos 16 anos por ordem do meu pai e meu esposo percebeu que eu não era mais virgem e mesmo assim não me entregou ao meu pai, mas me tratou com profundo desprezo. Eu o traio com outro militar.

Fuji dele e encontrei, em Paris, a dona de um bordel, por volta de 1862, que me apresentou somente homens ricos da sociedade. Foi onde, por obra do acaso e do carma que conheci o Francisco Solano López. Não gostei dele não. O achei rude. Grosso. Mas sabia da fortuna. Mas não sabia nem como era o país que ele era o dono, pois nasci na Irlanda.

Chegando a Assunção eu fui humilhada pelos nativos que tinham inveja da minha cultura e beleza. As irmãs de López e as beatas me odiavam. Mas eu dei um jeito de espezinhar todos. Durante a guerra, mandei ou matar ou saquear essas pessoas, o que aumentou ainda mais a minha dívida no mundo espiritual, me fazendo demorar a encarnar.

Em Paris conheci o Pierre. Aquele tesouro transformou-se num carma. Numa maldição da prata.

López está prestes a se reencarnar. Sua encarnação será numa criança que sobreviverá a um parto sem oxigênio e ele viverá anos sobre aparelhos de ventilação artificial, pois assim é a lei do carma...”

CAPÍTULO 3: LÓPEZ FALA PARA XAVIER.

Xavier faz a prece do Pai Nosso, coloca a caneta no caderno e se põe a serviço de López:

“ (...) Eu queria dizer o tamanho desprezo que eu tenho por vocês: povo brasileiro. O médium é brasileiro e por isso vou dizer aqui tudo o que penso de vocês: raça de víboras, de fariseus das Américas.

Não tenho um pingo de misericórdia de tudo que fiz. De cada vila de vocês que queimei. Vocês roubaram o meu país. Vocês tiraram o sonho do meu povo.

Passei a minha infância toda vendo meu pai abaixando a cabeça para vocês e vendo a Argentina buscando acordo conosco para colocar limites contra vocês, que se achavam os donos do Uruguai. Mas meu pai sempre achava que diplomacia resolvia tudo. As favas! Guerra! Um viva para Napoleão Bonaparte e Simon Bolívar!

Sou muito arrependido de não ter vivido antes para ter ouvido o Manuel Rosas, presidente de Buenos Aires, que queria reavivar o Vice Reino do Prata, lá no começo de 1850, na Guerra do Prata: praticamente a vó da Guerra da Triplica Aliança, na qual meu irmãos de língua espanhola se uniram covardemente com vocês. Ai sim vocês veriam o que era mexer com os povos americanos, de língua espanhola e sangue guarani nas veias. Sangue livre de índio livre e não de negro cativo como vocês.

O maior erro que eu cometi? Eu deveria ter concentrado todas as minhas forças no Mato Grosso. Deveria ter ocupado Cuiabá. Ter avançado todo Sertão, pois a Retirada da Laguna mostrou a total falta de competência militar de vocês em cuidarem dos Pantanais e dos Cerrados daí. Hoje seria dono de todo Goiás e quem sabe de Minas Gerais, pois vocês só ganharam a guerra, por causa da marinha que os ingleses deram para vocês, cujo Rio de Janeiro e Montevidéu davam bons portos, ao contrário de mim, que ficava refém só do porto de Assunção.

Meu pai confiou de mais em vocês e deu no que deu. O Uruguai vocês pensavam ser um quintal do Rio Grande. No final da Guerra, vocês ainda ficam com nosso rio Apa. Mas eu nunca vou perdoar. Cada acidente de avião que acontece no Brasil, cada tragédia de desabamento, saiba que eu sou um dos espíritos que estou por trás. Eu e uma falange enorme de escravos que morreram em navios negreiros sendo transportados para cortarem cana ai, nessa terra, odiamos este país.

Morri sem usufruir do meu tesouro. O enterrei entre o caminho que vai de Assunção até o Cerro Corá, na atual cidade de Pedro Juan Caballero. São 30 enterros com cerca de 10 metros de profundidade. São baús. Há uma caderneta que deixei com Lynch. Mas eu e uma falange maldita de espíritos cuidamos de cada enterro. Atormentamos as pessoas que se aproximam do local durante o sono. Quem dorme sonha. No sonho aparece a luz...”

CAPÍTULO 4: BARTOLOMEU MITRE FALA PARA XAVIER.

Xavier faz a prece do Pai Nosso, coloca a caneta no caderno e se põe a serviço de Mitre:

“Olá caro brasileiro...

Fui o General que comandou as tropas dos 3 países em Tuiuti, no extremo sul do Paraguai, antes de Duque de Caxias assumir, em 1868, após o desastre da Batalha de Curupaití, onde os paraguaios nos destroçaram, entrando de surpresa por todos os flancos e nos esfaqueando nas nossas trincheiras dormindo. Peço desculpas por nós argentinos abandonarmos vocês antes da invasão de Assunção, mas nós já havíamos recuperado Corrientes, cidade vizinha ao Paraguai.

Nós estávamos num momento difícil em Buenos Aires, pois não estávamos conseguindo manter a unidade do nosso território, pois cada província tinha uma identidade regional, basicamente da briga entre uma elite de origem espanhola e uma população de bugres gaúchos. Confesso a você que López manteve um encontro comigo e pediu para eu guerrear contra vocês, mas a Inglaterra não deixou.

Aqui no mundo espiritual eu noto que as nações também reverberam muito os carmas. O Brasil é uma nação que precisa acertar contas com seu passado espiritual...”

CAPÍTULO 5: CAXIAS FALA PARA XAVIER.

Xavier faz a prece do Pai Nosso, coloca a caneta no caderno e se põe a serviço de Caxias:

“Boa noite, caro médium...Sou Luís Alves Lima e Silva, conhecido por Duque de Caxias: o único a receber este título por Dom Pedro II. Meus serviços foram muitos ao Brasil, por praticamente toda segunda metade do século XIX. Fui professor de Dom Pedro II, o ensinado a empunhar uma espada. Na verdade fui o grande pai deste país, pois ajudei a manter a integridade das terras desde o Norte até o Sul, enfrentando também a arrogância de alguns portugueses que aqui ficaram e que queriam nos colonizar novamente.

Nos campos paraguaios servi 3 anos praticamente, na parte que toca a entrada em Assunção, comandando milhares de soldados, o que é muito complicado. Muito traumático foi presenciar tanta desgraça. Eu estou no umbral por conta das atrocidades que fui obrigado a praticar, pois torturei e matei: além de muita omissão eu ter praticado ao ver barbaridades. Os fins eram nobres, os da guerra, mas muitas pessoas sofreram em minhas mãos e de meus comandados.

Peço oração por parte do senhor e do povo brasileiro para que minha alma encontre conforto. Estou muito triste pelos rumos que o país tem tomado ultimamente; a monarquia foi injustamente acusada de fazer mal ao Brasil”.

LUCIANO DI MEDHEYROS
Enviado por LUCIANO DI MEDHEYROS em 22/03/2019
Reeditado em 13/09/2019
Código do texto: T6604787
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