Os olhos de Narciso (Segundo Capítulo)

Hospital do Mandaqui, zona norte de São Paulo, 12:30.

Carlos tenta encontrar uma vaga para estacionar o seu carro, mas o estacionamento do hospital está cheio. Alice parece estar aflita e não pára de sacudir os seus pés. Carlos está suando de nervoso.

Carlos: Mãe pare de sacudir os pés, só faz me deixar mais nervoso do que eu estou!

Alice: Aí meu filho, me desculpe. Estou muito aflita querendo saber do Pedro.

Carlos: É melhor a senhora descer e ir até a recepção do pronto socorro, para saber se a ambulância já chegou.

Alice: Boa ideia meu filho, vou indo na frente. Você vai ficar bem?!

Carlos dá uma risadinha de nervoso e balança a cabeça positivamente. Alice sai do carro e sai apressada em direção ao pronto socorro do hospital. Como o hospital é público, o seu pronto socorro fica lotado de casos urgentes, aparece todo tipo de ferido e de doentes, Alice encontra a recepção lotada.

Alice: Bom dia minha senhora, eu sou tia do rapaz que tentou suicídio agora cedo.

Recepcionista: Ah foi aquele que se jogou da estação Carandiru?

Alice: Foi ele mesmo! Por acaso você tem notícias? Estou que não me aguento de preocupação!

Recepcionista: Eu não posso dar nenhuma informação, é contra as normas do hospital.

Alice passa a mão na testa e fica ainda mais nervosa.

Alice: Por favor minha senhora, preciso ter alguma notícia do meu sobrinho!

Recepcionista: Eu só posso informar parentes próximos, como pai, mãe ou irmãos. A senhora se encaixa nesse quesitos?

Alice: Eu acabei de te falar, sou tia do Pedro.

Recepcionista: Tia é parente distante, então não se encaixa no perfil.

Alice se afasta do balcão de informações para não acabar batendo na recepcionista. Caminha até a porta e encontra Carlos, a mulher abraça o seu filho.

Carlos: A senhora conseguiu saber alguma coisa?!

Alice: A recepcionista não quis me contar, diz que é contra as normas do hospital, vê se pode?!

Carlos: Calma mãe, vamos ficar aí pelos corredores, vamos aproveitar alguma brecha e saber o que está havendo com o Pedro.

Mas para isso a senhora precisa se acalmar.

Carlos vai buscar um chá para Alice, e a mulher senta no banco de madeira. Com as mãos juntas, parece tentar uma reza, mas o nervoso a atrapalha.

Na sala de cirurgia, a maca entra acompanhada por enfermeiros e os médicos cirurgiões lavam as mãos na grande pia. Pedro está bastante ferido e parece que só um milagre vai ser capaz de livrar o rapaz de algo pior.

O médico cirurgião Luiz Mascarenhas entra na sala de cirurgia e vai até os enfermeiros para se informar melhor sobre o quadro clínico do paciente.

Luiz Mascarenhas: Fizemos uma ressonância magnética no paciente, mapeamos todo o cérebro e não encontramos hemorragia e nem coágulos. Esse rapaz teve muita sorte, porque a altura que ele caiu poderia causar uma grande lesão.

Agora eu queria saber mais sobre o que vamos trabalhar.

Enfermeira: Existem ferimentos superficiais na região do tórax do paciente e verificamos por raio- x, que a bacia teve uma fratura significativa, assim como o fêmur.

Luís Mascarenhas: Enfermeira, temos que chamar o médico ortopedista Gustavo Lemos, com urgência!

Esse caso é de reconstituição óssea.

Enfermeira: Sim senhor.

A enfermeira chama o médico ortopedista Gustavo Lemos para a sala de cirurgia, e o mesmo no momento lava as mãos na pia, para ajudar nos procedimentos cirúrgicos.

Gustavo Lemos: Boa tarde equipe! Soube que temos um caso bem complicado por aqui.

Luís Mascarenhas: Correto meu caro, esse rapaz levou uma queda de três metros de altura e vamos ter que trabalhar para reconstituir parte da bacia e colocar o fêmur no seu devido lugar.

Gustavo Lemos: Eu gosto de desafios! Equipe vamos ter sucesso nessa cirurgia. Enfermeira por favor, as luvas.

E a cirurgia tem início na sala, os médicos são amigos a anos e já enfrentaram casos mais graves no hospital público.

A falta de recursos e equipamentos, fez com que esses profissionais se acostumassem com novos desafios.

Enquanto isso, na mansão dos Villar, Mônica parece estar muito estressada por conta da falta de sua empregada Alice. A governanta Elvira tenta baixar os nervos da Madame.

Mônica: Esses empregados hoje em dia parecem que vivem de férias! Nós os patrões nunca podemos contar com a criadagem! É um absurdo!

Eu pago o salário de todo mundo em dia, pra não ter aborrecimentos.

Aí como eu sofro!

Elvira: Senhora, eu expliquei que a Alice teve um problema pessoal muito grande, o sobrinho dela está numa mesa de cirurgia.

Mônica: Porque tentou se matar. Esse povo que tenta se matar é tudo egoísta. Não pensam que influenciam a vida de outras pessoas com essa burrice de se matar?!

Agora estou eu aqui, desamparada, sem empregada.

Elvira: Mas tem eu senhora.

Mônica: Hahahahaha!!!

E por acaso você vai fazer o almoço Elvira?!

Vai passar as camisas, dar comida para os cachorros?

A única coisa que você sabe fazer é me seguir, pra lá e pra cá.

Elvira: Poxa senhora, falando assim até parece que eu sou uma imprestável nessa casa.

Mônica está penteando o cabelo e olhando para o espelho, nesse momento ela pára e se volta para Elvira.

Mônica: Vamos combinar que você é um estorvo na minha vida né.

Elvira: Estorvo?

Mônica: Sim Elvira.

Eu te recebi na minha casa, quando você não tinha "um gato, pra puxar pelo rabo". Fui bondosa por deixar você morar aqui de graça e ainda de quebra, criei o seu filho, como se fosse meu.

E o que você fez pela minha pessoa? Nada. Simplesmente nada.

A governanta começa a chorar depois de escutar as barbaridades da patroa.

Mônica: Ah vai começar o drama agora?

Como se chorar resolvesse todos os problemas.

Era eu que deveria estar chorando no seu lugar. Adotei o seu filho como fosse o meu, dei de tudo! Do bom e do melhor! No final das contas eu descubro que o Vinícius é um viado.

Tenha santa paciência, parece que eu joguei pedra na cruz!

Elvira: Vinícius é um rapaz tão bom, com um coração de ouro. A senhora não sabe, o quanto eu queria ter sido a mãe dele, mas as circunstâncias da vida não me deixaram. Não discrimine o menino, por uma coisa que ele não tem culpa. Ele nasceu assim.

Nesse momentos os olhos de Mônica ficaram vermelhos de raiva. A patroa então se aproximou da governanta, para destilar melhor o veneno.

Mônica: Agora vadiagem e pouca vergonha é uma coisa natural? Nasce com a gente. Bom saber dessa sua visão de mundo Elvira.

Uma pobre coitada feito você, pobre, empregada, vêm me lidar lição de moral.

A próxima vez que você vier defender o seu filhinho, vou ter o prazer de te colocar no olho da rua. Você me ouviu bem?!

Com o dedo apontado para o rosto da governanta, Mônica faz o que mais gosta "ameaçar".

Elvira: Tudo bem senhora, peço desculpas sobre a minha intromissão.

Mônica: Muito bom, muito bom. Agora desça para a cozinha e faça um almoço com comida vegana. Agora sou vegana, porque faz bem para a pele.

A Madame continua se olhando no espelho, a governanta infeliz por um destino tão cruel, baixa a cabeça e sai pela porta do quarto.