O Camaleão E A Serpente I
O CAMALEÃO
Capítulo 01
1316
Em algum lugar da taiga siberiana
Na noite longa e gélida, onde os ventos uivam como lobos solitários, e o farfalhar dos pinheiros soa ameaçador como o guizo de um touro enraivecido, dois homens envoltos em pesadas peles – provavelmente de ursos – caminham num andar trôpego e arrastado. Estão andando há muito tempo, é nítido. Caminham apoiados em seus cajados talhados e lustrados, lutando contra o vento e o sereno congelante da noite. Não há lua e as estrelas não estão visíveis. A única fonte de luz é a fraca lamparina que carregam, balançando freneticamente, junto com uma picareta gasta, e uma pá de ponta quebrada, cada um levava consigo sua ferramenta. Os homens, de quem só se vê os olhos azuis e alguma franja vermelha, procuram algo no chão, cavucando com os cajados talhados e lustrados, em meio ao fofo tapete de neve acinzentada.
- Observe, Ahmar. Aqui a neve está mais dura.
- Realmente, bem mais rígida – Ahmar cavuca o solo, querendo perfurá-lo.
– Acho que encontramos o nosso túmulo.
O que fazem em seguida é cavar. Cavam sem forças, mas cavam, pressurosamente. O vento ora aumenta, ora diminui, e de súbito começa a chover, não uma chuva qualquer. Uma chuva que logo se torna a tradicional nevada siberiana, impossível de ser suportada por meros mortais. A picareta tine bravamente, suportando a nevasca sem medo e sem pausa. E a pá resvala recolhendo a terra sem parar. Logo uma cova rudimentar é aberta, os homens tiram suas peles que sob elas estão vestidos. Por baixo uma túnica preta, amarrada na cintura por um cordão de São Pedro branco, pés envoltos em mantas negras e barretes negros, com suas grandes cruzes de ouro no peito. Seriam sacerdotes?
Eles se olham rapidamente e se deitam na cova, de rosto para cima. Logo a neve cobrirá os corpos mortos de frio.
Continua...