GERAÇÕES - PARTE I - CAP. III

GERAÇÕES

PARTE I

CAPÍTULO III

Raimundo Thiné era só alegrias. Imediatamente providenciou a troca de turno no curso que fazia e se iniciou em seu novo emprego. Ultimou a mudança dos pais e com eles residia num primeiro andar confortável. Para ir trabalhar, bastava descer as escadas. Estava mais do que contente. Era tudo o que desejava: retirar os genitores do Vale das Cobras e poder alugar um apartamento fora daquele antro e com eles morar. Tudo estava dando certo em relação aos seus projetos. Quanto ao seu desempenho profissional, nada a contestar, muito pelo contrário, em sua ficha havia notas de elogio do chefe, que simpatizara bastante com ele. Não tivera mais notícias de Beto. Ao mudar de turno, perdera por completo o contato com o amigo que o ajudara de forma tão prestimosa. Esforçava-se cada vez mais em suas obrigações, pois,

queria que queria ser o mais competente possível, haja vista que os negócios dos seus patrões eram largos e ele poderia galgar oportunidades de entre eles fazer carreira. Era só no que pensava: em seu futuro, contudo havia uma máxima em seu íntimo: “o futuro se faz agora.”

Tivera sorte de ser acolhido numa organização que só fazia crescer: era tanto lucro que Beto e seu pai cada vez mais investiam. Raimundo não tinha tempo para mais nada durante o horário de expediente: vivia ocupadíssimo. A imobiliária recebera escrituras dos mais novos pa-

trimônios adquiridos: casas de praia, clubes de campo, fazendas, novas lojas e apartamentos e três postos de gasolina. Pensava consigo: “Eles são espertos, sabem investir...”

Dois anos se passaram. Raimundo Thiné estava mais do que satisfeito. Era muito trabalho? Sim, no entanto era muito bem remunerado. Além do apartamento em que morava sem pagar nada de aluguel, seus proventos giravam, agora, em torno de R$ 4.000 e ainda cursava o 3º.

de Administração de Empresas. Iria formar-se muito novo e já com uma larga experiência administrativa. Estava no auge de seus 18 anos. Aprendera a gostar de andar arrumado, impecável. Sempre era destaque nos ambientes em que comparecia. Alto, um pouco magro, cabelos meio castanhos e lisos, moreno claro. Um rosto juvenil, ninguém dizia que vivia o esplendor de suas dezoito primaveras. Largo sorriso enfeitava sua face, estava sempre alegre... Também não

teria como existir tristeza dentro de si, a existência abençoou seus caminhos e ele progredia paralelo aos negócios dos patrões.

Foi com imensa surpresa que, numa sexta-feira, quase ao final do expediente, recebeu inesperada visita. Era Roberto Antunes, Beto, que adentrava naquele instante no escritório da imobiliária. Abandonou o assento e foi receber o patrão.

- Boa tarde, Beto! – Cumprimentou – Que satisfação recebê-lo aqui!

- Boa tarde, Raimundo! Vim buscá-lo para termos uma conversa deveras importante. – Frisou Beto.

- Há alguma falha em meus serviços? – Inquiriu preocupado.

- De forma alguma, de você só tenho elogios e mais elogios. Nem pense em coisas negativas.

- Puxa, ainda bem! – Suspirou.

Ambos saíram alegremente conversando. Entraram no automóvel importado de Beto e seguiram estrada que os levava às portas da cidade. Escolheram um local aprazível e elegante para dialogarem, ali não haveria quem os incomodasse.

- Estou bastante curioso, Beto... – disse Raimundo – Depois de dois anos que trabalho para você, esta é a primeira vez que me procura...

- É verdade, porém jamais o esqueci, sempre acompanho seu desempenho, por sinal maravilhoso.

- Obrigado! – Raimundo agradeceu.

- Não agradeça, nós é que temos de agradecê-lo por sua dedicação profissional. É um funcionário de minha inteira confiança, por isso é que estou aqui hoje ao seu lado a fim de, entre outras coisas, informá-lo de nossas pretensões para o futuro. – Colocou Beto.

- Fico muito feliz em saber que fui escolhido por você para fazer parte dos planos da organização.

-Você faz parte de planos que nem sonha...

- Quanta honra! – Raimundo se expressou.

- Primeiramente, você trabalha num setor que tudo sabe sobre nossos negócios. Tudo o que temos, obrigatoriamente, encontra-se registrado nos arquivos da imobiliária.

- Positivo.

- Eu e meu pai conversamos muito... Nossos investimentos cresceram e hoje atuamos no ramo imobiliário, no ramo da beleza, postos de gasolina, fazendas, clubes de campo... Para que chegássemos até aqui, Raimundo, foi muito suor derramado, muitas noites de sono perdidas, contudo, valeu a pena. Confesso que estamos mais do que milionários...E é devido a isso que resolvemos investir em outro setor: no de supermercados. Acabamos de adquirir o controle acionário do Visconde, a terceira do ranking nacional. Claro está que a imobiliária receberá por estes dias todas as escrituras dos imóveis que compõem tal organização.

- Parabéns, Beto! –

- Parabéns para nós todos. Dialogando com meu genitor, chegamos à conclusão de que temos de abrir uma empresa que congregue e administre todos os negócios. Claro que todas permanecerão independentes, porém regidas sob o controle de um Centro Administrativo, um Conselho de Administração. Será a Fundação Mercantil Dagoberto Antunes, da qual meu pai já me elegeu Presidente. Ele está se aposentando, está cansado e deixa todos os

empreendimentos em minhas mãos.

- Caramba! Mais uma vez , parabéns! – falou Raimundo.

- E você não me pergunta onde Raimundo Thiné se encontra inserido nisto tudo?

- Eu? – Raimundo se exprimiu nervosamente – eu estou dentro de todos estes planos?

- Está, Raimundo. Entre outra coisa, que falarei depois, é por isso que estamos aqui.- Confirmou Beto.

- Santo Deus! – Havia lágrimas nos olhos brilhantes de Raimundo – E onde eu entro?

- Você está sendo escolhido por mim para ser meu Vice-Presidente... aceita?

- Vice-Presidente do Conselho de Administração da Fundação Mercantil Dagoberto Antunes?

- Exatamente.

- Credo! E eu mereço tudo isso, Beto?

- Merece... mas...

- Mas, o quê?

- Isto está condicionado a algo bastante particular entre eu e você...

- Não estou entendendo...

- Serei claro o suficiente.

- Seja, é bom que nada fique obscuro.

- Com certeza. Você se lembra do dia em que lhe disse que chegaria a hora certa de você agradecer-me por tudo quanto tenho feito por você?

- Sim, lembro... e daí? Como tenho de te agradecer, repito o que disse naquela oportunidade, tanta caridade?

- Eu e você temos a mesma idade... 18 anos! Logo, somos possuidores de intensa força juvenil, os hormônios dançam e fervem em nosso organismo...

- Disto eu tenho certeza...- Confirmou Raimundo.

- Então... somos jovens, modernos, cabeça feita, não temos preconceitos de nada, ou você tem?

- Nenhum.

- Ótimo! Fica então tudo mais fácil...

- Mais fácil para quê?

- Para nós dois nos acertarmos...

- Nós dois???

- Sim... Faz tempo que gosto de você, não é de hoje...

Raimundo compreendeu onde Beto queria chegar. Seu rosto se contraiu, suava como se estivesse a correr trezentos quilômetros por hora. Nervosíssimo, levantou-se da cadeira em que

estava e passou a andar de uma ponta a outra dentro do salão do restaurante...Poucas pessoas frequentavam aquele sofisticado ambiente. Não sabia o que dizer... era aceitar ou certamente perder tudo o que alcançara até então e não galgar mais nenhuma esperança de prosseguir subindo...

- Você está me propondo um caso íntimo comigo, é isso? – Interpelou, com forte brilho no olhar.

- Vejo que entendeu muito bem minha proposta. É isso mesmo.- Beto asseverou.

- Você me dá algum tempo para eu pensar e decidir?

- Lamentavelmente, não! É pegar ou largar, tem de resolver aqui e agora, se aceita ou não.

Todo o esforço dos últimos dois anos de dedicação vieram à sua mente. Todas as possibilidades de um futuro grandioso rasgavam o seu pensar. Estava em cima do muro... num momento em que uma decisão errada poderia pôr abaixo todas as suas aspirações.

- Você soube esperar o momento certo para dar-me esta alfinetada... Tenho um bom salário, resido com meus pais num apartamento confortável sem nada pagar de aluguel, enfim, você aguardou ver-me amarrado por todos os lados e agora cobra o que acha que lhe devo...- Raimundo disse.

- Você não me deve nada, Raimundo... Eu que gosto de você, fazer o quê? Ou aceita ou não...

Raimundo coçou o queixo. Estava mais calmo, já não suava tanto... Conseguiu prolongar o diálogo e mentalmente analisou todas as possibilidades... Chegou a uma conclusão:

- Eu aceito!

- Que bom! Sua decisão me deixa feliz, afinal prova o quanto inteligente você é... –Beto falou.

- Não me resta outra saída... Bem lá do fundo do poço, acho que também sinto alguma coisa por você... Isso me ajudou a decidir.

- Gostou do carro que viemos até aqui? É zero, tirei esta semana da agência e está em seu nome. É um presente que ofereço por sua arguta posição.

- Apenas temo uma coisa – Raimundo afiançou.

- O quê? Fale!

- Nos comentários dentro da organização, somente isso...

- Não há razão para preocupar-se com isso: ninguém precisa tomar ciência, seremos os mais discretos possíveis, não será uma relação aberta., até porque não quero e não devo decepcionar meus pais... E também há Eugênia, minha namorada, com quem me casarei brevemente.

- Terá como conciliar os dois lados de sua intimidade?- Raimundo quis saber.

- Sim... Um dos meus apartamentos já está montado para nós dois, será lá que nos encontraremos para nossas particularidades.

E entregou a Raimundo a chave do imóvel.

- Não quero chaves de lá para não levantar suspeitas. Vamos até lá agora, levo-o a conhecer nosso ninho...

O apartamento localizava-se nos arredores da cidade, num condomínio simples. Estava bem mobiliado, tinha de tudo do bom e do melhor. Certo ou errado, o que se passava na cabeça de Raimundo Thiné era não jogar no lixo as oportunidades que a vida lhe oferecia. O tempo encarregar-se-ia de mostrar se sua decisão houvera sido um engodo ou uma opção de acerto.

Neste mesmo dia conheceram-se intimamente e tiveram uma noção de como seria o futuro entre si.

AMANHÃ - O IV CAPÍTULO DESTA I PARTE

Ivan Melo
Enviado por Ivan Melo em 10/01/2015
Código do texto: T5097220
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2015. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.