Nos domínios da Morte-em-Vida: Viagem por Kishinev (Cap. XIX – Conclusão)
O percurso de minha memória vai chegando ao seu fim, da mesma forma que minha viagem encerrou-se alguns dias depois. Tendo me aventurado o bastante por Kishinev, parti a sul, e cruzando a fronteira com a Romênia tomei um barco na cidade de —, singrando o Mar Negro rumo à minha próxima parada.
Olhando para trás e vendo o litoral ficar cada vez mais distante, pensei em tudo que me acontecera até então, e em como meu intento de encontrar consolo num lugar que se assemelhasse a meu estado de espírito malograra – deixava Kishinev em sua melancolia muito mais triste do que chegara, agora carregando comigo não só os meus pesares, mas também os de seus 530 mil habitantes. Repassava em minha mente os semblantes de Constantin, Alina, Mihai – pessoas que agora estavam ligadas a mim, e em quem jamais haveria de deixar de pensar de agora em diante. Sonhava com o dia em que Constantin e eu nos reencontraríamos, e lembrando-me de Mihai e Alina, aquele adágio reverberava por meu cérebro, dando-me calafrios: “Deus enlouquece aqueles a quem quer destruir”. Seria eu o próximo?
Mesmo em prantos, Kishinev era bela; tinha certeza absoluta de que, algum dia, algo ou alguém reergueria aquelas ruínas e sua beleza seria vista a olho nu novamente. Comigo não era diferente: repeli meus pensamentos pessimistas e, injetando-me com esperança, proclamei interiormente que tanto aquela cidade quanto eu seríamos felizes – ela e eu merecíamos coisa melhor. Todos merecem.
Sorrindo e tentando controlar meu enjoo, olhava o mar, o vasto e enigmático mar, conjeturando o que de bom (e de ruim) aguardava por mim em meus novos destinos.
(26 de julho de 2021)