Uma Mente de Criança — Capítulo 2 – Parte 1

É incrível como os sentimentos são. Eles existem aos milhares e são muitos para um mesmo nome. Nenhum psicólogo foi capaz ainda de inventar tantos nomes para tantos sentimentos. Quando olhei para os olhinhos do menino dentro daquele buraco, poderia claramente nomear o sentimento que eles exprimiam como desolação. Agora, solitário novamente, mas num mundo diferente daquele úmido e terrível em que a escuridão predominava, eu poderia dizer que o sentimento que aflige o pobre pequenino ainda é desolação. Mas seus olhinhos brilham de maneira tão distinta de quando estava naquela escuridão que nem sei mais que nome dar.

Sem saber o que fazer, ele apenas moveu os olhos de um lado ao outro. Estava numa varanda. Era a varanda da casa. Uma daquelas velhas cadeiras de balanço se movimentava para frente e para trás motivada pela brisa que soprava. Pendurado numa das pilastras de madeira, havia um sino de vento; tocava lentamente uma canção composta com carinho pela leve brisa.

O menino olhou para trás desejando que a fada não o deixasse só, mas viu apenas a porta fechada e duas janelas de vidro, uma de cada lado da porta, com cortinas que impediam a visão do interior da residência. O pequeno tentou abrir a porta, mas a maçaneta escorregou pelos dedos magrinhos. Estava trancada.

Voltou novamente a olhar para frente. Desolado. Sentiu o calor da tarde. Olhou para além das sombras da varanda. Viu um descampado. Apenas um descampado. Um imenso e plano descampado com um gramado perfeito e cuidadosamente aparado. Era absolutamente verde e vivo. Se o menino já fosse casado, tivesse um bom emprego e bons vizinhos para um churrasco, ficaria impressionado com aquele gramado, pensaria no quanto de água deveria ser gasto para deixar aquele terreno sempre irrigado. Pensaria, também, no cortador de grama e na disposição de quem fosse recolher tanta grama cortada. Mas o menino se maravilhou apenas com a cor verde que se estendia a sua frente.

Forçou-se para enxergar o fim da planície. Não viu nada. Forçou-se mais uma vez e viu um ponto ao longe de um verde um pouco mais escuro. Não soube o que era, estava muito distante. Deu um passo a frente. Olhou. Deu outro passo. Precipitou o pescoço à frente. Parou. Colocou a mão sobre os olhos e o sol que agora o atingia deixou de queimá-los. Deu outro passo e foi ao chão por pisar em falso no degrau de entrada da varanda.

Rafael Marchesin
Enviado por Rafael Marchesin em 26/06/2014
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