Uma Mente de Criança — Capítulo 1 – Parte 3
O buraco se iluminou feito a manhã depois do sol nascente. A antiga escuridão foi substituída por uma completa claridade. Sentiu-se aquecido. Foi a vez dos ouvidos do menino se aguçarem e tentar entender o que ocorria do lado de fora. Era o som de madeira rangendo. Rangia do mesmo modo que aquelas cadeiras de balanço que ilustram as varandas das casas antigas. O som não fez sentido aos ouvidos do garoto, mas foi o primeiro barulho que escutara depois daquelas incessantes gotas que caíam em sua palma.
O som não diminuiu, ao contrário, aumentou. Soou com uma velocidade ainda maior e seguiu-se um estrondo. Como em uma explosão, a luz adentrou o buraco e cegou os olhinhos do menino. Sem forças, o pequeno corpinho tombou para trás quando o apoio em suas costas desapareceu. A mão sobre o tornozelo pendeu para o lado e a dor lacerante o fez soltar um grunhido bem baixinho e rápido.
Os olhinhos ardiam.
Mas lentamente eles foram se acostumando com a luminosidade.
Ainda deitado levemente inclinado para o lado e com fraqueza suficiente para não poder se mexer, viu lama espalhada para todo canto. A terra escorria junto a filetes de água.
Tentou mexer os dedos das mãos e insinuar um levantar, mas eles não obedeceram. Então viu. Debaixo da terra esparramada sob seu peso havia uma grande tábua de madeira. Com leves movimentos dos olhinhos negros, viu que outras duas tábuas tombavam da mesma maneira debaixo da terra molhada, uma a sua frente e outra partindo de seus pés. Soube, então, que, às suas costas, outra tábua se estendia. Era como se uma caixa tivesse sido repentinamente desmontada e liberado seu conteúdo.
Um sussurro chegou até seus ouvidos:
— Oi, menino.
Era uma voz graciosa, aconchegante e segura.
O menino novamente sentiu-se aquecido. Olhou para o alto e, com seus olhinhos ainda mal acostumados com a luz, viu apenas um contorno de pessoa. Pensou ser um anjo.