ZECO, O ÓRFÃO - cap. V

ZECO, O ÓRFÃO

Capítulo V

Emoções

No dia seguinte Zeco acordou cedo, muito antes do que normalmente despertava. Levantou-se, espreguiçou-se e saiu do quarto. Desceu as escadas e buscou sobre a mesa o cartão que Zélia havia deixado. Estava mesmo decidido. De posse do cartão, sentou no sofá, pegou o telefone e discou. Zélia logo atendeu.

- Bom dia! É a Srta. Zélia?

- Sim, sou eu! Bom dia! Com quem falo?

- Com Oscar Flores, Zeco...

- Ah... Decidiu alguma coisa sobre aquele assunto?

- Decidi. Quero conhecer meu pai, minha mãe e meus irmãos.

- Ótimo! Eu sabia que você me retornaria. Para quando quer que aconteça?

- O mais breve possível, estou ansioso. Pode ser hoje?

- Pode. Como faremos então?

- Iremos em seu carro. A Srta. passa por aqui e me pega. Qual o melhor horário?

- À noite, pois, teremos a chance de encontrarmos todos em casa. Às 19 horas está bem para você?

- Está. Ficarei à sua espera.

Neste dia nem foi à aula, tamanha a sua apreensão. Ligou para o colégio e disse a Dona Prazeres que estava indisposto e ficaria em casa naquela tarde.

- Está bem, Zeco, cuide-se! – Desejou Dona Prazeres.

Desta vez o tempo correu. Zeco nem saiu para comer fora, arranjou-se o dia inteiro com o que tinha na geladeira, por sinal, bastante sortida. Às 18 horas entrou no banheiro e tomou banho. Saiu e colocou uma roupa elegante, sapatos tênis. Estava um príncipe de tão belo! Às 19 horas em ponto a campainha do portão soou e ele se foi ao encontro da enfermeira.

- Boa noite, Srta. Zélia!

- Boa noite, Zeco...

- Sabe a senhora por que eu escolhi o dia de hoje para esta revelação?

- Não tenho a menor ideia. Por quê?

- Hoje faz exatamente 14 anos que vim ao mundo!

- Oh, Zeco, parabéns!

- Obrigado! O pessoal lá sabe o que vai acontecer, estão à nossa espera?

- Não, será uma grande surpresa.

- Melhor assim – Concordou Zeco.

O trânsito estava um pouco engarrafado, por isso demoraram um pouco para chegarem ao destino. Às 20 e l5 o carro estacionava bem em frente a um portão onde havia algumas pessoas conversando nas cadeiras ali colocadas. Pela janela do carro, Zeco percebeu um senhor de meia idade ( mais ou menos uns 40 e poucos anos ), uma senhora mais nova ( só um pouco mais nova ) e dois garotos, de uns 15 anos e outro de 16. Todos olhavam curiosamente as pessoas que desciam do automóvel e viam em suas direções. Foi Zélia quem se apresentou.

- Boa noite! Meu nome é Zélia, eu gostaria de falar com Dona Mercedes e com o senhor Maurício... São vocês , por acaso?

Maurício de Carvalho levantou-se e os cumprimentou.

- Boa noite! Sim, somos nós mesmos. O que deseja de nós, Dona Zélia?

- Poderíamos entrar? É um assunto um pouco grave e estamos quase na rua...

Foi Mercedes quem respondeu.

- Pois não! Entremos. E este garoto ( olhava fixamente para Zeco ) é seu filho?

- Não, apenas meu acompanhante, um amigo. – Retrucou Zélia.

- Oh, que lindo que ele é! – Elogiou Mercedes.

Encabulado, Zeco agradeceu.

- Muito obrigado!

- Se meu filho mais novo fosse vivo, certamente teria sua idade. Quantos anos tem?

- 14 – Respondeu Zeco.

- Eu não disse! – E colocou a mão no ombro de Zeco e o levou para dentro.

- Estes dois moleques aqui são meus filhos. Este é Pablo, tem 15 anos e este outro é Luciano, vai completar 17 no próximo mês. – Disse Mercedes, apresentando os rapazes.

- Que família bonita! – Falou Zélia.

- Obrigada! – Mercedes agradeceu.

Neste ínterim, todos já estavam na sala de visitas, confortavelmente sentados . A televisão estava desligada e todos ficaram atentos à Zélia, que iniciava sua pregação.

- Conforme disse lá fora, tenho um assunto muito sério para dialogar, espero que estejam preparados para me escutarem.

Zélia já começou a narrativa pranteando, deixando a todos no mesmo estado de emoção.

Detalhe por detalhe e foi revelando o crime que cometera há 14 anos antes. Não deixou escapar nem um centímetro, tudo estava escancarado, revelado, posto em pratos limpos...

Maurício Carvalho, emocionadíssimo, falou.

- Sabe da gravidade do que acaba de contar, não sabe Dona Zélia?

- Sim, eu sei. Só falta acrescentar um detalhe. – Completou Zélia.

- Então diga logo, já nos emocionou o suficiente, não acha? –Interrogou Maurício.

- Este garoto que veio comigo, é ele o filho de vocês sequestrado da maternidade...

O ambiente tornou-se... lágrimas, choros convulsivos, soluços, desmaios... ( Mercedes desmaiara ), mas logo recobrou os sentidos. Agarrou-se a Zeco, apertava-o de encontro ao peito, acariciava-o em seus cabelos, beijava-o repetidas vezes.

- Meu filho, meu filhinho... Meus olhos nunca me enganaram até hoje. Quando pus o olhar em você, meu coração disparou... Meu filhinho, você está vivo! vivo! Ó Deus, obrigada, Senhor, obrigada!

Zeco chorava mais que todos, estava visivelmente tombado de intensa emoção. Abraçou Maurício e lhe encheu o rosto de beijos e mais beijos.

- Você é meu verdadeiro pai! Papai! Meu pai biológico... perdão!

Pranteando desesperadamente, Maurício o abraçou e disse.

- Você é tão vítima quanto nós... Não há porque pedir perdão. E o tomou nos braços, levantou-o e o ofereceu à família.

- Venham todos, abracem e beijem o irmão caçula, Deus o traz de retorno ao lar!

Pablo e Luciano abraçaram-se a Zeco, acariciaram seus cabelos, beijaram suas faces... Zeco a tudo devolvia com muita emoção. Finalmente os ânimos serenaram. Zeco, então, falou:

- Meu lugar é junto de minha família, porém ainda não será a partir de hoje. Retorno para o meu lar e será lá que receberei vocês, estão convidados a mudarem para morar comigo, só que ainda temos algumas coisas jurídicas para tomarmos providências.

- Exatamente, disse Zélia. Eu proponho que seja feito exame de DNA para dar mais segurança a tudo o que aqui foi revelado. Maurício disse:

- Certamente o juiz a isto solicitará, mas sei que é proforma, vejam como ele é a cara da mãe e a semelhança que tem com os irmãos. Isto já bastaria para mim...

Zeco, ainda bastante emocionado, pediu:

- Entendo que Zélia cometeu um crime. Recebeu alto valor em dinheiro para fazer o que fez, também tinha o pai precisando de cuidar da saúde e ela não tinha recursos. Ficou entre a cruz e a espada, por isso, peço perdão para ela, não a denunciem, ela provou o quanto do caráter que tem, depois de tanto remoer essa culpa por todos estes anos.

Foi Mercedes quem primeiro se manifestou.

- De minha parte tem o perdão, mas que suma de nossas vidas.

Maurício endossou as palavras da esposa.

- Está bem, Oscar, atenderemos seu pedido, contudo temos de pensar em como faremos para resolver juridicamente este caso, pois, para isto, precisaremos de um bom advogado e isto é dinheiro, coisa muito rara nesta casa.

- Não se preocupe com nada em relação a dinheiro, eu ponho em suas mãos a quantia de que necessitará para que tudo seja resolvido.

E ainda conversaram até 1 hora da manhã, quando Zeco e Zélia se despediram. Zeco tudo passou de si para Maurício: endereço, local onde estudava, telefones... e convidou o pai para ir à sua casa no dia seguinte pela manhã, dissera ele, havia muito sobre o que resolver sobre aquele que havia sido seu pseudo pai.

- Está bem, Oscar, meu filho, amanhã aí pelas 9 horas estarei em sua casa, sem falta.

- Obrigado, pai Maurício, e não me chame de Oscar, todos me conhecem por Zeco.

E riram. Todos se abraçaram. Zeco retornou para sua casa. Um novo dia nasceria e muita água ainda rolaria por debaixo da ponte.

FIM DO CAPÍTULO V

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Ivan Melo
Enviado por Ivan Melo em 27/04/2014
Código do texto: T4784746
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