PROGRAMANDO MENTES | 1

1| COLONIZAÇÃO JESUÍTA

Dia de trabalho árduo em um rústico posto avançado do Instituto da Mente, órgão do Sistema responsável pela adequação das pessoas à vida social sob controle de uma elite dominante. Dois programadores trabalhavam em parceria com um reverendo cristão em um adestramento individual de teste. A intenção deles era colocar ideias religiosas montadas pelo Conselho Cristão, entidade que auxilia o Sistema com o controle populacional sustentado pela fé, do qual o reverendo é o representante no local. Os rapazes precisariam de seu auxílio para testar o lavador de cérebros que projetaram. Uma vez que cuidam apenas da parte técnica, foi necessária a presença do representante ecumênico.

– E então, meus jovens, podemos começar a operação?

Perguntou o reverendo retirando com a língua em seus lábios os farelos do pão com salame que ele mordiscava. A bata preta que vestia se mantinha impecável em limpeza por causa desse gesto constante. O labão está sempre a comer alguma coisa, a fim de sustentar seu rigoroso e pesado pouco mais de um metro e sessenta de altura.

A cobaia, uma mulher branca, aparentemente perto dos trinta anos, adormecia vagamente em uma espécie de divã. Cabos do aparelho saíam dele para sua testa e braços como se estivesse pronta para uma cirurgia. Sentava-se em frente ao monitor do Mentotech, a manejar o teclado, o programador senior Bill. A medida que seu chefe, Varga, lhe instruia ele entrava com os comandos no prompt do sistema operacional do Mentotech.

– Bill, pode iniciar o sistema operacional.

Ordenou Varga, de pé e ao lado de seu subordinado. Nisso o prompt do SO piscava aguardando comando.

MENTE:/

Sem esperar muito, o comando foi recebido.

MENTE:/lavar mente

Ao pressionar a tecla ENTER, na tela do monitor apareciam os status de cada operação executada internamente e novas requisições surgiam, as quais Joe informava sem que Varga ou o pároco precisassem interceder.

Tipo de lavagem:

MENTE:/religiosa

Região de operação:

MENTE:/ocidente

Religião:

MENTE:/cristianismo

Operação:

MENTE:/incutir ideia

Ideia:

MENTE:/

Bill virou-se para seu comandante como a esperar que ele lhe fizesse a vez. Seus olhos pulavam dos óculos em direção à testa. Varga estava de braços cruzados e desfez usando uma das mãos para mostrar ao religioso o que era exigido na tela do monitor.

– Bem, vamos começar com Deus. Estabelecemos que o cristianismo será uma religião monoteísta, portanto não haverá a figura de outros deuses para dividir com ele a adoração dos fiéis. A primeira coisa que as pessoas precisam ter em mente para fazer valer uma ideia religiosa é a de um ser supremo, eterno, que criou tudo, que vê tudo, que pode tudo e que está em todo lugar, apesar de ninguém ver. Temos que fazê-lo bondoso e mal, mas as pessoas têm que defender apenas seu lado bom. Nunca enxergar o seu lado mal. O lado mal tem que passar despercebido. Ele dita alguns mandamentos para que seus súditos andem na linha, mas quem falhar terá punição, o inferno, e quem mandar bem será premiado com a vida eterna e em melhor situação do que a que conhece aqui na Terra. Acha que conseguirão colocar isso tudo na mente da espécime?

– Cremos que sim, senhor, trabalhamos com um processo de criação de inteligência artificial de última geração. Vida eterna, inferno, ser invisível adorável, tudo isso é fruto de inteligência artificial. A inteligência natural não concebe esse tipo de coisa. Mas vamos lá!

Varga deu essa resposta e o padre, Paulo, prosseguiu com a doutrina estabelecida pelo Conselho Cristão através de seu presidente, Constantino, e membros da elite dominante, visando a implantação do modo de pensar religioso naquele meio ocidental que iniciaram colonização depois de o terem descoberto. O que fez a civilização colonizadora interessar por tal procedimento foi a existência abundante e rara de um determinado metal no solo da ilha. Precisavam escravizar os índios guerreiros e feiticeiros que encontraram na região quando nela chegaram com seus navios, tendo detectado o tal metal através de radares aéreos existentes em discos voadores da frota do Serviço de Espionagem Espacial que o Governo colonizador criou para fins políticos ou científicos que a nação imperialista viesse a se deparar. Qual departamento, quando detecta ou constrói algo de interesse para o progresso e soberania da pátria que o mantém, recebe atenção do Departamento de Estado. E na maioria das vezes se transforma em política imperial e de invasão. O Governo daquele país, um reino, possui um vasto e eficiente exército, preparado ocultamente por extraterrestres de uma civilização antiga e distante, que contribuem também com seu vasto conhecimento tecnológico e biológico sobre a raça humana. A ação política objetiva a dominação dos nativos para lhes roubar o minério poderoso em vez de fazer um levantamento para lhes pagar de alguma forma um valor, deixando o povo soberano logo que terminasse com o extrativismo.

E essa força se vê tendo que ser empregada, embora não tenha havido ainda a expedição do mandato de introspecção ostensiva na colônia. Experimentam o adestramento com o uso da metodologia religiosa para poupar gastos com ataques e problemas diplomáticos com as outras nações. Já tentaram, sem êxito, a troca de objetos como espelhos, roupas e artigos artesanais. Enfrentam problemas para impor seus deuses tão somente, pois os tribais ainda não se renderam à religião alguma. Trata-se de um povo que viveu isolado até os dias de hoje e até então recorriam à natureza para obter tudo que precisassem. Não tinham momento religioso, pois a ligação com o criador do mundo, que é o mesmo para todo o universo, é realizada naturalmente, pelo simples fato de sentir a vida. Respirando, aquecendo-se ao Sol; olhando, devotando e protegendo a natureza. Para utilizarem seus livros sagrados, os colonizadores precisariam alfabetizar os colonos. Isso levaria tempo. Eles têm urgência do minério raro para suas experiências. Seus astrônomos previram uma colisão de um planeta chamado Nibirus contra a Terra, a qual a destruirá totalmente. O planeta X tem uma órbita de 3600 anos com relação à Terra. A cada 3600 anos ele aparece no sistema solar e cada vez mais próximo da atmosfera terrestre, provocando terremotos, maremotos, tsunamis e outros tipos de catástrofes. Mas dessa vez irá chocar. Será a segunda vez que acontecerá esse tipo de colisão com Talmat ou Terra. Os cientistas do reino algoz desenvolvem naves espaciais e o poder político pretende levar 144.000 escolhidos para Marte, onde os extraterrestres parceiros mantêm uma estação capaz de acolhê-los. Um reino de 40 milhões de habitantes, certamente os membros da elite é que ganharão os passes para fugir da hecatombe e salvar sua linhagem. E quem sabe a vida humana. Mas esse privilégio é mantido em segredo para obter cooperação de todos no reino.

Diante dessa impossibilidade de usar a tática da alfabetização, o Governo colonizador encomendou a construção do Mentotech. Novamente orientado pelos parceiros extraterrestres, que conhecem muito bem a mente humana. O aparelho é suportado energeticamente por geradores atômicos deixados no local pela frota de navios. A autonomia de consumo é alta graças ao emprego de energia nuclear. Na ilha não há rede de eletricidade. O plano é configurar a mente da Cobaia, Eva, para os propósitos da expedição e, caso ocorra progresso, buscar, à força se necessário, o lider dos tribais, Adão, para programá-lo. Tendo Adão e Eva em seu poder, os demais aborígenes serão facilmente influenciados. Logo após a absorção das ideias cristãs, o próximo passo será a exploração do medo. O medo do desconhecido, o medo do poder de Deus, o medo do inferno e principalmente um medo que esperavam que os ilhotas já tivessem: o de morrer. E junto ao medo contarão com a esperança que criarão em seus alvos: a esperança da salvação. Criarão pecados, que serão construidos de acordo com as necessidades de mudança de hábitos e comportamentos dos alvejados que surgirem. E promoverão o desejo de não cometê-los, garantindo por isso a vida eterna em um lugar maravilhoso: o céu. O local onde Deus vive. O qual materialmente nenhum ser vivo é capaz de atingir. Nem mesmo portando os aparatos tecnológicos que o reino possui. Essa dificuldade de chegar até Deus os convencerá de que esse ser existe e fará com que pensem que só é possível ele chegar até eles. Uma das formas será orando. Orações serão ensinadas para os estúpidos e os colonizadores preveem com isso que eles gastarão um bom tempo com essa prática, se reunindo em igrejas, enquanto o minério é levado. Tática que costumam usar com o futebol e com a televisão e funcionam melhor, mas que não poderão usar devido ao curto prazo. A fé formará a obediência e garantirá para a colônia a conquista do seu quinto ou dízimo.