Capítulo 12 de A Educação Sentimental de Xavier Renart
Acordar, para poder dormir.
Fernanda acordou com uma imensa dor de cabeça. Sua boca estava completamente ressecada e com um gosto muito ruim. Sentiu o cheiro e olhou, e viu que havia vomitado. Ao seu lado, Theo estava dormindo virado para o lado, e também havia um resto de mancha de vômito do outro lado da cama. O cheiro e a dor de cabeça fizeram-na vomitar de novo. Tentou levantar, mas o vômito saiu ali mesmo. Sentia-se péssima. Se levantou sem forças para ir ao banheiro.Ao sair da cama ainda meio sonolenta sentiu sua meia se encharcando, pois havia pisado na poça de vômito. O nojo invadiu todo seu ser, subindo como um calafrio na espinha que puxava um bolo no estômago e nos intestinos. Seu estômago doía como se tivesse levado um soco. Retirou a meia e foi em direção ao banheiro lavar a boca. Sua cabeça doía muito. Ao se olhar no espelho viu seu rosto todo borrado do resto da maquiagem e uma aparência horrível, com duas grande olheiras e uma cara de acabada. Quis vomitar de novo mas não saiu nada. Percebeu que sua roupa também tinha manchas de vômito e as retirou. Ligou a água quente e entrou no banho com nojo de si mesma. A noite passava na sua mente através de flashs meio confusos. Mas se lembrava muito bem da cena da qual participara. O frio do banheiro foi se modificando com o calor da água que ia penetrando seu ser. Aquilo ao mesmo tempo a confortava e piorava sua situação. Seu estômago embrulhou de novo, mas ela conseguiu conter a ânsia de vômito. Bochechava a água quente do chuveiro para tentar tirar o gosto ruim da boca, e ia bebendo minúsculos goles para retirar a sensação de secura da boca. Sentia que seu corpo inteiro estava ressecado. As águas quentes e o sabonete com perfume cítrico iam retirando aos poucos a lembrança do cheiro de vômito. Estendeu a mão e pegou uma pasta de dentes que estava em cima da pia do banheiro. Estava muito cansada. Como já havia escorrido muita água com espuma do sabonete, julgou que poderia sentar-se no chão do banheiro e ficou lá, debaixo do chuveiro quente, bebendo a água quente do chuveiro aos poucos, em minúsculos goles. Quando sentia vir a ânsia de vômito parava e esperava um pouco. Deixava a água escorrer pelos seus cabelos e pela sua pele, e levar o suor que o calor da água já fazia brotar. Bebia mais água. Ficou com um pouco de medo daquela água lhe fazer mal, mas não sentia o peso da água da torneira com o qual ela estava acostumada. E como só tomava quantidades muito pequenas de cada vez, ainda não havia tomado nem um copo. Procurava não pensar em nada para evitar a dor de cabeça, só sentir a água escorrendo pelo seu corpo.
Ficou ali sentada procurando melhorar durante uns vinte minutos, até sentir que estava cozinhando. Desligou o chuveiro e deixou uma ducha de água fria tentar fazer com que seu corpo esfriasse um pouco. O choque térmico a retirou do estado letárgico em que ela estava e deu um pouco de ânimo. Saiu do chuveiro com sentindo o corpo ainda quente. Enxugou os cabelos somente com a toalha e saiu com eles ainda um pouco molhados para o quarto, e lhe voltou o cheiro de vômito. Theo continuava deitado na mesma posição na cama rodeada de vômito. O cheiro era muito ruim. Ela queria se deitar e continuar dormindo, mas ali não dava. Sua mala estava no outro quarto e ela tomada de uma súbita revolta com a situação abriu a mala de Theo e pegou um jeans velho uma blusa folgada vermelha com logo da Allons e um casaco de moletom de capuz preto com fecho dourado. Calçou meias grossas pretas os chinelos de Theo. Saiu do quarto em direção à recepção para ver se pegava um chá quente, pois sentia que seria a única coisa que iria parar na sua barriga. Ao chegar na recepção viu Clarissa que estava se despedindo de alguns hóspedes que já deixavam o hotel.
- Oi Querida! Já vai tomar o café?
- Só queria um chá quente... de que é que tem?
Clarissa olhou bem para Fernanda, e depois de um jeito compassivo arriscou uma proposta de intimidade. – Olha só, se você estiver com dor de cabeça por causa de bebida, eu posso te dar um sugestão.
- Ai, então pode dar. – Fernanda só queria fazer parar aquela dor – Dor de cabeça e dor de estômago – Fernanda pensou que ela havia vomitado no quarto do hotel, e ficou sem graça de falar com Clarissa sobre isso.
- Ta, você tem alergia ou algum problema com remédio para dor de cabeça?
- Não, qual você tem ai? – Clarissa mostrou o remédio com o qual Fernanda já estava acostumada – Não, não tem problema nenhum não.
- Então faz o seguinte. Espera um pouco que vou fazer um chá para você. Ai você toma junto com dois de uma vez. E um para o estômago, para parar a ânsia de vômito. Vamos lá fora, querida, o ar fresco vai te melhorar um pouco.
Fernanda acompanhou Clarissa até o salão de café da manhã e ficou perto do jardim, onde estava mais frio, e ainda havia uma neblina forte, apesar do sol já estar bem presente no céu. Deveriam ser uma nove horas da manhã. O frio e o ar úmido realmente iam causando uma melhora nela. Respirava aquele ar limpo, com um leve cheiro de pólem. Sentia o ar frio entrando em seus pulmões, se aquecendo e saindo na forma de vapor. Já começava a sentir um pouco de frio quando Clarissa lhe chamou.
- Você não prefere tomar o chá aqui dentro? Ai fora está um pouco frio ainda.
Ela foi e sentou-se à mesa com um bule de chá e uma xícara já quente à sua frente. Ao lado do bule três comprimidos. Tomou a primeira xícara. O chá era um pouco amargo, mas não demais. Ela sabia que havia erva cidreira, pelo aroma cítrico, mas também haviam outras coisas que ela não identificava. O estômago aceitou bem o chá, que ela tomava bem devagar. Ao fim da primeira xícara, com o chá mais frio tomou os dois comprimidos para dor de cabeça com o resto do chá. Encheu a xícara de novo e fez o mesmo processo ao final dessa com o comprimido para o mal estar no estômago. Não conseguiu tomar uma terceira. Um cansaço enorme se apossava dela. Queria deitar e dormir. Não podia voltar para o quarto, e não sentia que podia pedir outro quarto para Clarissa. Resolver ir para o seu quarto original, tirar as roupas de Theo e colocar as suas, e ver se conseguia expulsar Carol para o quarto vomitado e dormir em sua cama.
Subiu o lance de escadas de madeira sentindo cada rangido como se fosse uma torção em seu cérebro. Bateu na porta do quarto sem resposta. Bateu de novo e escutou alguém se levantando. Karine abriu a porta com cara de que não estava realmente acordada ainda. Olhou para Fernanda.
- Melhorou?
- Não. Preciso dormir mais.
- E o Theo.
- Acho que ta vivo ainda.
Karine voltou para a cama onde estava e Fernanda entrou no quarto fechando a porta. Enquanto Karine pegava os edredons que usava mostrou onde havia mais lençóis limpos e edredons para Fernanda, que já estava mexendo na sua mala, e retirando uma meia calça e um moletom e tirando as roupas de Theo. Karine deitou-se na cama com Carol e a abraçou, cheirando sua nuca. Olhou para trás, para a Fernanda:
- Não vai vomitar agora não ne?
- Não, já to melhor.
- Tá, descansa ai. Daqui a pouco a gente vai tomar café. – Virou o rosto de volta para a nuca de Carol que não mexera um músculo durante todo o tempo e dormiu. Fernanda deitou-se sentindo os lençóis limpos. Só um leve cheiro do xampu do hotel. Provavelmente Karine havia tomado banho antes de dormir. Lembrou-se vagamente do toque no corpo forte de Karine. A sensação foi tão indiferente e ao mesmo tempo acolhedora quanto a atitude de Karine. Relaxou. Sua cabeça ainda doía, mas a vontade de vomitar diminuíra bem. Dormiu rapidamente, um sono sem sonhos.
Acordou com Carol lhe puxando o pé. – Fernanda, vamos tomar café para arrumar para sair do hotel. Já são dez e meia. Você melhorou?
- Melhorei. – E melhorara mesmo. Ainda se sentia mal, mas a dor de cabeça insuportável havia arrefecido, e só restava uma dorzinha lá no fundo. Sentia um pouco de fome, mas com certeza não conseguiria comer qualquer coisa.
- E a Karine?
- Ta lá tentando acordar o Theo.- Sorriu para Fernanda com docilidade pela primeira vez desde que se conheceram. – Ainda bem que você veio para cá, porque ali no quarto a situação não está boa mesmo não. Vamos lá tomar café? Arruma ai que vou ver como a Karine ta resolvendo as coisas lá com nosso Theozinho. Te espero lá fora.
Fernanda começou a pensar no sentido do que ela falara mais isso começou a fazer a dor de cabeça voltar. Ela pensaria depois que melhorasse, de noite, e em casa. Ela se sentia bem em relação ao ocorrido. Não estava arrependida. Não sentia que tinha feito algo errado, ou nojento, ou... ela não sabia ao certo o que pensar, mas também não sentia que tinha feito algo heróico ou se libertado. Desistiu de pensar a respeito. Levatou e foi pegar roupas na mala. Só colocou um calça jeans folgada e um tênis. O resto manteve o que já vestia. Lembrou-se que ainda tinham que ir aos museus. Será que o resto do pessoal ia querer ir também ou poderiam ir embora. Foi a banheiro. Depois escovou os dentes de novo, para retirar um leve gosto de vômito que persistia na sua boca. Escovou bem o céu da boca, a parte de cima e debaixo da língua e as bochechas, e o gosto deixou de ser perceptível. Saiu do quarto e foi encontrar o resto do pessoal.
O quarto de Theo estava aberto. De lá exalava um cheiro terrível de vômito, suor, e gazes. Carol vinha trazendo sua mala para colocar no outro quarto. Já estava com outra roupa, bem esportiva, e de tênis, o que indicava que iriam andar ainda pela cidade.
- Ele já está melhorando. Já tomou banho e a gente já vai descer. Deixa eu só colocar a mala aqui no quarto que a gente vai para o café. A Karine trás o Theo. – deixou a mala dentro do quarto e saiu fechando a porta.
- Vamos? – As duas desceram em direção à recepção – Nossa, você não está com uma dor de cabeça danada não? Sorte que o Theo traz os remedinhos para ressaca sempre. Eu tomei dois de uma vez para ver se passa logo.
- A Clarissa, daqui da pousada, me deu dois mais cedo. Eu não tava conseguindo nem ficar com o olho aberto que dava vontade de vomitar.
- Aliás, que estrago hein! Você e o Theo capricharam. A gente até tentou ajudar um pouco, mas só tiramos você de cima do vômito, e depois o Theo vomitou também em cima da Karine, e ela apelou e foi tomar banho. Ai a gente veio pro quarto e esperamos vocês dois melhorarem. A Karine queria que vocês que explicassem para a Clarissa, mas ela mesma vai falar, pode ficar tranqüila...
Fernanda pela primeira vez ficou envergonhada e sentiu remorsos da noite anterior. Principalmente por ter que se explicar para estranhos que vomitara no quarto.
... mas a gente vai depois no museu da inconfidência e conforme for, tava pensando é em ir direto para BH e almoçar lá. O que é que você acha? – Fernanda perdeu parte da história. Estavam na porta do salão de café da manhã.
- Uai, vocês que sabem. Só queria poder é deitar e dormir o dia inteiro.
- Nossa, eu também. Mas a gente só vai nos dois lugares e vai embora. Não precisa ir em lugar nenhum mais não. Depois, amanhã eu e a Karine pensamos em começar bem cedo, para preparar a apresentação para fazer para o Tomás, o Renart e a Dorotheia de noite. O que você acha. A gente começa umas oito da manhã. Pode ser lá em casa mesmo, a gente toma café lá. Pode ser.
- Uai, pode. Oito horas... Não pode ser as nove não. Nossa, queria dormir uns dois dias seguidos.
- É, dá vontade mesmo. – Riu maliciosamente e olhou para trás com os sons de Karine e Theo que vinham conversando. Theo estava do mesmo jeito da manhã anterior, quando vinham para ouro preto. Estava ainda meio molhado do banho mal enxugado, e Fernanda sentiu o perfume que ele geralmente usava quando passou. Apertou-a de leve no ombro e lhe deu um beijo na bochecha.
- Bom dia flor do dia. – seu tom era entre o irônico e o doente terminal. Surpreendentemente, estava de ótimo humor. Na verdade, parecia até que ainda estava um pouco bêbado. Sentaram-se na mesa. Theo, abatido, caído sobre si na cadeira, suspirava profundamente de trinta em trinta segundos. Depois de cinco minutos olhando perdido para o buffet de pães fez um movimento como se estivesse acordando de súbito naquele momento e se levantou.
- O que vou é tomar café. – E se encaminhou para a o Buffet. Karine e Carol estavam já no segundo copo de suco de laranja que viera à mesa em uma jarra de mais de um litro. Fernanda tomava mais chá, enquanto decidia o que iria comer. Chamou um novo rapaz que substituíra Antônio.
- Tem coca cola? Latinha?
- Temos sim.
- Pega uma para mim então e um misto quente. Não, só um pão com manteiga e presunto. Frio. – O rapaz saiu e voltou logo com a coca. Fernanda abriu e tomou quase que de um gole a latinha inteira. Quando o rapaz voltou com o pão ela pediu outra coca.
Carol e Karine que eram mais cuidadosas com o corpo e com alimentação olharam meio surpresas. Fernanda não se alimentava bem. Na verdade ela se alimentava como uma criança. Mesmo a genética estando ao favor dela, não ficaria para sempre. Ela já estava meio gordinha. Nada que diminuísse a sua beleza, que estava principalmente no ar infantil e fofinho que aquelas gordurinhas a mais lhe davam. Mas isso não duraria por muito tempo. Ela logo de fofinha passaria para gorda, e de menininha fofinha, passaria para leitoinha gordinha. Ainda mais com a pele rosada e os cabelos loiros. Karine teve um ataque de riso pensando na comparação. Ria sem as duas saber porque. Olhava para Fernanda e ria, lembrando-se de um porquinho rosa com pelos loiros.
- Que foi Karine?
- Nada não Carol. Fernanda, você vai acabar engordando muito comendo desse jeito. – Fernanda olhou para Karine. A intimidade que ela adquirira com ela ainda não era o suficiente para tal tipo de insinuação. Sentiu-se ofendida e invadida.
- Ah, tem problema não. Depois eu faço regime. Tomou a segunda coca-cola quase inteira novamente. O pão com presunto e manteiga no entanto era comido com tranqüilidade. Saboreando cada pedaço. Theo que voltava mais acordado um pouco e escutara a conversa entrou no assunto.
- Aqui, as duas asseclas do mundo fitness estão te aborrecendo Fernanda? Larga pra lá essas duas enjoadas ai. Se você bobear elas vão querer te chamar para ir na academia domingo de manhã.
- Ah Theozinho, você também bem que podia ir né.
Fernanda se levantou da mesa, sem dar satisfação para os três. Não demonstrava raiva, mas causou um pouco de estranheza sua atitude confiante. Foi no balcão e voltou com um tablete de chocolate aerado e mais uma latinha de coca.
- A melhor coisa que tem é esse chocolate aqui com coca cola. Você come o chocolate e toma a coca cola depois por cima e ela espuma na boca e dá umas penicadinhas na língua.
A autoconfiança de Fernanda chocou Karine e Carol um pouco. Sua clara discordância com o modelo estético com o qual as duas queriam lhe catequizar, logo naquele momento em que ela havia entrado na intimidade delas foi interpretada como um botar as asinhas de fora. No entanto, ao mesmo tempo observaram também que ela aparentava estar de mau humor. Mesmo com ela não falando ou se afirmando muito para elas antes, elas teriam percebido se o mau humor fosse uma constante em Fernanda. E não era. Pelo contrário era uma cena que elas viam pela primeira vez desde que a conheciam. Além do que, coca cola com chocolate no café da manhã significava outra coisa também.
- Ta bom Fernanda, desculpa. A gente não vai te chatear mais não. Pode tomar sua coca cola tranqüila. Mas toma água também que coca cola vai te deixar mais desidratada ainda. – Theo pediu uma coca cola para si e uma garrafa de água para Fernanda. Karine preferiu mudar de assunto.
- Vamos ao museu mesmo ou daqui já vamos embora.
- Uai Karine, não entendeu ainda que nosso chefe ta vigiando a gente. Com certeza vai ter um amigo dele que é guia lá no museu e que ta esperando a gente para poder guiar e ver o que a gente está fazendo.
- Ta bom Theo, o que você acha então?
- A gente tem que ir ao museu não tem? Então. A gente vai só no museu da inconfidência, depois descansa um pouco, come alguma coisa, descansa mais um pouco de vai embora.
- Eu to doida é para chegar em casa.
- Eu também Fernanda – Carol vinha perdendo um pouco o bom humor com a indecisão e a falta de ação no grupo.
- Uai, podemos ir no Museu e de lá ir embora então, mas você vai dirigindo?
- Vou, pode deixar Theo. Você pode ir embora dormindo atrás. – Carol estava cada vez com o humor pior. Pegou um pouco da água de Fernanda. E se levantou. – Vou olhando lá na recepção para ir fechando nossa conta. – E se levantou.
- Karine já terminara de comer, e Theo ainda estava enrolando. Foi ao balcão, pegou um pão de queijo e comeu rápido, com a coca, e se levantou. – Vamos então?
Levaram as malas para o carro. Theo levou a sua e a de Carol. Sentia que era o mínimo que devia fazer depois que induzira Carol a voltar dirigindo e rompera o acordo feito antes da vinda de que ele voltaria dirigindo o carro.Acomodaram as bagagens e Karine foi chamar Carol. Quando essa saiu do campo visual dos dois Theo puxou assunto com Fernanda.
- E ai, melhorou?
- Do que?
- Uai, da dor de cabeça.
- Melhorei sim. Só quero dormir mais. O dia inteiro.
- Hummm. Fernanda... quer conversar sobre ontem? – Fernanda olhou Theo com uma cara séria. A mais séria com a qual ela já o tinha olhado até então.
- Hoje não Theo. A única coisa que quero fazer hoje é dormir. Acabar aqui, chegar em casa, tomar banho, trocar de roupa e dormir até amanhã na hora do almoço.
- Tá bom. Mas amanhã de manhã a gente vai encontrar né.
- É, mas antes vou dormir muito. Pode. Depois a gente conversa.
- Tá. Mas tá tudo bem?
- Tá sim. Não se preocupa não.
Fernanda não se sentia mal com o que acontecera na noite anterior. Só estava mal humorada com a ressaca e Theo insistia em ficar na sua frente. Então ela aproveitava para agredi-lo um pouco, ainda que fosse tentando fazê-lo ficar preocupado ou se sentindo culpado. Não era do feitio dela fazer esses joguinhos, ela nunca fora boa nisso. Mas como diriam seus amigos de colégio, ele driblou o goleiro e tocou para ela livre de frente para o gol. Era só empurrar para dentro. Ao lembrar da expressão lembrou-se de Gabriel, um dos colegas por que ela nutria uma atração especial. Ficaram algumas vezes em festas da sala, mas não passaram de beijos e de uma mão tímida que lhe acariciara a lateral da bunda, iniciativa prontamente interrompida pela preocupação de Fernanda em ficar mal falada. Ele era um gato. E muito gostoso também. Desde a festa de formatura que não o vira. Onde será que ele andaria agora. Ela bem que podia procurá-lo agora e deixar aquela mão passar pelo seu corpo sem preocupações. A mão e se possível outras coisas também. Lembrou-se da língua quente e áspera de Karine na noite anterior. Um comichão se iniciou em sua vulva e percorreu sua espinha do cócxis ao pescoço. Ela se arrepiou e tremeu discretamente.
- Fernanda. Ta viajando ai menina. – Karine voltava com Carol. A segunda voltava mais sorridente agora. Tocou o ombro de Fernanda, para leva-la à porta do carro.
- Vamos lá Fer. Quanto mais rápido a gente for mais rápido a gente volta para casa.
Foram de carro até próximo ao museu e procuraram um lugar para estacionar no centro já agitado e cheio de turistas da cidade. No museu seguiram o procedimento padrão. O grupo contratou um dos guias que ia lhes explicando o mais do mesmo que repetiam a todos os turistas. Não estavam com paciência nem disposição para procurarem identificar elementos do barroco e as especificidades dessa escola nas Minas Gerais outropretanas do século XVIII. Foram, viram, e voltaram para o carro, e de lá direto para Belo Horizonte. Chegaram em BH umas duas e meia da tarde. O grupo deixou Fernanda em casa, e depois deixaram Theo, que morava um pouco mais longe e que queria também dormir o resto do dia em sua própria cama. Karine e Carol foram para casa e fizeram rapidamente um arroz com brócolis, e esquentaram uma bandejinha de estrogonofe de frango, à qual acrescentaram um copo de champignons. Acompanharam com um isotônico sabor tangerina. Deitaram nuas debaixo do Edredom, se beijaram e dormiram abraçadas até à umas oito da noite. Pediram uma pizza margueritta, e esperaram vendo um pouco de televisão. Ao chegar a pizza comeram e foram cada uma ler um livro. Carol foi dormir primeiro. Karine continuou lendo um pouco mais. Amanhã se encontrariam de novo para fazer a apresentação dos resultados da viagem. Já tinha averiguado e havia coisas o suficiente para comerem os quatro. Pensou um pouco em Fernanda. Lembrou-se da textura do corpo dela. Um calor de tesão esquentou seu corpo por um breve momento, mas foi intencionalmente abafado. Ela estava cansada. Além disso se perguntava o que essa adesão de Fernanda, se é que fosse realmente uma adesão, ao seu esquema de intimidade sexual significava. Transar com outras pessoas por fora, como fizera com Renart, e como sabia que Theo e Carol também faziam as vezes era uma coisa. Eram ações externas. Mas Fernanda não. Era assunto interno agora, não só um casinho por fora de Theo. E ela sabia que Fernanda gostara. O tesão voltara ao pensar em Fernanda. Lembrou-se da pele macia e branquinha dela. Das carnes macias e fartas. Foi aos poucos percorrendo seus dedos de maneira carinhosa e doce como imaginava que fosse Fernanda. Já estava toda molhada de tesão. Teve um orgasmo suave e doce, rapidamente. Se sentiu relaxada. Foi dormir ao lado de Carol que já estava apagada. Deitou-se de costa para a amiga e amante e dormiu molemente, reconfortada pelo seu próprio cheiro no travesseiro.