CAP. 3 - A DECISÃO

(Continuação de PROPOSTA DE CASAMENTO)

Depois que saíram seu Louro, Batista e Tota Medrado, Celeste ficou por muito tempo, sentada na varanda, apesar dos muitos chamados da mãe. Ela agora tinha uma possibilidade real de sair daquele inferno, ver-se livre das reclamações da mãe eternamente insatisfeita com tudo e com todos. Batista não era bem o tipo do príncipe encantado que em seus sonhos, viria num cavalo branco com arreios dourados livrá-la da bruxa mãe, mas era homem que poderia muito bem saciar sua fome de sexo tanto tempo reprimida. Seria o macho fogoso que iria cavalgá-la toda noite penetrando-lhe as entranhas e proporcionando o gozo tantas vezes desejado. Teria estabilidade emocional. Teria um homem em quem se amparar e a quem doar todo amor contido pelas conveniências. O primo a quem esteve prometida, casara-se em Portugal. Naquele fim de mundo em que viviam, não existia melhor pretendente. Aliás, não havia pretendentes. Casando com Batista teria que ir morar no sítio. Teria que aprender a lida com os animais, com os plantios e com as colheitas. Teria que saber fazer queijo para vender na padaria do seu pai. Teria muito trabalho, de escuro a escuro. Mas teria a tranqüilidade de estar casada com um homem de bem, respeitador de quem nunca se tinha ouvido nada, de trabalhar no que era seu, de não ter mais que dar satisfações de sua vida a pai e mãe. Agora somente ao marido diria o que pretendia fazer. Marido é coisa fácil de controlar, basta um dengo, um carinho, uma cara de choro, uma noite de amor intenso. Era a redenção, mas ao mesmo tempo um passo perigoso. Precisava ouvir a opinião de uma pessoa mais velha, com mais experiência que visse o caso de fora, sem o envolvimento de ser da família. Foi falar com o padre. Contou o caso nos mínimos detalhes, examinando com ele todas as vantagens e desvantagens dessa união.

- O que você espera desse casamento, Celeste?

- Não sei. Batista me parece um bom homem. É ajuizado, trabalhador, não se vê ele em farras...

- Sim, mas eu pergunto você seria capaz de amá-lo?

- Acho que sim, padre. O amor é um sentimento que se cultiva e eu acho que um amor nascido assim é mais maduro, sem a influência da paixão, nasce aos poucos, mas é vigoroso.

- Pois é isso também o que eu acho. Se você tem tolerância para se ligar a um homem praticamente desconhecido, se não tem medo de encarar todo o trabalho que vai ter ao lado dele, case-se. Eu terei muito gosto em oficiar esse matrimônio.

À noite, depois do jantar, Celeste perguntou ao pai se ele consentiria no casamento se ela resolvesse casar com Batista.

- Eu penso que és tu que deves decidir minha filha.

- Eu sou contra (vociferou dona Assunção) tu vais virar escrava daquele caipira sem eira nem beira.

- Tu estás enganada mulher. Ele pode ser caipira, mas tem eira, beira e tribeira. Tem quase duzentos bois na engorda, mais de cinqüenta vacas leiteiras...

- Mas é um morto a fome que não abre a mão para alugar uma empregada. Que quer pegar a tonta aí para servir de burra de carga para ele.

- Então meu pai, se o senhor pensa assim, vou dizer a seu Tota Medrado que aceito o pedido.

- Tu vais ser muito infeliz. Dentro de pouco tempo tu estarás um caco. Isso se não morreres com um filho atravessado quando fores parir, com essa tua idade, vais de dar mal, muito mal.

- Filha não ouça o que diz tua mãe. Para ela até Jesus tem defeitos.

- E tem mesmo. Vê com quem ele anda. Vê que corja são os amigos dele. Vê a chusma de salafrários e vagabundos que ele chama de irmãos e que vive com o nome dele na boca o dia todo. “Dize-me com quem andas e eu te direi quem és...”

- Terás que preparar enxoval. Vamos marcar esse casamento para daqui a seis meses. É para poder preparar as coisas como devem ser.

- E pode ser que neste tempo tu arranjes coisa melhor.

- Coisa melhor como aquele teu sobrinho, grandíssimo velhaco. Enrabichou-se com uma ricaça da Beira e mandou nossa filha às favas.

- Nem me fales daquele canalha. Ele que não me apareça, dir-lhe-ei poucas e boas.

Dia seguinte Celeste foi à casa de Tota Medrado dar a resposta de que se casaria com Batista dentro de seis meses, quando o enxoval estivesse pronto.

(Continua em O PEDIDO)

--------------------------------------------------

Este texto foi produzido em linguagem coloquial, sem o cuidado com a forma culta da língua portuguesa. Procurei reproduzir da forma mais fiel possível a maneira de falar do povo pernambucano, nem sempre erudita, mas sem duvida, melodiosa.