Lembranças dos dias festivos de dezembro.

LEMBRANÇAS DOS DIAS FESTIVOS DE DEZEMBRO.

NATAL: Honorato Ribeiro.

No primeiro dia do mês de dezembro, à mesa de refeições, na Vila de Cocos, no Município de Carinhanha, na residência dos meus pais, Coronel Virgílio (Virgílio Bandeira Chagas) e Dona Rola (Idária Lopes Bandeira), pela manhã, ao servir o café, ele assim dizia: pessoal, chegou o mês festivo e nós queremos muita alegria! No dia 13, temos o dia de Santa Luzia, a protetora dos nossos olhos, quando deveremos acender velas de cera, em sua homenagem, agradecendo assim a sua proteção dada aos nossos olhos. Ela, a minha mãe, dona Rola, acrescentava: vamos começar, hoje, a Trezena, rezando com ladainhas e cânticos em louvor à santa milagrosa, querendo Deus e Maria Santíssima, vamos convidar toda a família, os amigos e, assim, damos o primeiro passo para as festividades. Esta casa, também, tinha uma figura especial, amada por todos, era uma santa de bondade, chamada de DUOURO, ou DUCA, ou CHU, cujo verdadeiro nome era Francisca. Ela tomava conta da casa, tinha muito boa querença com todas as pessoas, inclusive, seus parentes, os quais eram bem recebidos por ela e por todos os da casa, como se membros da família Bandeira fossem, liderando o verdadeiro batalhão da cozinha, como sua irmã “Jove”, suas primas Jovita e outras e o lenhador Joaquim de Aurélia. Havia outra pessoa muito importante, também, era a índia tapuia, chamada Efigênia, a qual tomava conta das roupas da casa, com muito zelo, embora, não fosse totalmente civilizada. Era viúva de um cidadão que se chamava João Coronha, que a pegou, no mato e levou para casa, na sua adolescência, com quem, mais tarde, se casou e tiveram uma filha. Finalizando a Trezena, a Vila de Cocos, à noite, ficava iluminada, à luz da vela de cera e suas ruas eram palco de um “grande desfile” de pessoas que iam ver o efeito das luzes, a cintilar na escuridão, encerrando-se mais um evento inesquecível. Aproximam-se, então, os preparativos do Natal do Senhor Jesus Cristo, com uma semana de antecedência e íamos construir a Lapinha. O Sr. Virgílio, meu pai, dirigia ao depósito, logo, ao lado da casa, separando, lá, alguns caixotes de retorno de garrafas que seriam usados na fábrica da aguardente mais requintada da região, a famosa BANDEIRINHA, para fazermos a base da lapinha. Era escolhido o quarto de hóspedes, situado ao lado da primeira sala, sendo, ali, feita a base, onde seria erguida toda a construção. Tudo era diversão, até, mesmo, a coleta de varas da árvore chamada de “São João”, efetuada pelos irmãos Yvonne, Vivi, Sebastião, Yolanda e eu, Péricles. Para isto usávamos, como o transporte, o jumento de carregar os barris de água. Era uma verdadeira diversão catar as varas mais alinhadas e dar início da construção. No canto do cômodo, colocávamos os caixotes de retorno de garrafas, ligados com pequenas peças de tábua; pregávamos as varas, arqueando-as, construindo o arco da frente, ou seja, a boca: outras do fundo para a frente, formando uma concha e outras formando uma tela. Aparadas as pontas das varas e das tábuas com serrote, entrava o outro serviço de colagem de folhas de jornal, fechando a concha, que era pintada de alvaiade, substância em pó que, dissolvida em água, transformava em tinta branca, na qual era adicionado a Azul Xadrez. Nestas alturas dos acontecimentos, as pessoas de toda a Vila de Cocos, já, ficavam curiosas com a lapinha tradicional da Dona Rola, indo ver o andamento da construção. Na concha eram pintadas as cores do firmamento, em céu azul, como, também, as estrelas, em dourado, a lua, em prateado . Outra opção para o firmamento era o uso do papel de seda, moldado sob forma de bolsas de ar, nas cores azul e branca, coladas, convenientemente, formando “nuvens no firmamento”. O roda-pé era construído com pedras lavadas, colhidas no Rio de Cocos, transportadas no jumento, o que nos proporcionava uma grande farra: passeio no mato, banho de rio com roupa e tudo. Havia também uma verdadeira legião de “voluntários”, meninas e meninos, autorizados pelos pais, que sempre diziam: meus filhos estão com os filhos do Coronel Virgílio, nada temos a nos preocupar. As pedras eram colocadas de

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uma tal forma que, no centro, formava uma gruta, ou uma lapinha e o chão era feito com areia branca, colhida no fundo do rio. O acabamento da boca, ou melhor, do arco na frente, era feito de folhas da árvore Pitombeira, que não se apodrecem, não caem, nem perdem o seu cheiro. Na minha lembrança, juntando-se o cheiro da madeira da árvore de São João, ao cheiro da tinta, o dos papéis usados, o do incenso e o das Flores do Lírio de São José, têm o cheirinho do Natal. Tirávamos as pontas das ramagens da Pitombeira e estas eram amarradas cuidadosamente ao arco da frente, dando a impressão de se tratar do portal de uma selva encantada, na pujança da fé, somente, encontrado no Menino Salvador. Quando estávamos terminando os trabalhos de baixo, do roda-pé entrava o Sr. Virgílio Bandeira, que administrou, em todo o tempo, o seu “pessoal de trabalho”, para colocar uma boneca de porcelana, oriunda da França, de rosto muito bonito, com vestes de anjo, e, logo abaixo, dependurada em cordéis dourados, a grande mensagem da lapinha de Dona Rola: “ GLORIA IN EXCELSIS DEO “. Yvonne, assumiu a tradição de suas irmãs mais velhas e montava o presépio, em cima da areia lavada, colocando de frente para manjedoura todos os animais, enfeites, os treis Reis Magos, os cordéis dourados e prateados, com as plantas decorativas, logo, abaixo, terminando com um pequeno tapete para os fiéis rezarem de joelhos. Na véspera do Natal, estava pronta a Lapinha, que ficava em visitação pública e, à meia noite, o Sr. Virgílio mandava soltar os fogos e, em seguida, eram rezadas as orações, os cânticos em louvor a Menino Jesus. Finalizando, havia a confraternização da família, a qual ocupava a casa toda, sendo servido o bom vinho português, o anisete de sua fabricação, comidas, perus, patos, galinhas, carnes, café com bolo e biscoito para todos. Guardo muitas lembranças, dentre elas, fui esperar o “galo”, ou seja, a meia-noite, dormi na janela de casa e caí com a cabeça na calçada e tenho um pequeno amassamento no osso da testa. Paralelamente, corria o festejo dos Santos Reis, que consistia em grupos de reisado, os quais cantavam hinos em louvor ao Menino Deus. Esses Grupos visitavam as casa, de maneira geral, até o dia 06 de janeiro, o Dia de Reis. O reisado mais famoso era o do Sr. João José. A última visita era na casa do Casal Sr. Virgílio e da. Rola. Tomava uma refeição, no final da tarde, cantava o reisado ao som do maior Zabumba da Região e de suas gaitas de pífaro a VALSA DA DESPEDIDA, na qual dizia “até para o ano que vem”, retirando-se, em batida, pela rua a fora e, consequentemente, ficávamos chorando com a Da. Rola e Sr. Virgílio, como eu me encontro, em prantos, neste momento, ao escrever esta página.O meu pai gostava de apoiar os filhos nos seus empreendimentos, com os seus amigos. Em casa, à noite, tínhamos um “Gramofone” da marca RCA VICTOR, popularmente, conhecido por “Vitrola”, o qual era solicitado para tocar as músicas, de carnaval com Carmem Miranda, Francisco Alves e, assim, meus irmãos davam início de uma festa. O violonista e cantor Amâncio Preto, animava o ambiente, até o fim. Alcancei, ainda, as minhas irmãs solteiras, em minha casa, Glafira, Wanda, Dulce, Vivi, Yvonne, Yolanda e os irmãos solteiros Oswaldo, Fernando, Eduardo, Biy, Tião e eu, crianças e Waldemar e Alice, casados. Todos tinham seus amigos e a nossa casa era cheia de pessoas, almoçando, durante a semana, em média 40 (quarenta) pessoas, excluindo-se o pessoal que trabalhava no Sítio. Era muita alegria, com gente bonita e, na casa do meu avô, o “Padrinho Augusto Lopes”, Capitão da Guarda Nacional, o ritual era o mesmo com os meus tios e tias, primos e primas, usando as roupas novas e bem feitas pelos melhores alfaiates, Tio Landulfo, primos Dioclécio, Sebastião, José Augusto e outros, que eram da família Lopes. Hoje, todas estas realidades, que parecem sonhos são: “LEMBRANÇAS DOS DIAS FESTIVOS DE DEZEMBRO”. Brasília (DF), 25 de dezembro de 2008. Ass.: Péricles Bandeira Chagas.

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Péricles Bandeira Chagas.
Enviado por Zé de Patrício em 16/12/2012
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