Coração de Natal
Vejo o movimento das ruas, das lojas, a decoração de Natal, a ansiedade das crianças... mas nada é como antes. Por mais que me esforce para dizer que é Natal, é difícil ver o verdadeiro partilhar, com poucas exceções. Mesmo as ceias são caladas, cada um centrado em seu íntimo, seus problemas. Até as alegrias são as que podemos chamar de egoístas. Alegria egoísta existe? Claro que sim... Nunca vimos alguém gritando aos quatro cantos que é feliz. Até a felicidade se guarda, hoje...
Ter um Coração de Natal é o gesto simples que fazemos durante o ano inteiro... Até um pacote de açúcar ou café faz muita gente sorrir. Penso demais nos velhinhos abandonados. Conheço alguns que ainda sustentam famílias inteiras. Fico me lembrando de uma estorinha que li quando criança... Havia uma família que tinha dois filhos e o vovô morava com eles. As refeições eram feitas à mesa, mas o vovô recebia seu alimento numa tigelinha e era colocado sentado na área, num banquinho que mal lhe cabia o corpo.
Um dia, o netinho perguntou ao avô - Vô, por que o senhor fica aí, separado da gente?
- É aqui o meu lugar, meu querido neto. Eu agora sento-me exatamente no banquinho que tem o tamanho do meu valor. No Natal eu vou ganhar um lugar à mesa com todos vocês. É assim há muitos anos!
Passei muito tempo para entender... Eu era criança. Hoje eu entendo. Ter o Coração de Natal o ano inteiro é privilégio raríssimo de poucos... a cada dia, menos!
Bom sábado!
(Relembrando a velhinha da Praça Oito, em Vitória-ES, que vende panos de prato, presilhas para cabelo e outros objetos, sentada num banquinho sob o sol ou chuva, sem reclamar. – Das minhas visitas ao centro de Vitória, aos sábados, surgiu a série “Retratos da Cidade” – Esta velhinha tornou-se minha amiga querida.)