O mar virou sertão, no coração do norte-mineiro. Ligeiro, passa uma nuvem se escondendo do sol. Cavaleiros confabulando fazem a leitura da nova estação:
— Seco por aqui!
— Caiu, ontem, uma chuva  miúda chorada em  peneira fina.
— Deu em mim. Peguei no lombo. Foi só  um orvalho.
— Será o orvalho pranto da  noite ou uma bênção de Deus?
— Tanto faz. Lágrima é suor da alma... a  natureza lacrimeja chorosa.
Glauma, a outra metade da alma de Tunico Oliveira, reclama:
— Por que Ducarmo Lopes não veio?
No meio dos cavaleiros, a voz de Adilson Júnior ecoa.
— Gorda demais! Nem possante carregaria tamanho fardo.
— Olhe o desprezo — diz Monique Loureiro — Maia é obeso e veio.
— Modo de falar, minha flor! A idade dela é o peso.
Cadê Célia Maia? — Quis saber vaqueiro Laudelino.
— Vem no coice de ‘Ligeirinho.’
— Se não tiver cuidado, o menino vende a ela peixe-leiteiro, e toda a ninhada  de avião ‘poedeiro.’
— Essa é boa! Não é à-toa que Ligeirinho é filho Turíbio Soberbo.
Desceram a serra que guarda as águas das Sete Passagens. Venceram um morro alto. Adiante, um serrote, mais morro, outro serrote... E foram rompendo estrada, a caminho de casa. João Velho ia pra casa, mas a casa de Laudelino é o  chapéu. Sem família, sem emprego, a vida era  tudo que tinha de seu.  Nunca teve mulher nem filho. Era vaqueiro errante, onde achava  sombra, dessareava  a montaria, deitava-se no coxonilho da relva e fazia da sela seu travesseiro. Era feliz com a vida que levava bestando atrás de gado dos outros.
 
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Adalberto Lima - Estrada sem fim...(fragmento)
Crédito da imagem:(Juramento - 1953-2010: um pedaço da história do Norte de minas. João Figueredo (org.) União Gráfica Ltda 2010